Quais são os cenários decorrentes do uso de biocombustíveis? por Francisco Antonio Ramos Fonseca
[EcoDebate] – O potencial de produção de energia a partir de biomassa é bastante significativo e a viabilidade técnica de seu uso, que é conhecida de longa data, já foi preconizada por Rudolf Diesel referindo-se ao óleo de amendoim como combustível.
Entretanto, estes produtos não são, ou melhor não eram competitivos com os derivados de petróleo, pois sua valoração não contempla o conceito de ciclo de vida, o que elevaria consideravelmente estes custos face aos impactos nos seres vivos. A indústria automobilística, que também não custeia os seus produtos utilizando o conceito de ciclo de vida, desenvolveu-se centrada na indústria do petróleo. Estas duas indústrias, que têm efeito sinérgico, são as responsáveis primárias pelo espetacular desenvolvimento tecnológico econômico e social do ser humano. Elas cumpriram o seu grande papel e agora é preciso avaliar as suas importâncias no futuro breve, de forma integrada, da humanidade, não só de uns poucos países, considerando a relação entre seus custos e benefícios, ajustando a defasagem de tempo em que eles ocorrem. Neste contexto novas fontes energéticas, em particular as renováveis e as que menos agridem o meio ambiente, passam a ter maior importância, pois as conseqüências do consumo ainda irresponsável do modelo industrial adotado atinge os limites possíveis e suportáveis. Os “biocombustíveis”, que não eram competitivos, tiveram uma expansão na sua participação do mercado bastante lenta até agora, mas, felizmente, começam a ser seriamente considerados como alternativa mais responsável para a manutenção da vida, o que permitirá a continuidade do desenvolvimento humano, que necessita de “megas” quantidades de energia.
Portanto, é valido assumir que o uso dos biocombustívies tem que, no mínimo, ser considerado como um objetivo estratégico importante da indústria energética e em particular da agroindústria.. Os seus custos e preços precisam ser extremamente competitivos e a valorização dos produtos energéticos precisa considerar o conceito de ciclo de vida. Para que isso seja alcançado, algumas das perguntas que necessitam de boas respostas são:
– qual é a definição de produção agrícola?
– qual é ou quais são as culturas agrícolas que permitem a geração de biocombustívies que mais satisfazem as necessidades da matriz energética a curto, médio e longo prazo?
– quais são as combinações de opções de biomassa e tecnologias de conversão em biocombustíveis que são e serão as mais eficientes no curto, médio e longo prazo, considerando o conceito de ciclo de vida?
– qual é a real importância econômica dessas combinações de culturas agrícolas e tecnologias de conversão de biocombustíveis no tempo – curto, médio e longo prazo?
– qual é o potencial de produção de biocombustíveis de cada região e do país, considerando a matriz energética de curto, médio e longo prazo e as outras necessidades?
– qual é a sinergia possível entre as diversas fontes de energia e a gerada pelos biocombustíveis ?
– quais serão os setores que consumirão os biocombustíveis em grandes quantidades, considerando as suas propriedades naturais e o mercado consumidor?
– quais são as possibilidades de comércio internacional para a biomassa e para os biocombustíveis, caso esta alternativa seja desejada?
– quais serão os preços e a disponibilidade dos combustíveis fósseis nos horizontes de tempo analisados considerando os custos presentes e futuros que as próximas gerações pagarão?
Algumas respostas, ainda que muito breves, às perguntas são listadas a seguir;
1)Qual a definição de produção agrícola dedicada à energia?
Produção de biomassa que se utiliza de diversos auxiliares – área não plantada e plantada, água, sementes, defensivos agrícolas, etc. – que é submetida a processos de transformação, gerando os biocombustíveis, outros produtos e resíduos, estando também ai incluídos os insumos e auxiliares necessários em cada etapa da transformação, isto é, cada um dos processos, até mesmo os de transporte das fases intermediários e até o ponto de consumo.
2)l é ou quais são as culturas agrícolas que maximizam a produção de biocombustíveis e que mais satisfazem as necessidades da matriz energética a curto, médio e longo prazo?
