Pacote Ecológico de Crescimento (1): Energia Elétrica, por Rogério Grassetto Teixeira da Cunha
[Correio da Cidadania] De acordo com a empresa privada Koblitz, responsável pela implantação de diversos projetos de aproveitamento termelétrico de bagaço de cana no Brasil, o custo da implantação da energia eólica giraria em torno de US$ 1.000 por quilowatt (mil watts – kw). Já para as usinas hidrelétricas seria o dobro deste valor, com US$ 1.000 por kw para a implantação e valor igual para a transmissão e distribuição (aparentemente, a geração distribuída das fontes ditas alternativas produz menos custos de transmissão e distribuição).
Diversos artigos já foram escritos censurando o Pacote de Aceleração do Crescimento (PAC) por preverem fortes impactos negativos sobre o meio ambiente, pelo plano não focar ações de desenvolvimento que sejam compatíveis com preservação e por não aproveitar algumas oportunidades que se abrem ao Brasil neste momento, relacionadas ao mercado de carbono. Pois bem, aqui, e ao longo das próximas semanas, traçarei as linhas gerais de um plano alternativo, o Pacote Ecológico de Crescimento (PEC), no sentido de conseguir os objetivos delineados no PAC, mas de forma a agredir muito menos o meio ambiente. Para começar, focarei o tema específico da energia elétrica, um dos assuntos preferidos da mídia no momento, com freqüentes e inflamadas declarações sobre a necessidade de aumento de oferta energética para o crescimento.
No PAC, afirma-se que vai haver um investimento de R$ 78,4 bilhões no setor de energia elétrica (entre geração e transmissão), planejando-se incorporar 12.300 megawatts (milhões de watts – MW) até 2010 e mais 27.420 previstos após esta data. Dentre os investimentos presentes e futuros estão as criticadas mega-usinas na região amazônica, duas no rio Madeira (Jirau e Santo Antônio) e uma no Xingu (Belo Monte), além de uma grande quantidade de outras usinas pelo país afora. Outros cerca de R$ 179 bilhões serão investidos no setor de petróleo e gás natural (na contramão do clamor mundial por uma redução no consumo de combustíveis fósseis).
Olhando-se outras fontes renováveis de energia (além da hidrelétrica), percebe-se que conseguiríamos obter valores bastante significativos de oferta elétrica com investimentos similares. Tomando-se a energia eólica, por exemplo, cálculos feitos pelo Centro de Referência para Energia Solar e Eólica Sérgio de Salvo Brito (CRESESB) indicam um potencial total para o Brasil de 143,5 gigawatts (bilhões de watts – GW), ou seja, mais de 10 vezes o que se quer incorporar até 2010. Mesmo imaginando-se o aproveitamento de apenas 10 % deste total já teríamos 14.350 MW, mais do que o planejado para os próximos quatro anos.
E quanto aos custos? O Centro Brasileiro de Energia Eólica (CBEE), localizado na Universidade Federal de Pernambuco, estima que, com o crescimento de investimento no setor, ele pode ser competitivo, podendo gerar energia a US$ 70-80 por MWh, ainda mais se considerarmos, alerta o CBEE, que o custo de implantação de usinas na Amazônia será muito alto. De acordo com a empresa privada Koblitz, responsável pela implantação de diversos projetos de aproveitamento termelétrico de bagaço de cana no Brasil, o custo da implantação da energia eólica giraria em torno de US$ 1.000 por quilowatt (mil watts – kw). Já para as usinas hidrelétricas seria o dobro deste valor, com US$ 1.000 por kw para a implantação e valor igual para a transmissão e distribuição (aparentemente, a geração distribuída das fontes ditas alternativas produz menos custos de transmissão e distribuição). Se estes valores estiverem certos, para implantar um parque de geradores eólicos no país, capazes de produzir os desejados 12.300 MW, necessitaríamos de um investimento de R$ 12,3 bilhões, mais os necessários para os projetos no setor de transmissão, valores perfeitamente dentro do previsto para o setor.
E isto ficando em somente um dos tipos de energia renovável não-hidrelétrica. Mas há outros, como a geração de eletricidade via solar (e energia solar temos de sobra), por meio de painéis fotovoltaicos, a redução da demanda por eletricidade com o aquecimento solar de água (processo distinto da geração de eletricidade), a construção de pequenas centrais hidrelétricas, menos impactantes que as grandes usinas, e a produção de eletricidade por termelétricas movidas a queima de biomassa. Além disso, poderíamos ter uma redução da demanda futura se planejássemos o crescimento do país investindo em setores industriais e de serviços que demandassem menos energia por real produzido (ou por emprego gerado).
Dada a compatibilidade de custos, fico me perguntando quais seriam os motivos desta insistência no modelo hidrelétrico que, apesar de suas inúmeras vantagens em relação às termelétricas, nos traz também uma grande série de problemas ambientais e sociais. Imaginei que há duas respostas possíveis e elas não se excluem. Os tomadores de decisão dentro do governo podem simplesmente não estar informados sobre este potencial e sobre a viabilidade. Seria uma questão de ignorância. Por outro lado, a construção de usinas envolve enormes interesses econômicos de empreiteiras, um seleto grupo de empresas que sempre tiveram fortes ligações com o poder, e estas ligações não têm a melhor das famas. Aí seria um problema muito mais sério que falta de conhecimento: não querer ou poder confrontar interesses poderosos.
Rogério Grassetto Teixeira da Cunha, biólogo, é doutor em Comportamento Animal pela Universidade de Saint Andrews.
E-mail: rogcunha@hotmail.com
(www.ecodebate.com.br) artigo originalmente publicado na edição nº 540 do jornal eletrônico Correio da Cidadania, dirigido por Plínio de Arruda Sampaio e enviado pelo autor ao EcoDebate