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Artigo

Paixão e morte de Amarildo – O DNA do Brasil sanguinário, artigo de Roberto Malvezzi (Gogó)

 

opinião

 

[EcoDebate] A descrição do assassinado do pedreiro Amarildo, feita por representantes do Ministério Público no Jornal Nacional (22/06/2014) com tantos detalhes, me levou à comparação inevitável com Jesus na cruz pelas mãos das autoridades judaicas. Como não vi nenhuma reação a tanta perversidade, decidi reescrever sobre o assunto.

O fato de ser aprisionado, levado à UPP, sofrer torturas com sacos plásticos na cabeça, afogamentos e outras coisas que nem a representante do MP teve coragem de publicar, mostra um cenário de perversidades cabal por parte dos policiais.

Depois do crime, a ocultação do cadáver, com participação do BOPE, aquele mesmo de heróis como o Capitão Nascimento, consuma a cena.

Qual é mesmo o crime cometido por esse pedreiro? Dizem que ele ou a família ocultava alguma droga em sua pobre casa na favela e que não queria entregar o esquema, ou qualquer coisa assim, pouco importa. Por isso ele foi preso, torturado e morto.

Até hoje não sabemos exatamente de quem era o helicóptero preso com 450 kg de cocaína em Minas Gerais, muito menos quem era o dono da droga. Certamente, não era de alguém parecido com Amarildo, o pobre, o negro, o favelado.

Esse dias prenderam outro avião no Ceará, com 350 kg de cocaína. Até não sabemos de quem era o avião e muito menos de quem era a droga.

O Brasil não tem apenas um problema de segurança pública, mas o DNA de uma sociedade violenta, para parafrasear Barack Obama, quando dizia que os americanos do norte carregam o escravagismo em seu DNA. Não são apenas eles.

O Brasil é o país mais violento do mundo – mais do que aqueles que estão em guerra – com 50 mil assassinatos por ano. A grande maioria cometido por policiais. A grande maioria das vítimas tem a cara do Amarildo.

No campo ainda se mata trabalhadores rurais e indígenas como nos tempos dos bandeirantes. Basta conferir os relatórios da Pastoral da Terra e do CIMI.

A bancada da bala, junto com a da Bíblia e do boi, quer tornar – ou já tornou? – assassinato de policial um crime hediondo. Por que os crimes cometidos por policiais, como esse do Amarildo, também não são hediondos?

A sociedade brasileira é violenta e sanguinária. Porém, nos acostumamos a ela, como nos acostumamos ao fedor do Tietê e do Pinheiros, à destruição de nossas florestas e rios, à uma sociedade cujos 50% dos lares nem tem acesso à rede de esgoto.

Mas, não nos preocupemos. Vamos reduzir a maioridade penal e todos os problemas de violência da sociedade brasileira serão resolvidos. Pelo menos é o que acha a bancada BBB e 87% da população brasileira segundo o Data Folha.

Roberto Malvezzi (Gogó), Articulista do Portal EcoDebate, possui formação em Filosofia, Teologia e Estudos Sociais. Atua na Equipe CPP/CPT do São Francisco.

 

Publicado no Portal EcoDebate, 26/06/2015

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4 thoughts on “Paixão e morte de Amarildo – O DNA do Brasil sanguinário, artigo de Roberto Malvezzi (Gogó)

  • Bruno Versiani

    Excelente artigo. Parabéns. O mais triste é constatar que grande parte dessa população que sofre essas mazelas do Brasil “casa grande e senzala” apoia medidas repressivas e conservadoras. E, ao que consta, nosso congresso piora a cada nova legislatura.

  • Bruno Versiani

    Quando penso nos horrores dos porões de tortura na ditadura e quando penso no assassinato de 50 mil por anos no Brasil (algo que se aproxima de um genocídio) me questiono a alcunha “pacífico” em relação ao povo brasileiro… Talvez o temo não seja “pacífico”, mas acomodado, inerte, desinformado, com uma imensa inércia em não questionar e não mudar o status quo.

  • Bom texto, Roberto.

    “O Brasil é o país mais violento do mundo – mais do que aqueles que estão em guerra – com 50 mil assassinatos por ano. A grande maioria cometido por policiais. A grande maioria das vítimas tem a cara do Amarildo.”

    A polícia no Brasil então mata mais de 30 mil pessoas por ano? Achei esse número muito alto, qual foi a fonte utilizada?

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