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Artigo

Um Novo Pacto Colonial, por Gilberto Andrade de Abreu

[Gazeta Mercantil] O aquecimento global está provoca efeitos além do clima. E o que nos preocupa, com a valorização da bioenergia, etanol, álcool e quejandos, é a monovisão economicista. Fala-se e repisa-se sobre as oportunidades que o Brasil terá. Hipertrofia-se a capacidade brasileira em tecnologia e terras agricultáveis, além de haver um dimensionamento exagerado dos possíveis ganhos ambientais. Muitos esquecem que o setor sucroalcooleiro recebeu bilhões de dólares no Programa do Pró-Álcool, a partir de 1975, e não se investiu um cêntimo em pesquisa para o álcool-químicos e sucroquímicos. Em suma, apesar dos avanços em mecanização, em geração de energia, na adição de alguns novos produtos, o setor continua o mesmo. Notadamente nos aspectos sócio-ambientais. Salvo as exceções de praxe, neles, a usina apenas sucedeu ao engenho.

A pesquisadora Maria Cristina Gonzaga, da Fundacentro, órgão ligado ao Ministério do Trabalho e Emprego, não deixa por menos: “o açúcar e o álcool no Brasil estão banhados em sangue, suor e morte. Os trabalhadores são massacrados, ficam doentes o tempo todo por diversos motivos”. Se nos anos 80, o trabalhador cortava 4 toneladas de cana ao dia, hoje corta 10 toneladas. Isso lhe dá o direito de receber de R$ 413 por mês. Segundo o Boletim do Centro de Referência em Saúde do Trabalhador: cada cortador de cana é levado a dar 30 golpes de facão por minuto em oito horas. A Pastoral do Migrante computou, somente no Estado de São Paulo, 17 mortes por extenuação nos canaviais em 2005 e 2006. Em seus laudos médicos, quase sempre se inscreve: “causa-mortis”, parada cardíaca. E há outro jeito de morrer?

Em termos ambientais o desastre não é menor. Os mantos vegetais desapareceram. No município de Ribeirão Preto estão reduzidos a meros 3,8%. As matas ciliares que deveriam ter sido poupadas, não existem. As mudanças climáticas já são perceptíveis. Nos meses de estio que vão de abril a setembro registraram-se taxas de umidade relativa do ar baixíssimas. Na segunda semana de 2006 foram inferiores a 10%, fato que revela um estado emergencial. Na Câmara Municipal foi, inclusive, instalada uma Frente Parlamentar para produzir estudos e análises sobre o tema.

Enquanto isso, a “turma da tripa forra” comemora. A produção nacional, segundo dados do Ministério da Agricultura, na safra 2007/08, deve chegar a 475 milhões de toneladas. A produção de etanol deve ultrapassar os 17,5 bilhões de litros previstos. As projeções informam que essa cifra será dobrada. Os passivos sociais e ambientais serão compartilhados? As distâncias sociais brasileiras serão diminuídas? Haverá um zoneamento agrícola que os norte-americanos adotam desde 1914?

Gilberto Andrade de Abreu é professor, historiador, escritor, doutorando em Educação pela Unicamp e Vereador em Ribeirão Preto pelo Partido Verde

(www.ecodebate.com.br) artigo originalmente publicado pela Gazeta Mercantil – 22/03/2007