Cuidar da Amazônia e de quem cuida dela
As mudanças climáticas não são mais projeções para o futuro. Tornaram-se uma realidade nacional e mundial. Seus efeitos são visíveis em várias partes do mundo, especialmente em eventos extremos como enchentes, furacões e secas, e colocam em risco não só um dos mais importantes biomas do mundo, a floresta Amazônica, como também milhares de pessoas.
A Amazônia desempenha um papel importante no ciclo de carbono planetário, e pode ser considerada uma região de grande risco do ponto de vista das influências das mudanças climáticas. Em um cenário sem mitigação, nas próximas décadas (2050) a maior parte da Amazônia deve se tornar mais seca. Em algumas regiões projeta-se uma tendência de redução em até 13% da precipitação anual. Suas consequências podem gerar graves impactos para a economia e o desenvolvimento de qualquer país além de afetar drasticamente a vida das populações mais desassistidas. Os problemas na região se agravam cada vez mais, desde o aumento dos incêndios florestais à redução de caça e pesca, fatos estes já sentidos em muitos territórios pelos povos indígenas.
A contribuição e vulnerabilidade dos povos indígenas
Só na região amazônica, há uma população indígena de 450 mil pessoas (distribuídas entre 173 diferentes etnias) ocupando uma área de 110 milhões de ha (> 400 territórios). É, portanto, fonte de uma vasta gama de serviços ambientais, além de representar um imenso “armazém” de carbono florestal (55 bilhões de toneladas) que, se perturbado, poderá agravar sensivelmente as mudanças globais do clima. Para o período de 1999-2008, por exemplo, as taxas de derrubada de florestas no interior dessas Terras Indígenas (TIs) foram inferiores a 2%, um valor bastante reduzido se comparado àquele encontrado nas regiões ao redor destas TIs (de 25 a 30%), e menor do que o encontrado para Unidades de Conservação de Proteção Integral. Em outros biomas o cenário é semelhante. Na Caatinga, único bioma exclusivamente brasileiro, o desmatamento registrado nas Terras Indígenas corresponde a menos de 1% do total desmatado no bioma (2002-2008). Já no bioma Cerrado, que já perdeu 47% de sua cobertura original, o deflorestamento registrado nas TIs correspondente a menos de 4% da superfície do bioma destinada aos povos indígenas – até 2010.
Apesar dos povos indígenas serem aqueles que mais contribuem para o equilíbrio do regime climático (chuvas) da região amazônica e além dela, são também aqueles que estão mais vulneráveis às mudanças climáticas. Em algumas regiões, já se observam mudanças de temperatura e nos períodos de chuva, o que progressivamente mudará a disponibilidade de alimentos (caça, pesca e cultivo), colocando em risco a segurança alimentar e saúde de muitos povos indígenas.
Importância comprovada cientificamente
Em 2014 foi apontado no quinto relatório (AR5) do Painel Intergovernamental sobre Mudanças do Clima (IPCC), corpo científico internacional que avalia o risco das mudanças climáticas causado pelas atividades humanas, a importância dos conhecimentos tradicionais dos povos indígenas e comunidades locais para a construção de ações de adaptação às alterações do clima. Especificamente para a América Central e América do Sul, os pesquisadores do IPCC reconhecem que o fortalecimento dos povos indígenas, ressaltando seus sistemas e práticas tradicionais, são elementos chave na perspectiva da adaptação futura. Esse reconhecimento se dá, principalmente, devido a visão holística desses povos sobre o meio em que vivem, o que representa um recurso importante para adaptação às alterações climáticas.
Ecoar a palavra
Aparentemente os estudos científicos não são suficientes para comprovar a importância das TIs contra as mudanças climáticas. Torna-se necessária a participação das lideranças indígenas em cenários internacionais para expor tanto a relevância da sobrevivência indígena no planeta como o quanto seus modos de vida e territórios são importantes para um clima mais equilibrado.
