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Greve dos petroleiros, fundo Petros e a perda do grau de investimento da Petrobras, artigo de José Eustáquio Diniz Alves

 

“Não há agenda positiva possível enquanto o governo estiver sitiado
pelas roubalheiras que hospedou, tolerou e finge desconhecer”
Elio Gaspari (02/08/2015)

 

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[EcoDebate] O sonho do petróleo do pré-sal está se tornando um pesadelo. Os trabalhadores do setor de petróleo, liderados pela Federação Única dos Petroleiros (FUP), fizeram uma greve de 24 horas no dia 24 de julho de 2015, protestando contra a ameaça de extinção de milhares de postos de trabalho, caso a Petrobras ponha em prática seu novo Plano de Gestão e Negócios, que visa o corte de US$ 89 bilhões em investimentos e despesas, bem como a venda de ativos de patrimônio da companhia, na ordem de US$ 57 milhões. Ou seja, a privatização de parte do patrimônio público.

Não deixa de ser irônico, pois um dos principais sindicatos que contribuíram para a fundação do Partido dos Trabalhadores (PT), está mobilizando suas bases contra a privatização de parte da Petrobras, levada a cabo por uma diretoria indicada pelo PT e pela presidenta Dilma.

Mas, evidentemente, nem o PT e nem a Presidenta foram os alvos centrais da greve. O protesto maior focou nos desmandos do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, e no Projeto de Lei 131, de autoria do senador José Serra (PSDB-SP), que quer tirar da estatal o papel de operadora única do pré-sal, assim como 30% dos blocos já licitados. Ou seja, a esquerda e a direita disputam alternativas para sair do imbróglio do setor de energia no Brasil.

Depois do enfraquecimento da saúde financeira da Petrobras nos últimos 12 anos, os petroleiros foram para as ruas para evitar a última pá de cal na “Empresa Orgulho Nacional”. O movimento dos petroleiros do dia 24/07 foi seguido de uma manifestação da CUT, realiza em Brasília no dia 28/07, contra os rumos da política macroeconômica. Cerca de 500 participantes ergueram cartazes com os seguintes dizeres: “Contra o retrocesso”, “Contra os juros altos“, “Contra a retirada dos direitos dos trabalhadores” e “Abaixo o Plano Levy” (ministro do governo Dilma Rousseff, que foi eleita apoiada pela FUP e pela CUT). Realmente é muita confusão para a cabeça do povo brasileiro.

A Petrobras teve lucro líquido de apenas R$ 531 milhões no segundo trimestre de 2015, resultado quase 90% menor que no mesmo período do ano passado, quando lucrou R$ 4,959 bilhões. O resultado reflete o aumento da despesa financeira líquida, o reconhecimento de despesa tributária de IOF, bem como a maior despesa com imposto de renda e contribuição social devido ao provisionamento desses tributos sobre lucros auferidos no exterior. Com a desvalorização do real, o endividamento total da empresa, no final de julho, foi de 415 bilhões de reais, o maior já registrado pela companhia. A dívida bruta sobre o patrimônio em junho, estimada em 134,3%, também é o maior valor já registrado pela empresa desde 1986. Na mesma linha, a dívida líquida sobre o patrimônio também atingiu recorde em junho (104,7%).

A crise na empresa petroleira atinge toda a cadeia produtiva. Depois da paralisação do Estaleiro Mauá, em Niterói, mais dois estaleiros, Ecovix e Enseada, mandaram cartas a seus fornecedores de máquinas e equipamentos suspendendo as compras; Ecovix é o braço de construção naval da Engevix, que possui um contrato de US$ 2,7 bilhões para a construção das sondas Cassino, Curumim e Salinas; o Enseada paralisou a produção da sonda Ondina, parte de um contrato de seis sondas no valor de US$ 4,8 bilhões; em fevereiro, o Atlântico Sul já havia rompido de forma unilateral a construção de sete sondas.

Mas os problemas não param por ai. Segundo matéria da Folha de São Paulo, o conselho fiscal da Petros (fundo de pensão da Petrobras) vai recomendar a reprovação das contas de 2014 da fundação, que teve deficit de R$ 6,2 bilhões em seu principal plano de aposentadoria. O Petros BD (Plano Petros do Sistema Petrobras) tem 23 mil contribuintes e 55 mil aposentados já tinha apresentado um déficit de R$ 2,8 bilhões em 2013. Em relatório divulgado a participantes do plano, dois conselheiros eleitos por trabalhadores avaliam que o plano deve ter deficit também neste ano. Serão, portanto, três anos consecutivos com as contas no vermelho.

Ainda segundo a FSP, uma parte do deficit do fundo é explicada pela crise econômica e do mercado financeiro, o que afetou o desempenho de aplicações do fundo em ações e títulos. Mas a má administração foi responsável por uma grande parcela dos resultados ruins. Do deficit do ano passado, R$ 3,5 bilhões têm origem, segundo os conselheiros, em uma dívida da Petrobras com o fundo. De acordo com eles, os administradores da Petros indicados pela estatal evitam cobrá-la para não pressionar mais o caixa da empresa. A Polícia Federal abriu neste ano investigação, pela Operação Lava Jato, para apurar irregularidades no fundo de pensão da Petrobras.

