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Belo Monte. Atualização do processo de destruição dos povos indígenas

 

Belo Monte. Atualização do processo de destruição dos povos indígenas. Entrevista especial com Thais Santi

 

“O que mais assusta em Belo Monte é justamente a naturalização. Não de um genocídio ou de uma violência de sangue, mas de um etnocídio praticado sob a égide de um Estado constitucional, em que o direito não põe limite ao ‘tudo é possível'”, alerta a procuradora. 

Belo Monte ainda na fase de construção
Foto: lalodealmeida.com.br 

“Acessar essas comunidades é ter a possibilidade de descobrir uma nova dimensão de existência, em que o tempo tem outro ritmo, o rio tem outro significado, a natureza integra a vida.” É assim que a procuradora federal Thais Santi descreve o que chama de “experiência” de trabalhar em Altamira, no Pará.

É nessa região que ocorre a construção da hidrelétrica de Belo Monte, empreendimento do Governo Federal que está acabando com as formas de vida indígenas e da comunidade local. É nesse contexto que Thais se insurge contra a omissão do Poder Público que, mesmo legalmente alertado dos riscos do empreendimento, ignora e promove o que a procuradora define como etnocídio — algo mais perverso que genocídio, pois vai matando os povos aos poucos. “O genocídio assassina os povos em seu corpo, enquanto o etnocídio os mata em seu espírito”, dispara.

“O que mais assusta em Belo Monte é justamente a naturalização”, diz, ao associar Altamira ao conceito de “banalidade do mal”, da filósofa e socióloga alemã Hannah Arendt.

Na entrevista, concedida por e-mail à IHU On-Line, Thais caracteriza Belo Monte como “fruto de uma escolha política de governo, por um modelo de desenvolvimento que utiliza os rios da Amazônia como matriz energética”. E para levar a cabo essa opção, são ignorados laudos e condicionantes legais, ao estilo do europeu que “descobre” a América e quer tornar o índio cativo. “A opção do Estado foi implementar Belo Monte sem executar as obrigações condicionantes e conter os protestos dos indígenas, com promessas e distribuição de presentes, que geraram ainda mais conflito e impactos”, revela.

E vai além: “vultosas quantias destinadas ao programa emergencial de etnodesenvolvimento foram desviadas para uma política de distribuição de mercadorias”. O resultado vem sendo a degradação completa desse povo. “O consumo de bens supérfluos, a criação de novas necessidades, o abandono das atividades e práticas tradicionais vieram acompanhados de alcoolismo, novas doenças, aumento da mortalidade infantil, desnutrição, diarreia, conflitos e deslegitimação de lideranças, divisões de aldeias, etc.”, completa Thais.

Thais Santi (foto abaixo) é procuradora do Ministério Público Federal em Altamira, no Pará, desde 2012. Nasceu em São Bernardo do Campo, São Paulo, e cresceu em Curitiba, no Paraná. Possui graduação em Direito pela Universidade Federal do Paraná – UFPR, especialização em Ciência Política pela UFPR e mestrado em Teoria e Filosofia do Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC. Já atuou como professora de Ética, Filosofia Jurídica, Introdução ao Estudo do Direito, Direito Eleitoral e Direito Constitucional.

Confira a entrevista.

Foto: Lilo Clareto / El País

 

IHU On-Line – Como sua experiência em Altamira lhe ajudou a compreender a questão indígena? Qual a contribuição desse lugar e das pessoas para seu conhecimento acerca da questão indígena? O que está em jogo nestas disputas?

Thais Santi – Para além de conhecimento e compreensão, Altamira é uma experiência. Populações tradicionais vivem nas margens do rio Xingu [1], numa distância que é muito mais do que os quilômetros e dias de barco que as separam do centro urbano. Acessar essas comunidades é ter a possibilidade de descobrir uma nova dimensão de existência, em que o tempo tem outro ritmo, o rio tem outro significado, a natureza integra a vida. E o rio Xingu guarda uma riqueza única, formada por uma diversidade de povos indígenas, caboclos, camponeses, ribeirinhos, que se adaptaram à sua sazonalidade e se tornaram portadores de um conhecimento valioso de uma biodiversidade que se perde a cada dia e que é ainda desconhecida da ciência oficial. Não tenho dúvida de que temos muito a aprender aqui.

