Justiça Federal determina imediata recuperação ambiental no Parque da Canastra
Devastação provocada pela derrubada de árvores nativas afeta recursos hídricos da região onde existem mananciais de afluentes de grandes rios brasileiros, inclusive a nascente do São Francisco
O Ministério Público Federal em Minas Gerais (MPF/MG) obteve junto ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) decisão que obriga os proprietários e o arrendatário da Fazenda Bateia ou Rancho do Vale, situada na zona rural do município de Delfinópolis (MG), a executarem medidas de recuperação e proteção ambiental. Entre as medidas, está a recuperação das áreas de preservação permanente que foram devastadas pelo corte de árvores nativas para o plantio de pasto.
O TRF-1 determinou a recuperação das áreas degradadas com o replantio das mudas de espécimes nativas, conforme indicado no Plano de Recuperação da Área Degradada (PRAD) e nos laudos/relatórios ambientais, com a devida manutenção das mudas até atingirem a altura adequada, sem prejuízo de outras medidas equivalentes apontadas pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
Os réus deverão também promover o isolamento das áreas por meio de cercas, de modo a evitar que o gado pisoteie e mate as mudas, adotando ainda medidas preventivas de incêndio, em especial a construção de aceiros.
A execução das medidas deve começar no prazo de 30 dias, sob pena do pagamento de multa de mil reais por dia de atraso.
A Fazenda Bateia, também chamada Rancho do Vale, está situada nos limites do Parque Nacional Serra da Canastra, uma unidade de conservação federal dotada de proteção integral. Isso significa que todas as atividades realizadas nos imóveis existentes em seu interior e imediações estão sujeitas a determinadas limitações, devendo, antes de sua execução, serem previamente submetidas ao ICMBio para análise e aprovação.
O que ocorre, no entanto, é que, a despeito da legislação restritiva, o parque vem sofrendo com a degradação decorrente de intervenções ilícitas. O caso da Fazenda Bateia (Rancho do Vale) é semelhante a inúmeros outros, nos quais se constata a retirada da vegetação nativa e o corte de espécimes arbóreos e arbustivos, dentro e fora da área de preservação permanente, e de incêndios provocados por ação humana.
A prática de queimada é comum na região: ela visa à renovação da pastagem, com rebrota do capim nativo. Segundo informações do ICMBio, o Parque Nacional tem permitido a queima controlada, com construção de aceiros, desde que o proprietário assine um Termo de Compromisso, com o fim de evitar e controlar incêndios.
A retirada da vegetação nativa, por sua vez, vem causando danos permanentes ao ecossistema. Isso porque no Parque Nacional da Serra da Canastra existem importantíssimos mananciais de afluentes de grandes rios brasileiros, inclusive a nascente do rio São Francisco, notoriamente castigado com a estiagem que assola a Região Sudeste do país.
As zonas ripárias (como é o caso da vegetação ciliar de curso dágua), assim como as conhecidas áreas de recarga hídrica (topos de morro), são pontos fundamentais numa bacia hidrográfica, cuja preservação é indispensável para a garantia da boa qualidade da água e para impedir a exaustão dos recursos hídricos. A supressão da vegetação ripária acelera o processo erosivo nas margens e intensifica o carreamento de sedimentos no curso dágua, causando assoreamento e turbidez das águas superficiais, além de alterar o microclima, que acaba também interferindo no regime e volume das chuvas.
O próprio ribeirão Bateia, que dá nome à fazenda dos réus, vem sendo profundamente assoreado em razão de intervenções. Os desbarrancamentos de suas margens, decorrentes da supressão de vegetação nativa, geram carreamento e deposição de material sólido em seu leito, reduzindo o volume das águas.
Cautela – Foram justamente esses graves danos ambientais e suas consequências para a sociedade que motivaram o desembargador federal do TRF-1 a acatar o recurso do MPF, reformando parcialmente a decisão de primeira instância, para determinar a recuperação imediata das áreas degradadas pela atividade agropecuária exercida na Fazenda Bateia (Rancho do Vale).
Segundo ele, “mão cabe invocar-se, aqui, categorias jurídicas de direito privado, para impor a tutela egoística da propriedade privada, a descurar-se de sua determinante função social e da supremacia do interesse público, na espécie, em total agressão ao meio ambiente, que há de ser preservado, a qualquer custo, de forma ecologicamente equilibrada, para as presentes e futuras gerações (…)”.
A decisão da Justiça Federal em Passos, reconhecendo que a área do Parque é de 200 mil hectares, concedera a liminar determinando apenas que os réus se abstivessem de praticar atividades degradatórias, mas, para o Ministério Público Federal, “os danos são praticados há mais de nove anos, com significativos impactos aos recursos hídricos, à flora e à fauna da unidade. De nada adiantará a imposição de uma obrigação de não fazer se não houver a revegetação ripária e o cercamento de nascentes, uma vez que o gado existente na propriedade acabará pisoteando os olhos dágua”.
