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Notícia

Não à Transposição; SIM à Revitalização e a um Projeto de Convivência com o semi-árido

[EcoDebate] Dom Luiz Flávio Cappio, bispo da diocese de Barra/BA, peregrinou, em 1992, das nascentes do rio São Francisco à foz, durante um ano, conversando com as populações ribeirinhas e exortando-as sobre o dever de defender o rio e os povos da bacia sanfranciscana. Hoje, dia 11 de junho (de 2007), o Ministro da (des)Integração Nacional, Geddel Vieira, vai percorrer o Rio São Francisco, das nascentes à foz, em 5 dias, de avião, para defender o insano e faraônico projeto da Transposição das águas do rio São Francisco. Vai prometer compensações que visam cooptar parte das lideranças e líderes políticos. Se fosse de barco, perceberia que dos 1.600 quilômetros navegáveis, em 1000 Kms não é mais possível a navegação.

Junto com os ribeirinhos e pescadores do rio São Francisco dizemos: “O rio São Francisco está morrendo, está anêmico, clama para ser revitalizado e jamais transposto. Nos últimos 40 anos, já perdeu cerca de 40% do seu volume de água. Está cada vez mais raso, estreito e assoreado. Uma infinidade de ilhas existentes hoje não existia no passado.” O assoreamento é o resultado dos 18 milhões de toneladas de areia e terra que o rio está recebendo todos os anos. O rio está sendo sepultado vivo. As matas ciliares acabaram. Os vazanteiros tiveram que migrar para as favelas, pois as cheias quase não existem mais e, por isso, a pesca e a agricultura nas várzeas estão ficando inviáveis.

Para viabilizar este projeto que começou com a mentira de que seria para levar água para os sertanejos pobres que sofrem com as secas, população espalhada pela caatinga do semi-árido, e que já se sabe ser impossível tal façanha por mãos humanas. Agora estão medindo terras para construírem barragens nos rios das Velhas, Paracatu e Urucuia. A população está alarmada e revoltada, pois nem recebe informações da Codevasf. Na região de Curvelo os fazendeiros, a população dos povoados, prefeitos e vereadores, deputados, as ongs e associações de trabalhadores descobriram a associação entre transposição e o confisco de suas terras, pois não recebem o que pedem para a região enquanto querem impor o que não querem. Em Curvelo audiência pública recente promovida pela Assembléia Legislativa repudiou por unanimidade tal pretensão.

O projeto de Ciro Gomes, assumido por Lula, em 2005, prevê a retirada de um mínimo de 26,4m³ de água por segundo e um máximo de 127m3 por segundo, o que comporta a calha prevista no projeto: 25 metros de largura, por 5 metros de profundidade e 720 Kms de distância – para os Estados de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará. É claro que se há uma calha que pode transportar até 127 m3/segundo, jamais irão levar só 26 m3/segundo. Estão mentindo que é para levar água para a população espalhada na região da seca. Nesta região a chuva é relativamente abundante, uma média de 750mm por ano. O problema é que está concentrada em três meses ao ano e os açudes concentram água sem poder distribuí-la, pois é impossível levar água às residências espalhadas pela caatinga numa área quase 80% a área de Minas Gerais. As centenas de pequenas e médias obras necessárias são de convivência com o semi-árido e passam pela construção de 1.000.000 de cisternas e pelas obras do Atlas Nordeste.

A chegada do Exército em Cabrobó e em Floresta/PE demonstra a pressa do governo federal em iniciar a transposição, antes mesmo do julgamento das 14 ações ainda pendentes no Supremo Tribunal Federal (STF). O acordo firmado com Dom Cappio de que haveria um debate amplo com a sociedade não foi respeitado. De uma forma autoritária estão empurrando goela a baixo a obra mais cara do Brasil, um presente de grego, um crime social e ambiental, uma obra inviável economicamente, pois a água chegará no Nordeste de 5 a 7 vezes mais cara. Nem os empresários do hidronegócio – produtores de camarão e hortifrutigranjeiros para exportação – não vão conseguir pagar pelo uso da água. Por isso vão cobrar da população das cidades, em subsídio cruzado 85% dos custos da água transposta, sendo que 70% da água será para fins econômicos – carcinicultura e hortifrutigranjeiros para exportação. Este tipo de uso conflita com as necessidades legítimas do território da própria bacia do São Francisco, o que foi negado pelo Plano Decenal do órgão competente legal, o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco.