Entendo que, mundialmente, Altamira é uma das representações mais significativas de um conflito que marca a nossa época. Entre um imaginário antropocêntrico, em que o homem se assenhora da natureza, numa concepção de desenvolvimento e de progresso, para ampliação de acesso ao consumo, que já se mostrou insustentável pelos limites do próprio planeta. E um outro imaginário em que a natureza é mais do que instrumental do homem. O rio Xingu é sagrado para esses povos. E a água é vida, e certamente o bem mais valioso de um futuro próximo.

O que dizer, então, de Belo Monte [2]? A ousadia de mudar o curso do rio Xingu, de desviar o rio por canais artificiais para gerar energia na Amazônia, deixando secar uma área de 100 km, da chamada Volta Grande do Xingu [3]. O impacto dessa interferência humana na natureza ainda não foi mensurado. Haverá extinção de peixes que sequer foram conhecidos. Há risco de desertificação de vasta extensão territorial. E toda uma região de áreas protegidas passa a conviver com o aumento da pressão pelos recursos naturais e do desmatamento.

“Altamira é uma das representações mais significativas de um conflito que marca a nossa época”

IHU On-Line – Como compreender as questões de fundo do conflito entre população local, povos indígenas e a construção de Belo Monte?

Thais Santi – Existe aqui, sim, uma disputa. Uma tensão entre ummodelo de desenvolvimento de uma cultura hegemônica e modos de vida de grupos minoritários. Nove etnias, com índios de contato recente, habitam as 11 Terras Indígenas da região, além de comunidades desaldeadas, em uma extensão de mais de cinco milhões de hectares. Aqui, a decisão do Estado de implementar Belo Monte se fez com a consciência de que essa seria uma empreitada dificultosa, pois além dos desafios de ordem ambiental e de engenharia, foram mais de 30 anos de debates e um diagnóstico desfavorável dos Estudos de Impacto Ambiental.

Por isso, é certo que Belo Monte é fruto de uma escolha política de governo, por um modelo de desenvolvimento que utiliza os rios da Amazônia como matriz energética. Mas a viabilidade da hidrelétrica apenas foi atestada após o compromisso de que a implementação desse projeto não representaria a eliminação do modo de vida dos grupos indígenas impactados. Com isso, um plano de mitigação de impacto garantiria o núcleo essencial do art. 231 da Constituição, que reconhece aos índios a sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, bem como o direito de protagonizar a sua história, participando das decisões que os afetem.

IHU On-Line – A senhora relaciona o cenário de Altamira a Hannah Arendt [4]. Que nexos são possíveis estabelecer entre a história da implantação de Belo Monte e Hannah Arendt?

Thais Santi – Hannah Arendt fala da ‘banalidade do mal‘ e de um mundo em que tudo é possível. Arendt, quando relata o totalitarismo, descreve que Hitler [5] afirmava ter descoberto uma força da natureza, num processo de sobreposição de uma raça, com eliminação das eventuais barreiras. O que a política nazista faria, seria simplesmente catalisar, acelerar esse processo. E, com isso, o genocídio se transformaria num evento natural.

O que mais assusta em Belo Monte é justamente a naturalização. Não de um genocídio ou de uma violência de sangue, mas de um etnocídio praticado sob a égide de um Estado constitucional, em que o direito não põe limite ao ‘tudo é possível’. Pierre Clastres [6] explica que o genocídio remete à ideia de raça, já o etnocídio, à destruição de uma cultura. O genocídio assassina os povos em seu corpo, enquanto o etnocídio os mata em seu espírito. Isso é Belo Monte! Os Estudos de Impacto Ambiental foram precisos em demonstrar que havia um processo de desagregação social e cultural dos povos indígenas do médio Xingu, que remonta à fase de abertura da rodovia transamazônica. E que esses grupos vinham desde então criando e experimentando estratégias de autoadaptação. Diante da magnitude dos impactos previstos para instalação da hidrelétrica, o diagnóstico do EIA/RIMA [7] foi de que Belo Monte tornaria a velocidade desse processo incompatível com a capacidade de reação dos indígenas e poderia gerar a sua completa desagregação, com risco de supressão irreversível dos modos de vida e da transmissão dos conhecimentos tradicionais, caso não fossem fortalecidos para reagir com autonomia e com seus territórios protegidos.