A situação não é boa. A aliança entre o sindicalismo corporativista e a corrupção estatal só leva à ineficiência e à perda de competitividade. A Petrobras está substituindo fornecedores locais denunciados pela Operação Lava Jato por empresas estrangeiras, principalmente chinesas, na construção de plataformas para o pré-sal. O objetivo da troca de fornecedores é evitar mais atrasos na entrega de um pacote de dez plataformas, que serão instaladas em campos estratégicos do pré-sal, como Lula, Búzios e Tupi. Para representantes da indústria naval, a ida dos projetos para a China vai agravar a crise do setor, que já demitiu 14 mil pessoas neste ano no Rio de Janeiro. Os chineses estão conquistando os contratos por sua agressividade nos preços e porque são os grandes financiadores da Petrobras. Parece não haver dúvidas: o petróleo do pré-sal é cada vez mais chinês.

Mas o mito do Eldorado brasileiro continua. Recentemente, foi divulgado mais um destes estudos que tem como objetivo alimentar o mito do “bilhete premiado”. Relatório de um grupo de pesquisa da UERJ diz que o polígono que cobre a maior parte das bacias marítimas sedimentares de Campos e Santos contém ao menos 176 bilhões de barris de recursos não descobertos e recuperáveis de petróleo e gás natural (barris de óleo equivalente). Quatro vezes mais do que os 30 bilhões a 40 bilhões de barris que já foram descobertos na área. Pode até ser verdade, mas a questão é o custo de extração. Estudos sérios não podem deixar de mostrar todos os custos envolvidos nesta exploração (os econômicos e os ambientais) e não podem deixar de considerar que o preço do barril de petróleo está em torno de US$ 40,00 a US$ 50,00, o que inviabiliza os projetos mais custosos.

O fato é que todo o setor de petróleo está em crise no Brasil e o sonho do pré-sal como passaporte para o futuro do Brasil e para a redenção nacional está indo por água abaixo. Os erros cometidos foram colossais. Sem os trilhões de dólares advindos das profundezas abissais, a economia brasileira não tem como sair do atoleiro. Aliás, a crise do petróleo, por diversos outros motivos, é mundial. Mas no caso brasileiro a crise é, em grande parte, autoinfligida. Para o bem do Brasil, seria fundamental se procurar sanar os problemas da Petrobras para que a empresa pudesse investir mais na área de energia renovável.

 

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Para o desespero geral, a nota da Petrobras foi rebaixada em dois níveis, de “BBB-” para “BB”, com perspectiva negativa pela Standard & Poor’s (S&P). A estatal está agora na categoria especulativa, assim como várias outras empresas e o Brasil. Reportagem do jornal Folha de São Paulo (12/09/2015) mostra que “o valor de mercado da Petrobras —dado pelo valor total de suas ações— encolheu em US$ 200 bilhões desde o início do governo Dilma Rousseff, levando a empresa a despencar sete posições no ranking das maiores petroleiras das Américas. Em 31 de dezembro de 2010, um dia antes da posse de Dilma, a empresa valia US$ 228,211 bilhões. Ao final do pregão do dia 11/09/2015, US$ 28,032 bilhões – uma queda de quase 90%. As ações da estatal atingiram nesta sexta (11) valor equivalente ao verificado em novembro de 2004. No dia seguinte ao rebaixamento pela Standard & Poors, os papeis preferenciais, mais negociados e sem direito a voto, fecharam o pregão a R$ 7,66, queda de 3,89%. Já os ordinários caíram 5,37%, para R$ 8,81. O mau desempenho reflete incertezas do mercado com relação ao futuro da companhia”. As ações da torre da Petrobras caíram de valor cerca de 4 vezes só no governo Dilma e atingiram o fundo do poço no nosso 11 de setembro.

Segundo o jornal O Globo, a atual administração da Petrobras, em parceria com seu conselho, apresentou uma proposta de redução da jornada de trabalho de 40 horas semanais para 30 horas como parte do acordo coletivo com os sindicatos. Mas a empresa enfrenta forte oposição de seus funcionários contra esta proposta e o programa de corte de US$ 12 bilhões em custos operacionais até 2019. Os 19 sindicatos de petroleiros de todo o país são frontalmente contra a proposta da estatal de reduzir a jornada de trabalho e os salários, assim como corte do valor pago nas horas extras. A Federação Nacional dos Petroleiros (FNC), que reúne outros cinco sindicatos de petroleiros, também é contra as propostas da estatal. Os petroleiros são contra a venda de US$ 57 bilhões em ativos, porque segundo eles, a operação vai reduzir o valor da companhia e compromete o apoio ao fundo Petros.

Para entender a crise da Petrobras e um pouco mais sobre as vantagens e desvantagens dos combustíveis fósseis e os problemas ambientais e econômicos decorrentes deste tipo de energia, vejam o artigo abaixo publicado na Revista Trincheiras (revista de cidadania ativa), do Ibase, onde há um recorrido da grave situação provocada pelo mito do pré-sal. Na revista, há também outros artigos mostrando que a expansão da mineração tem agravado a situação de diversas comunidades, grupos e territórios que sofrem os impactos negativos da atividade extrativa mineral

Referência:
ALVES, JED. O mito do pré-sal como redenção nacional. Ibase, Rio de Janeiro, Revista Trincheiras, agosto 2015 http://ibase.br/pt/wp-content/uploads/2015/08/2PRINT-TRINCHEIRAS2.pdf

 

José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br

 

in EcoDebate, 16/09/2015

[cite]


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