Em 2014 a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) esteve presente com doze representantes indígenas de diferentes partes do Brasil – maior delegação indígena, na Conferência das Partes da UNFCCC (COP20), em Lima. A presença de representantes dos povos indígenas, com suas indumentárias, se destacava em meio a ternos e gravatas. Mas não só a presença física chamava atenção. As pautas apresentadas rondavam sobre a questão dos seus direitos, principalmente os direitos territoriais, que são apontados como a base para a manutenção da vida desses povos e para evitar o agravamento das mudanças climáticas. Neste momento em que, no Brasil, os povos indígenas correm risco de perder os direitos duramente conquistados, a força da mobilização indígena é crucial.
Sonia Guajajara, coordenadora executiva da APIB, enfatiza neste vídeo que debater sobre o clima é discutir sobre a vida. Para ela, no modo de vida indígena encontram-se muitas soluções para o aquecimento global, razão pela qual o respeito aos direitos dos povos indígenas são tão importantes para a sociedade como um todo.
Assista o vídeo e dê ouvidos para quem cuida e precisa das florestas para sobreviver e para garantir a nossa própria sobrevivência.
Nota do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), publicada no Portal EcoDebate, 13/04/2015
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A cultura de sobrevivência indígena possui alguns milhares de anos. Essa experiência jamais será substituída por qualquer orientação recente com base em tecnologias e conhecimentos científicos. Lamentável o fato de que os légítimos brasileiros (chamados de índios) tenham que lutar por um direito que sempre foi seu: usar a floresta em pé! Os invasores europeus não se preocuparam com o fato de estarem diante de um dos maiores centros de dados ecológicos tropicais do planeta. Arrogância e ignorância exótica apenas ajudaram a exterminar grande parte desse patrimônio natural riquíssimo e inexplicavelmente desconsiderado. Sabemos que os homens da pré-história eram excepcionais ecologistas, assim como todas as tribos que aprenderam e repassaram seus conhecimentos de sobevivência florestal, mesmo em tempos de condições extremas. Como é possível – em pleno século XXI – desconhecer essa realidade tão óbvia? É fácil explicar: existe um plano econômico de exterminar com as florestas e substituí-las por monoculturas e gado, porque isso rende lucros fantásticos a curto prazo, elevando o famigerado PIB. Nossos indicadores atuais não sabem reconhecer serviços ecossistêmicos como ganhos econômicos. A saúde dos ecossistemas interessa a todos, até mesmo para os exploradores insanos. Infelizmente a maioria do povo brasileiro ainda fala que Cabral “descobriu” o Brasil como se fosse um grande feito histórico. Não sabem o que seja um país megadiverso ou um “hotspot”, tal a ignorância reinante. Acham que existem leões na Amazônia e que o cavalo, o boi, a cão, o gato, a galinha, entre outros, são também animais brasileiros! São esses brasileiros ignorantes ecologicamente falando que vão decidir o futuro do nosso patrimônio natural nativo, orientados por um sistema capitalista linear e simplificador, insensível ao natural, tangido por cifras das bolsas de valores, devastando complexos de vida que só reconhecem modelos integrados e complexos. Num clima que anuncia desastres ambientais letais para o século XXI, estamos desprestigiando até mesmo os últimos remanescentes que sobraram de uma história incrível de viver sob as mais exisgentes situações de crise. É esse conhecimento milenar que estamos exterminando, como sempre fizemos desde o século XVI. Basta comparar o número de indígenas existentes no Brasil naquela época, e atualmente. E o que aconteceu com os invasores e seus descendentes? Se multiplicaram aos milhões! Numa terra estranha e muito diferente daquela dos seus ancestrais do Norte. Por não reconhecer valores da nossa própria espécie – só porque eles eram diferentes daqueles cultuados e praticados em terras distantes – estamos agora cavando nossa cova futura, simplesmente porque o modelo de exploração europeu – quem sabe até bom para eles – não serve para países tropicais. Esse equívoco econômico-ecológico vai trazer sérias repercussões em futuro não muito distante, possivelmente antes do término desse século. Ou será que ainda resta alguma sensatez entre nós, invasores oportunistas, para reconhecer nosso erro crasso e salvar as gerações que ainda não nasceram, incluindo as dos indígenas?