Em primeiro lugar, mencionamos as culturas de algumas palmáceas (palma, coco, etc.), oleaginosas (soja, algodão, girassol, colza, pinhão manso, etc.), as produtoras de açúcares e amido (cana de açúcar, milho etc.), algas e as que contêm alto teor de lignina/celulose (eucalipto, etc.).
Em segundo lugar, podemos listar resíduos de diversas origens (indústria agrícola, indústria madeireira, etc.), dejetos sólidos e líquidos de animais herbívoros e outros resíduos orgânicos.
3)Quais são as combinações de opções de biomassa e tecnologias de conversão em biocombustíveis que são e serão as mais eficientes no curto, médio e longo prazo, considerando o conceito de ciclo de vida?
3.1 Biocombustível, Biomassa e Tecnologias atuais de transformação
. Óleo vegetal puro (palmácea e/ou oleaginosa)
Extração a frio
Biodiesel
Vegetal e Animal
Extração a frio e/ou a solvente
Transesterificação
Bioetanol
Fermentação açúcar e/ou amido
3.2 Biocombustível, biomassa e tecnologia de transformação em evolução
( apresentam um potencial de redução de custos muito significativo)
Biodiesel a partir de lignina / celulose –
Fischer Tropsch Diesel a partir de gás de síntese de biomassa
HTU Diesel – Hydro Thermal Upgrading
Digestão biológica e tratamento químico
Bioetanol a partir de celulose
Biodigestão seletiva
Biogás a partir de matéria orgânica ( SNG – Substitute Natural Gas )
Biodigestão anaeróbia com ou sem remoção de CO2
4) Qual é a real importância econômica dessas culturas agrícolas no tempo – curto, médio e longo prazo?
A priorização das tecnologias agrícolas e de transformação decorrem de exercício de futurologia, que consideram um horizonte de tempo de 30 anos, o que convenhamos é muito difícil, entretanto, necessário. A importância desse exercício é exemplificada pela geração de empregos da agroindústria sucro alcooleira que hoje oferta 2 milhões de postos de trabalho,
porém ela já teve cerca de 4 milhões trabalhadores há aproximadamente 30 anos. Esta realidade era previsível posto que temos pleno conhecimento da curva de aprendizado, seus impactos e o uso adequado deste conhecimento permitiria desenvolver medidas mitigadoras para esta perda de postos de trabalho.
Como sabemos, os principais produtos do sistema de transformação dos biocombustívies são energia elétrica, insumos energéticos para a indústria de transformação e para a indústria de transporte. Devemos utilizar o conceito de ciclo de vida para valoração dos combustíveis e para isso é essencial promovermos e computarmos o balanço dos promotores do efeito estufa, pois essa é uma “moeda” que pode catapultar o nosso desenvolvimento sócio econômico, além de beneficiar a qualidade de vida futura. Cabe lembrar o óbvio: que o nosso sistema de valoração tem que contemplar os custos e preços do biocombustível, de seus sistemas de distribuição, infra-estrutura, os custos de capital, operacionais, de manutenção e de transporte internacional, quando associados aos interesses relativos à nossa participação em comércio exterior.
As respostas a todas essas e algumas outras diversas perguntas nos darão as informações mínimas que permitirão elaborar um modelo especifico para o Brasil utilizando-se os devidos métodos quantitativos e qualitativos. A partir desse modelo desenharemos diversos cenários onde visualizaremos as suas várias conseqüências. Com essa modelagem poderemos avaliar os diversos custos para os diversos casos gerados e escolher aquele mais adequado às nossas realidades.
O mais importante requisito de nosso modelo é, quaisquer que sejam os cenários, atender a demanda de energia de nosso mercado e dos mercados alvos externos da forma mais econômica, mais segura e sem dúvida os biocombustíveis terão uma participação importante nesse cenário. Mas qual é essa participação e como chegaremos lá?
Francisco Antonio Ramos Fonseca,
Engenheiro Químico, Consultor Ambiental, Pós-graduado em Análise de Riscos e MBA Corporativo
in EcoDebate, www.ecodebate.com.br, 17/05/2006