Há um grande equívoco em afirmar que Belo Monte é uma simples escolha política do Governo Federal. A decisão é tomada, a despeito dos alertas sobre a complexidade e o custo socioambiental (e financeiro, inclusive) da empreitada. E há um equívoco maior ainda, em confundir a escolha política por implementar Belo Monte, com a escolha totalitária (desautorizada pelo direito) de fazê-lo tomando os povos indígenas como obstáculos a serem superados pelo caminho mais curto e barato, com políticas de silenciamento, pacificação e dependência, à margem das normas do licenciamento.

“O que mais assusta em Belo Monte é justamente a naturalização”

IHU On-Line – Em que medida Belo Monte reproduz o modelo do europeu que chegou à América e tentou “civilizar” o índio oferecendo “bugigangas”? Como foi e como deveria ser o papel da União, especialmente o Executivo, nesse episódio? O que está por trás da falha de planos como o Emergencial de Belo Monte?

Thais Santi – A opção do Estado foi implementar Belo Monte sem executar as obrigações condicionantes e conter os protestos dos indígenas, com promessas e distribuição de presentes, que geraram ainda mais conflito e impactos. A viabilidade da hidrelétrica foi condicionada, em 2010, aações emergenciais de etnodesenvolvimento (programas de fortalecimento cultural, econômico e social) e a um robusto Plano de Proteção dos Territórios Indígenas, de modo a diminuir o cenário desfavorável diagnosticado e preparar a região para o início das obras. Passados cinco anos, nenhuma ação de proteção territorial foi realizada (mesmo com decisão liminar da Justiça Federal). A Terra Indígena Cachoeira Seca, por exemplo, foi a mais desmatada de toda a Amazônia brasileira e se tornou área de conflito interétnico.

Vultosas quantias destinadas ao programa emergencial de etnodesenvolvimento (que tinha por objetivo manter os indígenas em suas terras e fortalecê-los em todos os aspectos) foram desviadas para uma política de distribuição de mercadorias (que ficou conhecida como Plano Emergencial), que atraiu todos os grupos em peso para o núcleo urbano para disputar nos balcões da Norte Energia toda sorte de promessas. Com isso, antes mesmo das intervenções físicas no rio Xingu, Belo Monte chegou, pelas mãos do empreendedor, à mais remota aldeia, abrindo aos indígenas de modo abrupto as portas do mercado de consumo, sob o controle da empresa Norte Energia. Essa política, com a quantidade de recursos despendidos, foi holocáustica na organização social, cultural e econômica desses grupos e aumentou exponencialmente a potencialidade etnocida da UHE Belo Monte e a velocidade do processo em curso identificado pelo EIA/RIMA.

O consumo de bens supérfluos, a criação de novas necessidades, o abandono das atividades e práticas tradicionais vieram acompanhados de alcoolismo, presença constante dos indígenas em Altamira (incluindo velhos e crianças que nunca haviam estado na cidade), novas doenças, como diabetes, obesidade, tuberculose, aumento da mortalidade infantil, desnutrição, diarreia, conflitos e deslegitimação de lideranças, divisões de aldeias, etc. E conflitos que inicialmente se faziam contra a obra e pelo cumprimento de suas condicionantes se individualizaram em disputas nos balcões da Norte Energia, que até hoje se verificam e, desde então, os espaços legítimos de participação dos indígenas nesse processo são corrompidos e a concessionária reescreve cotidianamente suas obrigações.