O Projeto real de transposição, se não for sepultado, atingirá apenas 5% do território semi-árido brasileiro e 0,3 % da população. Apenas 4% da água será destinada à chamada população difusa, 26% serão para uso urbano e industrial e 70% serão para irrigação (carcinicultura – criação de camarão -, floricultura e hortifrutigranjeiros) de produtos para exportação. Serão beneficiadas cidades fora do Semi-árido como Recife e Fortaleza, além de Caruaru (agreste de Pernambuco). Logo, a Transposição não vai levar água para o povo pobre da zona rural do Nordeste. É impossível fazer esta distribuição à população difusa, ela só poderia ser feita como adução para uma cidade. Logo é mentira. O verdadeiro objetivo é escuso e está sendo escondido. Prevemos que o projeto da transposição irá acabar sendo devassado pela Polícia Federal, e o caso Guatama foi apenas o primeiro passo. O senhor Geddel mudou de opinião para ter o cargo de ministro, está traindo a população de toda a bacia do São Francisco e acabará mal sua carreira política. Novos episódios estão para acontecer envolvendo licitações e empreiteiras e corrupção de políticos.

Dados oficiais dos próprios Planos de Recursos Hídricos dos Estados beneficiados revelam um quadro atual bastante favorável em termos de disponibilidade de água. O Ceará, por exemplo, tem potencial para atender com segurança até quatro vezes as demandas atuais por água para todos os usos. Não existe déficit hídrico nos Estados que alegam necessidade desta água. Custo da transposição: R$ 6,3 bilhões apenas nos primeiros anos.

A Agência Nacional de Águas (ANA), entidade estatal criada para a gestão estratégica do uso da água no Brasil, propõe no Atlas do Nordeste 530 obras para solucionar os problemas de abastecimento hídrico até 2015 em todos os núcleos urbanos acima de 5.000 (cinco mil) habitantes do semi-árido brasileiro. Essas obras beneficiariam as populações mais necessitadas calculada em trinta milhões de pessoas, incluindo o semi-árido do São Francisco e o Vale do Jequitinhonha e custariam 3,6 bilhões de reais, portanto, mais baratas, mais abrangentes, mais eficientes que qualquer obra de transposição hídrica.

Por tudo isso, concluímos que o projeto de transposição do Rio São Francisco está no campo da suspeição, é um crime não apenas ambiental e social, já que mentiroso, despropositado e contrário ao interesse público.

Pela Articulação em Defesa do rio São Francisco,
Comissão Pastoral da Terra (de Minas Gerais) – www.cptmg.org ,
Projeto Manuelzão – www.manuelzao.ufmg.br ,
Fórum Mineiro de ONGs,
Fórum Mineiro de Comitês de Bacias Hidrográficas,
Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas,
Movimento Capão Xavier Vivo – www.capaoxaviervivo.org ,
Via Campesina (MST, MAB, Cáritas, MPA, CAA e CPT)

Contatos com:
Frei Gilvander Moreira, cel.: 031 9162 7970 – e-mail: gilvander@igrejadocarmo.com.br
Professor Apolo Heringer Lisboa: cel.: 031 9941 2171 – e-mail: apolohl@medicina.ufmg.br
Alexandre, o Alemão, cel.: 038 9193 3693 – e-mail: alexandrecpt@yahoo.com.br

In www.EcoDebate.com.br – 11/06/2007