Vacas magras, artigo de Montserrat Martins
[EcoDebate] Desde o Egito antigo se fala em eras de vacas gordas e de vacas magras, é bíblico o relato do sonho do faraó interpretado por José, dos 7 anos de fartura e os 7 anos de escassez. Os economistas chamam isso de “ciclos” e por isso os governos devem planejar “medidas anticíclicas” para minimizar os efeitos dos anos difíceis.
Na crise financeira internacional de 2008 o governo brasileiro fez a sua parte, favorecendo a construção civil, aquecendo o mercado interno. Não pode fazer o mesmo agora em 2016, porque não tem mais “caixa”, o que tem efeito recessivo.
Para isso deviam servir os anos de “vacas gordas”, investir em suportes para dificuldades futuras. Infra-estrutura é essa base que nos falta, nos transportes, no saneamento, na saúde e educação. Ao invés de infra-estrutura, os anos de fartura foram dedicados ao consumismo.
A Europa no início do século XX fez grandes investimentos em educação, moradia, transporte e saúde, bases para as pessoas chegarem aos bens pessoais. Aqui liberamos os impostos para o consumo de produtos eletrodomésticos, o que deu grandes alegrias ao povo, mas não demos condições de continuidade ao progresso.
Para não comparar Brasil com Europa, o que seria injusto, comparemos a outro país que era claramente do “terceiro mundo” igual a nós há 40 anos, nos anos 70, a Coréia do Sul. Pois de lá para cá, com investimentos direcionados à educação, ciência e tecnologia, os coreanos se tornaram uma potência econômica. Hoje consumimos produtos deles, da Hyundai à Samsung. Esta é hoje a maior fabricante de smartphones do mundo, bem à frente da Apple do Steve Jobs, com a qual rivalizou no desenvolvimento da tecnologia “touchscreen” para celulares.
É chavão falar em Educação como prioridade, mas é fato que o Brasil nada fez para colocar essa prioridade em prática nestas últimas décadas, enquanto a Coréia fazia a sua “lição de casa”. Investimentos em ciência e tecnologia, então, que não são demandas populares e não dão votos, não se ouve nem falar por aqui. Há quem credite o sucesso sulcoreano aos investimentos americanos, como se o próprio Brasil também não tivesse ampla parceria comercial americana, eis que éramos dependentes comercialmente de Washington há poucas décadas.
Hoje temos maior diversidade comercial, com a Ásia e a Europa sendo tão relevantes para nós como os norte-americanos, mas o nosso padrão de negócios não mudou, pois continuamos sem produtos tecnológicos. Ferrovias construídas aqui com ajuda dos asiáticos seriam um acréscimo em infra-estrutura, se não servissem apenas para levar nossos minérios para os portos de onde irão para a Ásia e voltarão para cá, para serem vendidas como produtos industrializados. Assim as vacas seguem magras.
Montserrat Martins, Colunista do Portal EcoDebate, é médico psiquiatra, bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais e presidente do IGS – Instituto Gaúcho da Sustentabilidade.
in EcoDebate, 18/01/2016
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Muito bem colocado!
Mais uma década já perdida, e outras que virão à frente, em decorrência da falta de verdadeiro interesse pela Nação dos corruptos de plantão! Pátria educadora… que piada!
Não tem essa de vacas magras e vacas gordas. A questão é de escassez.
As alterações climáticas, a derrubada do que ainda há de florestas, a morte de rios, a acidificação dos oceanos, e tantos outros problemas ambientais, tudo isso associado a uma superpopulação humana planetária – que continua crescendo – são a causa de grandes problemas sociais e da escassez de alimentos, cenário este que tende a se agravar, em brevíssimo espaço de tempo.
Os ingênuos e os ávidos por desenvolvimento econômico infinito transformam seus desejos de fortuna, de futuro próspero e de vida eterna em realidade fantasiosa.
Um médico psiquiatra, certamente, não trilharia esse caminho. Talvez haja um equívoco.
Um dos mais profundos imbróglios do subdesenvolvimento do Brasil, é não conseguirmos definir, quais são as origens legítimas dos problemas da pobreza que assolam o nosso país. Uns dizem que é o liberalismo e o capitalismo, enquanto outros dizem que é o comunismo e o radicalismo da esquerda. Aquilo que constatamos é que vivemos uma inflação demoníaca, que nenhuma economia consegue resistir, uma educação fundamental de baixa qualidade, muitos governantes com gestão roçando a mediocridade, e uma máquina estatal oxidada e excessivamente pesada a nível econômico e financeiro.
Mas apesar de tudo, acredito de que algum dia seremos um Brasil desenvolvido, com Ordem e Progresso.