Reiteração de políticas colonizadoras

Isso é Belo Monte. Um amplo desrespeito às normas do licenciamento, que garantem o direito desses indígenas de efetivamente escolher e controlar a forma de aproximação com a sociedade envolvente e com as transformações previstas. E, não bastasse isso, são nove etnias, com modos próprios de organização e com concepções cosmológicas distintas. Com ações homogeneizantes, em substituição ao plano de mitigação previsto, Belo Monte fulmina o art. 231 da Constituição e, sob a égide de um Estado de Direito, esse Programa de Desenvolvimento do Governo Federal na bacia do rio Xingu se transforma numa reiteração das políticas colonizadoras de eliminação da diferença que os grupos indígenas representam. Uma ação violenta de incorporação à cultura dominante, que se naturaliza pelo discurso de um positivismo evolucionista, que defende um processo inevitável de incorporação de culturas arcaicas a uma civilização superior. E Belo Monte apenas acelera… Mas nada há de natural aqui. O que encontramos é violênciae grupos esfacelados, como que vítimas de uma guerra.

Plano Emergencial e suas armas

É difícil dizer o que está por trás do Plano Emergencial, se o seu resultado foi o controle total dos indígenas pelo empreendedor. A presidente da Fundação Nacional do Índio – Funai [8] afirmou que as entidades envolvidas neste processo não estavam preparadas para Belo Monte. Quanto a isso, eu diria, lembrando a forma como Hannah Arendtconclui a sua análise sobre a ‘banalidade do mal‘: política não é um jardim de infância… Infantilizar Belo Monte é aceitar o ‘tudo é possível’.

Evidente que há muito mais do que erros no Plano Emergencial e o processo de Belo Monte revela isso. Primeiro, porque se trata de uma política de silenciamento que iniciou de modo discreto nos escritórios da Eletronorte e que assume uma dimensão extraordinária com o desvio dos recursos destinados ao etnodesenvolvimento. E isso apenas se faz porque o programa não foi implementado. E, não bastasse isso, se de erro se tratasse, ele deveria ter sido corrigido com o início das ações do Plano Básico Ambiental, para que o processo de licenciamento tomasse o rumo da legalidade. Mas o Estado se omite novamente, a Funai não foi estruturada (mesmo com decisão da Justiça Federal) e a concessionária Norte Energia, após obter a Licença de Instalação, assume uma nova roupagem e passa a corromper e a reescrever suas obrigações. Com cotas de combustível, com a substituição das moradias tradicionais por casas de madeira com brasilit, o Plano Emergencial se perpetua e as aldeias se transformam à imagem de favelas urbanas.

As obrigações que condicionaram a obra e a responsabilidade do empreendedor — poluidor pagador — pelas externalidades negativas de seu projeto são revistas unilateralmente e os balcões da empresa se tornam espaço de conflito. E a Norte Energia mais uma vez assume uma postura de liberalidade diante das obrigações que executa, como pequenos favores excepcionalmente conferidos. Como afirma o antropólogo Eduardo Viveiros de Castro [9], transformar os índios em pobres, essa é a verdadeira definição do etnocídio.

“Política não é um jardim de infância… Infantilizar Belo Monte é aceitar o ‘tudo é possível’”

IHU On-Line – Por que o homem branco, nas suas formas de vida e cultura ocidentalizada, não consegue compreender a relação do índio com a terra, o meio ambiente?

Thais Santi – A filosofia latino-americana de Enrique Dussel [10] é bastante interessante para compreendermos esse processo de negação da diferença. Segundo esse filósofo, quando o europeu chega ao continente americano não encontra um ‘outro’, que mereça ser respeitado na sua exterioridade. Mas encontra um ‘não-eu’, que apenas pode ser transformado no ‘eu’, e trazido para o universo da totalidade. O respeito à diferença depende do reconhecimento do ‘outro’ enquanto ser. Com isso, o assimilacionismo tem na sua base a eliminação da diferença, e possibilidade única de desenvolvimento na totalidade, e jamais na exterioridade.