O argumento foi acatado pelo TRF-1, que considerou que “ações agressoras do meio ambiente, como a noticiado nos autos de origem, devem ser rechaçadas e inibidas”, mas não afastam as medidas de cautela necessárias para evitar-se o agravamento desse dano ambiental e inibir outras práticas agressoras.
Histórico do caso – Os primeiros danos causados pelas atividades exercidas na Fazenda Bateia foram constatados em novembro de 2005 pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Renováveis (Ibama), que relatou a derrubada de árvores nativas, com uso de motosserra, e o plantio, em seu lugar, de capim do tipo Brachiara.
Os fatos deram origem a uma ação criminal movida pelo Ministério Público Federal, com posterior assinatura de Termo de Ajustamento de Conduta, por meio do qual o arrendatário da propriedade, Humberto Gontijo de Oliveira, reconheceu sua responsabilidade pelos danos e se comprometeu a executar as medidas propostas pelo Ibama: cercamento de todas as APPs atingidas, para se evitar o pisoteamento pelo gado e agravamento da degradação, assim como a retirada do capim e plantio e manutenção de 834 mudas de espécies arbóreas nativas típicas da região.
Em 2011, no entanto, o ICMBio, que sucedeu o Ibama na fiscalização e proteção das unidades de conservação federais, em vistoria na Fazenda Bateia (Rancho do Vale), constatou que as obrigações impostas pelo acordo extrajudicial não haviam sido cumpridas. Isso porque, apesar de o arrendatário ter concluído o plantio das mudas das árvores em 2009, elas acabaram morrendo sufocadas pelo capim Brachiara, que não foi removido.
Além disso, as áreas de APP em recuperação deveriam ter sido isoladas com cerca de arame com quatro fios, para impedir a entrada de animais, mas a falta de manutenção resultou em cercas em estado precário, facilmente transpostas pelo gado.
O MPF ingressou então com ação de execução contra Humberto Gontijo, por inexecução do TAC, no curso da qual ele pediu sucessivos prazos para efetivar as obrigações, todos eles descumpridos.
Incêndios – No dia 10 de maio de 2011, grande parte da Fazenda Rancho do Vale foi alvo de um incêndio que destruiu 162,74 hectares de vegetação nativa composta, entre outras, por capim-macega, olho-de-pombo, arnica, quaresmeira e lobeira, além da vegetação ripária de cinco nascentes e abrigos de animais da fauna silvestre.
Os vizinhos da Rancho do Vale informaram aos fiscais do ICMBio que o fogo teria começado na fazenda, o que resultou em novo auto de infração, com a imposição de medidas de recuperação ambiental, a construção de aceiros e a instalação de sinalização educativa ao lado da estrada que corta a propriedade, como medida preventiva de outros incêndios.
Novamente as medidas não foram cumpridas pelo arrendatário da fazenda, o que levou o Ministério Público Federal a ingressar com a ação civil pública, arrolando também os proprietários do imóvel, que, segundo a legislação, são corresponsáveis pelos danos causados por atividades realizadas em sua propriedade.
Os proprietários, Otávio Augusto Câmara Clark e Luciana Gontijo de Oliveira Clark, são médicos residentes na cidade de Campinas/SP; o arrendatário, Humberto Gontijo, residente em Passos/MG, além de produtor rural, é também proprietário de uma empresa do ramo da indústria e comércio de artefatos de ferro, alumínio e vidros.
(ACP nº 3785-48.2014.4.01.3804)
Fonte: Procuradoria Regional Eleitoral em Minas Gerais
Publicado no Portal EcoDebate, 14/01/2015
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Infelizmente para esse pessoal da moto serra só cadeia é que poderá dar algum resultado. Mesmo o agreste nordestino demonstrando que a falta de água é devida a parca existência de florestas. O próprio norte mineiro faz parte desse ecossistema e também mostra a importância das árvores no regine regular de chuvas. São Paulo sofrendo o inferno com a especulação imobiliária desenfreada que também vai desmatando tudo. Nada disso serve de exemplos para a ganância individualista dessa espécie de gente. O velho Chico não morreu ainda porque recebe afluentes ao longo de seus 2 mil e 500 km, aproximadamente, e após percorrer 5 estados desaguar em Alagoas. Dias desses sua nascente na serra da Canastra havia secado. Assim, minha gente, as alternativas mais viáveis são, no momento, a conscientização da população acerca da necessidade da recuperação das áreas degradas e educação das gerações futuras.