Sua Magestade, a mamona, por Ana Echevenguá
[EcoDebate] A produção de biodiesel já é uma realidade no semi-árido do Nordeste brasileiro, região responsável por 15% do diesel consumido no Brasil. Lá, a EMBRAPA fornece mudas de alta produtividade para a cultura de oleoginosas que não exija irrigação, como a mamona, o pinhão manso e o algodão.
De fácil cultivo, a mamona é resistente a doenças e à seca, exige baixo investimento em tecnologias e insumos, e pode ser cultivada com tecnologias simplificadas, juntamente com outras culturas alimentícias.
Segundo a Embrapa, o biodiesel feito com a mamona dura 3 anos. Ao contrário do biodiesel da soja, cuja validade é de 15 dias.
Por isso, a mamona foi eleita o carro-chefe na fase inicial do Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel. Ela é a alternativa ideal para os projetos de agricultura familiar, devido à sua economicidade. A torta resultante da extração do seu óleo, por exemplo, é um ótimo adubo.
Seu cultivo se estende por quase todos os estados do nordeste; e a Embrapa já mapeou mais de 600 mil hectares de terras aptas ao seu cultivo.
Trata-se de uma alternativa rentável para mais de 100 mil famílias de agricultores desde que sejam observadas as práticas de manejo, especialmente no plantio em consórcio. Isso ajuda a reduzir riscos, a diversificar as oportunidades e a maximizar a produção (lavouras que utilizam tecnologia recomendada pela Embrapa alcançam até 3 t/ha).
O valor comercial da mamona
A cotação internacional do óleo de mamona oscila em torno de US$1.000,00/t, por causa dos múltiplos usos desse na indústria química.
Para o engenheiro mecânico Thomas Renatus Fendel, “não se deve utilizar a mamona para biocombustível; e muito menos para se fazer o bioBOBOdiesel. Primeiro porque mamona é um ótimo lubrificante, que tem valor comercial 5 vezes superior aos combustíveis e segundo porque a transesterificação é desnecessária, pois os óleos vegetais qualificados podem ser utilizados diretamente em motores adaptados, como atestam os mais de 100.000 veículos a óleo de canola na Alemanha. Fazer bioBOBOdiesel de óleos vegetais é como fazer bioBOBAgasolina de etanol. Um contracenso.Assim como se fazem, ou melhor, se faziam motores a álcool (pois hoje só se fazem os beberrões flex), deve-se fazer os motores a óleo vegetal”.
O biodiesel no Piauí
O Piauí apresenta grande capacidade de produção de energias substitutivas do combustível fóssil. E está investindo maciçamente no biocombustível; em especial, no biodiesel.
O Estado é velho amigo da mamona. Nas décadas de 60 e 70, plantou mais de 40 mil hectares e a produção foi destinada ao mercado internacional de ricinoquímica.
Hoje, o Piauí é o estado que mais produz mamona no Brasil; conta com 3 milhões de hectares que podem ser cultivados com mamona e, desta forma, produzir um bilhão de litros de óleo e gerar 300 mil empregos, com mercado garantido para a produção do biodiesel.
O governo estadual, através do Programa de Desenvolvimento Sustentável da Cadeia Produtiva da Mamona, está atraindo investimentos que geram emprego e renda e ajudam na reforma agrária.
O município de Anísio de Abreu, situado a 650 km de Teresina, é a capital da mamona. Lá, o Governo Estadual incentivou a população local a se dedicar ao cultivo desta oleoginosa.
Em meados de 2005, o Presidente Lula inaugurou, na cidade de Floriano, a terceira maior usina de biodiesel do país. O projeto prevê a produção de 90 mil litros de biodiesel/dia à base do óleo de mamona, geração de 100 novos empregos diretos e mão-de-obra para mais de 5 mil pessoas no processo de colheita de mamona.
Na safra 2005/2006 foram comercializadas mais de 100 toneladas de mamona, produzidas por 14 associações de produtores da microrregião de São Raimundo Nonato. O óleo foi vendido à empresa Brasil Ecodiesel.
Projeto do Agronegócio da Mamona consorciado com o feijão-caupi
Este projeto – que tem o apoio do SEBRAE – gerou emprego e renda para mais de 2.500 agricultores familiares da microrregião de São Raimundo Nonato, situada a 517 km de Teresina. Cada hectare plantado produz 1.500 kg de mamona e 1.200 kg de feijão; cada agricultor ganha em torno de R$ 400,00/mês.
O projeto começou em dezembro de 2004; está implantado em 23 municípios do sul do Estado (a proposta é atingir 42 municípios piauienses); abrange quase 11 mil hectares plantados; e fez do Piauí um forte banco de sementes de mamona e um dos principais produtores de biodiesel do país.
É preciso deixar bem claro:
Embora a mamona seja ótima para a inclusão social no Nordeste, os produtores precisam de suporte tecnológico e financeiro do Governo.
Precisam de orientações técnicas e práticas sobre plantio e comercialização do produto para que se enquadrem nas regras do desenvolvimento sustentável.
Todos os envolvidos devem estar preparados para enfrentar as dificuldades relacionadas à venda do biodiesel. A Agência Nacional do Petróleo está fechando usinas que ela considera clandestinas (no final de 2006, lacrou 09 usinas no Mato Grosso) ou porque elas vendem biodiesel direto ao consumidor final, proibido no Brasil. As usinas só podem vender diretamente ao consumidor final se autorizada pela ANP para testar o produto.
E, acima de tudo, são necessárias políticas públicas voltadas ao setor; que tragam benefícios fiscais; linhas de crédito acessíveis à agricultura familiar e incentivem o uso da bioenergia produzida na frota e no maquinário do produtor.
Ana Echevenguá, advogada ambientalista, coordenadora do programa televisivo Eco&Ação, email: ana@ecoeacao.com.br
artigo publicado pelo EcoDebate.com.br – 24/09/2007