A dificuldade de reconhecer a relação do índio com a natureza, de respeitar seu modo de vida é a mesma que nos leva a olhar o índio como pobre, que necessita ter acesso a bens materiais que elevem seu padrão de existência. E é a mesma dificuldade que temos de olhar o mundo sob outra perspectiva e de reconhecer que o que se perde com Belo Monte é muito mais do que a reprodução de um modo de vida e a transmissão de um conhecimento tradicional. Nós é que perdemos com isso. É evidente, o mundo se empobrece a cada vez que a visão única se impõe. E a quem isso interessa?

IHU On-Line – É possível pensar em um desenvolvimento que inclua o modo de vida indígena de relação com o outro e com a terra?

Thais Santos – Há alguns anos se falava em desenvolvimento sustentável. Hoje, acredito que não se fala em desenvolvimento que não seja sustentável. Um projeto que acarreta a destruição da Amazônia, com o aumento do desmatamento sem barreiras não pode ser chamado de desenvolvimento. Dentro de um Estado plural, um projeto que se faça com a destruição de modos de vida de grupos para os quais o rio tem um significado peculiar, há de ter outro nome, mas não desenvolvimento. O próprio Supremo Tribunal Federal já reconheceu que onde se encontram grupos indígenas, o desenvolvimento que se fizer contra ou sem os índios ofende a Constituição, que assegura um desenvolvimento ‘ecologicamente equilibrado’, ‘humanizado’ e ‘culturalmente diversificado’.

IHU On-Line – A Constituição de 1988 assegura direitos a povos indígenas. Em que medida essa legislação ainda é um frio aparato legal, distante da realidade dos povos indígenas no Brasil, em especial no Xingu? Como garantir tais direitos constitucionais e tentar avançar em outros?

Thais Santi – Neste processo da UHE Belo Monte não há dúvida de que os direitos indígenas foram tratados como obstáculos a serem superados. E o caminho mais fácil é transformá-los. Com isso, o custo socioambiental do empreendimento é transferido aos atingidos. E as obrigações que condicionaram a obra, bem como as normas do licenciamento, uma vez que não são exigíveis (já que Belo Monte nunca pôde parar), se transformam em meras peças retóricas, cuja função é dar sustentação às decisões políticas do Governo Federal.

É necessário insistir na ilegalidade dos processos de licenciamento em que as decisões dos órgãos intervenientes se fazem contrariando os pareceres de seus técnicos. É necessário responsabilizar o Estado, individualizar condutas de improbidade e crimes dentro destes processos.

Ameaça à Constituição

O Brasil vive um momento extremamente delicado, com riscos à Constituição Federal, com a possibilidade de retrocessos no que diz respeito aos direitos fundamentais. A história vai mostrar para que Belo Monte foi construída. Temos aqui os Estudos de Impacto Ambiental realizados pelas três maiores empreiteiras do país. Somado a isso, Belo Monte abre a região para exploração de recursos naturais da Amazônia em escala industrial, o que potencializa ao infinito os seus impactos ambientais. E nesse contexto, as terras indígenas representam um grande entrave. Há muito mais do que retrocesso nos direitos dos povos indígenas em risco pelos processos em curso no Congresso Nacional.

“Um projeto que acarreta a destruição da Amazônia, com o aumento do desmatamento sem barreiras, não pode ser chamado de desenvolvimento”

IHU On-Line – O governo federal e os Poderes Legislativo e Judiciário entendem a complexidade da questão indígena que envolve os povos do Xingu e Belo Monte?

Thais Santi – Seria pouco dizer que o governo federal e o poder Legislativo não compreendem os direitos dos povos indígenas. Há hoje claramente a representação majoritária de grupos ligados a setores contrários aos povos indígenas. É preciso interpretar a Constituição como um pacto contramajoritário, que tem justamente o objetivo de evitar que maiorias eventuais suprimam direitos fundamentais assegurados às minorias. Esse é o grande valor da Constituição. E, se há um caminho, é protegê-la.

