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Artigo

A conta da água, por Danilo Pretti Di Giorgi

[Correio da Cidadania] Se você digitar “economizar água” no Google, vai encontrar muitas dicas do tipo lavar o carro com um balde ao invés da mangueira, fechar a torneira enquanto escova os dentes ou usar a água da máquina de lavar roupas para lavar o quintal. A conta do problema de água que o mundo já enfrenta e certamente irá enfrentar cada vez mais parece recair exclusivamente sobre os consumidores residenciais. Mas o que as pessoas parecem não se dar conta é que o uso doméstico representa apenas 18% do consumo de água no Brasil, segundo dados da ONU. É claro que há desperdícios a serem corrigidos, mas as pessoas não questionam e nem discutem o uso dos 82% restantes, que são empregados na agricultura, na pecuária e na indústria. A maior parte (63% do total) vai para a irrigação – quase sempre subsidiada pelo governo -, mas é curioso observar que menos de 5% da área plantada no país é irrigada.

Dia desses, vi na TV um programa que mostrava uma sertaneja sem acesso a água encanada. Os dados apresentados mostravam que toda a sua família consumia, em nove dias, 500 litros do precioso líquido, a mesma quantidade que algumas pessoas mais esbanjadoras nos centros urbanos usam em apenas um dia. Assim, aquela senhora era descrita na reportagem como uma vanguardista, um exemplo para o futuro do mundo, por saber como sobreviver com tão pouca água. O repórter dizia que devíamos aprender com ela. Isso me pareceu uma perigosa distorção.

A questão que se coloca é: será que a saída é trabalhar para que as famílias aprendam a viver com 50 litros de água por dia? Ou devemos racionalizar e cobrar por seu uso nas atividades comerciais que trazem pouco retorno social, como o plantio de soja e produção de alumínio, exemplo?

Entendo que a solução para o problema da escassez de água deve passar necessariamente pela taxação diferencial da água usada para atividades que não se revertem em benefícios à sociedade como um todo. Imagino, por exemplo, a cobrança de atividades produtivas, aí incluído o uso da água, que levasse em conta aspectos como geração de empregos e de renda (para os funcionários e para a cadeia produtiva daquela atividade) por real de faturamento; impacto ecológico por real de faturamento etc. Impostos deveriam pesar o custo social e ambiental das atividades. Assim, aquelas pouco poluidoras e com grande retorno social seriam menos taxadas que as suas contrapartes.

Se permitirmos que o aumento no preço da conta de água, devido à escassez e ao encarecimento dos processos de purificação, seja ditado por leis de mercado, a conta vai recair com mais força sobre os pobres, exatamente quem menos consome individualmente os recursos naturais em termos relativos e as maiores vítimas da nossa sociedade desigual.

Danilo Pretti Di Giorgi é jornalista. – Email: digiorgi@gmail.com

(www.ecodebate.com.br) artigo originalmente publicado pelo Correio da Cidadania
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