Água é vida – Água misturada com Fezes é morte, por Norbert Suchanek
Os ingleses sempre foram excêntricos. É possível por causa disso, o sanitário com água, que nós conhecemos hoje, foi patenteada no ano de 1775 por um inventor inglês com o nome de Alexander Cummings. E no ano de 1810, nas cidades da Inglaterra foram instalados estes primeiros sanitários com água. O resultado deste “desenvolvimento” tecnológico inglês foi a morte de vários rios na Europa em poucas décadas e na morte de milhares de pessoas por causa de doenças transportadas com a água dos sanitários patenteados nos rios e lagoas. Doenças como cólera e tifo, que nós chamamos hoje doenças tropicais, mataram no meio do século 19 milhares de pessoas em cidades européias famosas como Hamburgo e Munique. No final do século 20 e no início do século 21 o governo brasileiro instalou estes sanitários do século 19 nas aldeias dos povos indígenas.
A Aldeia de Parati Mirim é uma das maiores aldeias Guarani Mbyá no Estado do Rio de Janeiro. Já há muito tempo nesta comunidade indígena lamenta-se pela falta de água. Neste mês de setembro de 2007 a situação da água na Aldeia de Parati Mirim foi grave. Falta água para banheiro e água para beber. Os Guaranis precisam usar a água do rio que já está extremamente poluída pelos vários moradores do rio, inclusive do Quilombo Campinho – porque o esgoto e o lixo de todos os moradores chegam direitamente ou indiretamente neste rio.
Qual é a solução deste problema?
A solução da falta de água é na realidade muito mais simples do que a maioria pensa. Na engenharia internacional e também nos conhecimentos dos vários povos tradicionais no mundo tem várias técnicas simples, adequadas e seguras para resolver este problema.
A primeira Solução: Salvar Água! Não gastar água para coisas que não precisam de Água!
Tradicionalmente os homens usam a água para beber, para lavar o corpo, roupas e pratos. Depois da instalação dos sanitários “modernos” pela FUNASA, o uso da água nas aldeias mudou totalmente: Porque estes banheiros precisam muita água para transportar cocô e xixi direta ou indiretamente no rio ou num outro lugar. Este serviço de transportar esgoto gasta quase 10 vezes mais água por dia que a população da aldeia precisa para beber! Um banheiro com água gasta em média 30 até 40 litros de água para cada pessoa por dia. E com canos fracos e quebrados – como é a situação na Aldeia há muito tempo – o gasto de água aumenta extremamente. Esta água que sai do sanitário está perdida a cada minuto. Pior: esta mistura de água com cocô (fezes, esgoto) polui as águas subterrâneas e as águas do rio e do mar. Este esgoto diminui a produção do peixe e por outro lado aumenta as doenças.
“Quando jogamos as fezes na água multiplicamos um problema que era simples, agora, além da necessidade de uma solução adequada às fezes temos água poluída para tratar”, explica 2005 o permacultor do Instituto de Permacultura e Ecovilas do Cerrado (IPEC), Frederico P. Lenhardt (2005). Esta informação a maioria dos engenheiros do meio ambiente e dos médicos internacionais – e também os povos tradicionais, os pajés – sabem!
Os engenheiros do Brasil e internacional, assim como vários povos tradicionais do mundo, conhecem a solução deste problema de falta d’água e da água poluída: A solução é instalar banheiro seco, isto é, sanitário compostável. Para fazer isso não precisa de grandes investimentos ou recursos da FUNASA ou de outros órgãos do Governo. Só precisa de mão-de-obra dos próprios moradores. Perto de Parati Mirim, no Quilombo do Campinho já existe um sanitário compostável como um exemplo bom, feito por um morador jovem com nome Sílvio. É um banheiro excelente: limpo e sem cheiro mal. Este quilombola inteligente pode ajudar a instalar banheiros secos na Aldeia como prevenção de uma próxima seca na Aldeia.
O sanitário compostável cria outros benefícios. Porque este sistema cria também um adubo natural, composto ou húmus, que as plantas, especialmente o milho, precisam para crescer! “O sanitário compostável cumpre o ciclo natural do alimento, transformando as fezes em adubo de primeira para a produção ecológica de alimentos”, fala Frederico P. Lenhardt. O milho é a comida tradicional dos Guarani Mbyá. E o composto (cocô dos homens e dos animais fermentado) é a comida natural do milho! Qualquer sistema que separa esta conexão destrói a base da vida. O sanitário com água, por exemplo, já está destruindo esta conexão – a seca com a sede já chegaram!
Segundo: Para ter um rio limpo todos os outros moradores esquerda e direita do Rio precisam também instalar sanitários secos e também a comunidade precisa instalar pequenas estações de tratamento de esgoto com raízes das plantas. Esta tecnologia também já existe há muitos anos em vários países do mundo, inclusive no Brasil. Esta tecnologia é barata, simples, fácil de instalar e funciona com segurança. “O tratamento de esgoto usando zona de raízes é um sistema comum em países da Europa, tais como Alemanha, Suíça e Áustria, usando plantas para tratar o esgoto doméstico, diminuindo poluentes e evitando a poluição de nossos arroios e rios”, escreveu em 2006 o Serviço Brasileiro de Respostas Técnicas (SBRT). O professor Denis Miguel Roston da Faculdade de Engenharia Agrícola (Feagri) da Unicamp explicou que este sistema de tratamento de esgoto alternativo custa para uma comunidade 5 vezes menos investimentos de um sistema tradicional. Esta tecnologia funciona para limpar esgoto e água suja (água cinza) que sai dos máquinas de lavar, dos chuveiros contaminados com produtos de limpeza ou das cozinhas. Por isso também é importante instalar isso num lugar da Aldeia para diminuir a poluição do Rio e no outro lado para aumentar a vida, o peixe do Rio.
O sanitário compostável e o tratamento dos “águas cinzas” na segunda fase: Cada outra solução, que não mudar o sistema errado e que não diminuir o gasto e a poluição dos águas, não vai melhorar a situação. “Água tratada para todos” com o veneno Cloro não é uma solução para um futuro sustentável, é uma solução de curto prazo numa situação de emergência, mas vai criar novos problemas no futuro!
Questão final: Por que a FUNASA ainda está instalando sanitários com água nas aldeias fora das cidades? Por que ela ainda não instalou os sistemas próprios, conhecidos e mais baratos como o sanitário compostável? Esta é uma questão que as comunidades e a sociedade precisam fazer aos funcionários e ao governo do Brasil. Porque o sanitário compostável claramente também é uma solução simples e importante para todas as comunidades rurais e muitas cidades do Brasil: Água cristalina, Rios e lagoas limpas e adubo natural para comida saudável de graça. Que mais nós queremos?
Norbert Suchanek,
Rio de Janeiro, 16 de setembro de 2007
Nota: O escritor está sabendo que jornalistas precisam de autorização da FUNAI para pesquisar em uma terra indígena. Mas no caso da Aldeia Parati Mirim, onde uma estrada cheia de turistas passa quase na coração da aldeia, cada turista que tem olhos ou ouvidos abertos conhece a situação sanitária miserável de lá. Também o meu texto está baseado em várias falas com vários pesquisadores e indígenas no Rio de Janeiro, São Paulo e Espírito Santo.