Por João Vitor Santos

Notas:

[1] Rio Xingu: é um rio do Brasil com aproximadamente 1.979 km de extensão, que começa em Mato Grosso e é afluente pela margem direita do rio Amazonas no estado do Pará. (Nota da IHU On-Line)

[2] Belo Monte: projeto de construção de usina hidrelétrica previsto para ser implementado em um trecho de 100 quilômetros no Rio Xingu, no estado brasileiro do Pará. Planejada para ter potência instalada de 11.233 MW, é um empreendimento energético polêmico não apenas pelos impactos socioambientais que serão causados pela sua construção. A mais recente controvérsia sobre essa usina envolve o valor do investimento do projeto e, consequentemente, o seu custo de geração. Saiba mais na edição 39 dos Cadernos IHU em formação, Usinas hidrelétricas no Brasil: matrizes de crises socioambientais, em http://bit.ly/ihuem39; e nas entrevistas publicadas no sítio do IHU: Belo Monte: a barreira jurídica, com Felício Pontes Júnior, dia 26-04-2012, em http://bit.ly/ihu260412; Belo Monte. “O capital fala alto, é o maior Deus do mundo”, com Ignez Wenzel, dia 28-01-2012, em http://bit.ly/ihu280112; Belo Monte e as muitas questões em debate, com Ubiratan Cazetta, dia 23-01-2012, em http://bit.ly/ihu230112; “Belo Monte é o símbolo do fim das instituições ambientais no Brasil”, com Biviany Rojas Garzon, dia 13-12-2011; em http://bit.ly/ihu131211; Não é hora de jogar a toalha e pendurar as chuteiras na luta contra Belo Monte, com Dom Erwin Krautler, dia 03-08-2011, disponível em http://bit.ly/ihu030811. Na seção Notícias do Dia, o sitio do Instituto Humanitas Unisinos – IHU seguem acompanhando as questões relativas à Belo Monte. Confira em ihu.unisinos.br. (Nota da IHU On-Line)

[3] Volta grande do Xingu: trecho sinuoso e cheio de cachoeiras do Rio Xingu onde, no final do trecho, será construída a Hidrelétrica de Belo Monte. A Volta inicia no município de Altamira, no Pará. (Nota da IHU On-Line)

[4] Hannah Arendt (1906-1975): filósofa e socióloga alemã, de origem judaica. Foi influenciada por Husserl, Heidegger e Karl Jaspers. Em consequência das perseguições nazistas, em 1941, partiu para os Estados Unidos, onde escreveu grande parte das suas obras. Lecionou nas principais universidades deste país. Sua filosofia assenta numa crítica à sociedade de massas e à sua tendência para atomizar os indivíduos. Preconiza um regresso a uma concepção política separada da esfera econômica, tendo como modelo de inspiração a antiga cidade grega. A edição mais recente da IHU On-Line que abordou o trabalho da filósofa foi a 438, A Banalidade do Mal, de 24-03-2014, disponível em http://bit.ly/ihuon438. Sobre Arendt, confira ainda as edições 168 da IHU On-Line, de 12-12- 2005, sob o título Hannah Arendt, Simone Weil e Edith Stein. Três mulheres que marcaram o século XX, disponível em http://bit.ly/ihuon168, e a edição 206, de 27-11-2006, intitulada O mundo moderno é o mundo sem política. Hannah Arendt 1906-1975, disponível em http://bit.ly/ihuon206. (Nota da IHU On-Line)

[5] Adolf Hitler (1889-1945): ditador austríaco. O termo Führer foi o título adotado por Hitler para designar o chefe máximo do Reich e do Partido Nazista. O nome significa o chefe máximo de todas as organizações militares e políticas alemãs, e quer dizer “condutor”, “guia” ou “líder”. Suas teses racistas e antissemitas, bem como seus objetivos para a Alemanha, ficaram patentes no seu livro de 1924, Mein Kampf (Minha Luta). No período da ditadura de Hitler, os judeus e outros grupos minoritários considerados “indesejados”, como ciganos e negros, foram perseguidos e exterminados no que se convencionou chamar de Holocausto. Cometeu o suicídio no seu Quartel-General (o Führerbunker) em Berlim, com o Exército Soviético a poucos quarteirões de distância. A edição 145 da IHU On-Line, de 13-06-2005, comentou na editoria Filme da Semana, o filme dirigido por Oliver Hirschbiegel, A Queda – as últimas horas de Hitler, disponível emhttp://bit.ly/ihuon145. A edição 265, intitulada Nazismo: a legitimação da irracionalidade e da barbárie, de 21-07-2008, trata dos 75 anos de ascensão de Hitler ao poder, disponível em http://bit.ly/ihuon265. (Nota da IHU On-Line)

