A volta aos transgênicos: audiência pública é o caminho certo, por Nagib Nassar
“Na audiência publica queremos perguntar e queremos saber: Quais são os trabalhos experimentais realizados para testar a segurança desses tipos transgênicos?”
[JC] A intenção da CNTBio de votar logo, já no próximo mês, a liberação do milho Bt é um convite para todos os cientistas no Brasil se manifestarem e opinarem. A responsabilidade é de todos nós. Não há como fugirmos ou nos omitirmos.
A nossa resposta à liberação do milho transgênico Bt é não. Rejeitamos e condenamos qualquer plano de aprová-lo. Trata-se de questão de segurança e saúde nacional e do meio ambiente em nosso país.
Durante os últimos dois anos, o Jornal de Ciência (SBPC) publicou vários artigos sobre o assunto de minha autoria, assim como de outros.
Tenho a honra de adicionar:
O mais claro, no primeiro instante, é que a liberação do milho Bt da Bayer será seguida pela liberação do milho de outras multinacionais. São diferentes no nome, mas unidas pela tentativa de nos vender variedades tóxicas destruidoras do meio ambiente brasileiro.
Na audiência publica, queremos perguntar e queremos saber: Quais são os trabalhos experimentais realizados para testar a segurança desses tipos transgênicos?
Experimentos foram feitos sob condições brasileiras, como manda a Constituição, por período suficiente (dez anos no mínimo), e com número de pessoas estatisticamente satisfatório?
Os resultados foram publicados em jornais reconhecidos, ou seja, julgados por pares competentes e avaliados por editores respeitados?
Queremos que tais publicações sejam disponibilizadas na Internet e avaliadas pelo todo o público interessado. Isto é importante e faz parte do conceito da consulta publica.
Há ainda outra pergunta na mente de cada um de nós: esse tipo de transgênico a ser liberado no Brasil foi liberado e autorizado no país de sua origem (Alemanha), onde é registrada a sua empresa multinacional fabricante?
Se não, por que temos de plantar e consumir um produto que foi proibido por aquele país? Será por que nós somos cobaias? Ou será que a nossa Constituição é menos rígida?
No caso da autorização, alertamos a respeitada comissão da CTNBio sobre o perigo de contaminação que nossos cultivares indígenas correm.
Nossos cultivares indígenas do milho são de alto valor genético, bem semelhante àqueles encontrados no país de origem, México, onde o plantio deste milho transgênico foi totalmente proibido.
Lembramos, ainda: todos os países europeus, que não têm cultivares indígenas, proíbem terminante a plantação do milho Bt. A estrutura alogama do milho faz com que a planta seja altamente vulnerável a uma contaminação irrecuperável.
Queremos saber, também, se há experimentos e resultados que mediram essa contaminação sob condições brasileiras e por um numero de gerações suficientes.
Não há como ignorar a literatura mundial sobre o assunto, onde os casos de contaminação por milho Bt em outros paises são bem documentados.
Não apenas o nosso inestimável patrimônio genético sofrerá o impacto desta contaminação, mas também o processo evolutivo e os diferentes ecossistemas no país.
A plantação do milho Bt ou do algodão Bt nunca melhorou as condições financeiras dos agricultores, nem reduziu o uso de inseticidas em qualquer país, mas, pelo contrário, há forte suspeita de que ela seja a causa dos freqüentes suicídios de agricultores, em Bradesh, na Índia, pela falência e frustração, diante de uma realidade bem diferente da qual a propaganda os fez pensar.
Em culturas, como as do milho, onde predominam a polinização cruzada, toda a região cultivada se contamina compulsoriamente. Os agricultores não têm escolha. São obrigados a plantar e a colher sementes de plantas contaminadas.
Não há outra opção! Eles são constantemente cobrados pelas multinacionais a pagar pelo o que eles são obrigados a plantar. O valor da semente transgênica chega até a 120 vezes mais do que o da semente normal.
Os agricultores não têm como fugir de pagar. Queremos saber como esse aspecto sócio-econômico foi estudado. Isso foi levado em conta no plano de liberação desse tipo do milho?
A contaminação causada pelo milho Bt ultrapassa a todos os limites. Além da contaminação do conjunto gênico, a toxina Bt tem efeito fatal sobre os predadores, causando desequilibro nas populações de insetos e o surgimento de ataque de insetos não nocivos anteriormente.
Queremos saber como esse aspecto foi avaliado sob as condições do Brasil.
O efeito da toxina Bt no solo é altamente destruidor. Ele persiste ativo no solo, misturando-se facilmente com a argila. Ela fica protegida contra degradação microbial e age contra microorganismos, impedindo decomposição da matéria orgânica.
Queremos saber mais uma vez: como esse fenômeno foi avaliado sob as condições brasileiras? Esse fenômeno é bem documentado na literatura mundial, o que impediu o plantio do milho Bt em todos os países europeus.
A literatura confirma, ainda, que o uso do milho Bt põe em risco a nossa saúde e o meio ambiente. O efeito ecológico não se limita apenas a eliminar certos tipos de insetos, mas se estende a propagar toxinas no meio ambiente.
Essas toxinas se movem em fluxo seqüencial de alimentos. Para isso, queremos uma resposta: qual é a rotulação dessa variedade a ser liberada?
Há genes, como os de cry, que causaram alergia fatal no passado e outros podem ser ainda piores.
Precisamos de dados sobre esse aspecto, dados suficientes, coletados durante longo período e com números considerados estatisticamente satisfatórios.
Nagib Nassar é professor titular de Genética da UnB (http://www.geneconserve.pro.br). Artigo enviado pelo autor ao “JC e-mail”
(www.ecodebate.com.br) artigo originalmente publicado no Jornal da Ciência, SBPC – JC e-mail 3211, de 27 de Fevereiro de 2007.