[6] Pierre Clastres (1934-1977): antropólogo e etnógrafo francês da segunda metade do século XX. É conhecido sobretudo por seus trabalhos de antropologia política, suas convicções anarquistas e antiautoritárias e por sua pesquisa sobre os índios Guayaki do Paraguai. (Nota da IHU On-Line)

[7]Estudo de Impacto Ambiental/Relatório de Impacto Ambiental – EIA/RIMA: o EIA é um dos procedimentos de Avaliação de Impacto Ambiental – AIA previstos na lei 6938/81, que deve ser realizado às expensas da instituição promotora das atividades sob avaliação, de acordo com as técnicas clássicas de AIA e sob orientação da autoridade ambiental pertinente, que integra o Sistema Nacional do Meio Ambiente – SISNAMA. O RIMA é um relatório que visa comunicar ao público e às pessoas não especializadas, todos os resultados relevantes do EIA, a fim de que o objeto de avaliação seja discutido em audiência pública. Pode ser convocada pela autoridade ambiental, por solicitação de entidade civil, por solicitação do Ministério Público e a pedido de 50 ou mais cidadãos. Os EIA/RIMA são, portanto, um instrumento participativo de decisão. (Nota da IHU On-Line)

[8] A entrevista refere-se a Maria Augusta Assirati, que presidiu a Funai até2014. O atual presidente é João Pedro Gonçalves da Costa. Confira a reportagem em que a ex-presidente declara que “Direitos de índios podem ser aniquilados”, publicada nas Noticias do Dia de 01-0-2013, do sitio do Instituto Humanitas Unisinos – IHU, disponível em http://bit.ly/1lMbEhc. (Nota da IHU On-Line)

[9] Eduardo Viveiros de Castro (1951): antropólogo brasileiro, professor do Museu Nacional do Rio de Janeiro, na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Concedeu a entrevista O conceito vira grife, e o pensador vira proprietário de grife à edição 161 da IHU On-Line, de 24-10-2005, disponível em http://bit.ly/ihuon161.” Entre outras publicações, escreveu Arawete: O Povo do Ipixuna (São Paulo: CEDI, 1992), A inconstância da alma selvagem (e outros ensaios de antropologia). (São Paulo: Cosac & Naify, 2002) e Métaphysiques cannibales. Lignes d’anthropologie post-structurale (Paris: Presses Universitaires de France, 2009). Ele também é autor do prefácio do livro A Queda Do Céu – Palavras de um xamã yanomami, de Davi Kopenawa e Bruce Albert (São Paulo: Companhia das Letras, 2015). Confira um trecho da obra em http://bit.ly/1Q0Fg5u. (Nota da IHU On-Line)

[10] Enrique Dussel (1934): filósofo argentino radicado (exilado) desde 1975 no México. É um dos maiores expoentes da Filosofia da Libertação e do pensamento latino-americano em geral. Autor de uma grande quantidade de obras, seu pensamento discorre sobre temas como: filosofia, política, ética e teologia. Tem se colocado como crítico da pós-modernidade chamando por um novo momento denominado transmodernidade. Tem mantido diálogos com filósofos como Apel, Gianni Vattimo, Jürgen Habermas, Richard Rorty, Lévinas. É um crítico do pensamento eurocêntrico contemporâneo. (Nota da IHU On-Line)

 

(EcoDebate, 03/12/2015) publicado pela IHU On-line, parceira editorial da revista eletrônica EcoDebate na socialização da informação.

[IHU On-line é publicada pelo Instituto Humanitas Unisinos – IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.]

 

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