O Brasil desidratado, artigo de Lucio Carvalho
[EcoDebate] Eu não sei os demais, mas eu penso que a crise de água em SP é em tudo reveladora do Brasil, esse país ao mesmo tempo abundante e desidratado. Não exatamente por revelar o destrato com os recursos naturais, desmatamento desenfreado e todos esses fatos ambientais, mas por mostrar que o Brasil é um país de empatia seletiva.
Por quantos anos o sertão e até mesmo o sul do Brasil (minha cidade natal, Bagé, quase fronteira com o Uruguai, penou por uma estiagem de quase uma década que obrigou ao racionamento permanente) tiveram gravíssimos problemas de abastecimento, alguém lembra? É claro que as dimensões do drama paulista são imensas dadas as dimensões de São Paulo, mas essa crise ataca mesmo é aquela velha ideia de “coração do Brasil”.
Vê-se, agora, que é um coração bem dos recauchutados e muito, mas muito mais dependente dos outros órgãos do corpo do que imaginava ser. Aos sertanejos e nordestinos de um modo geral parece que seu destino humano seria o de viver com a escassez de água e com a aridez, mas isso já tinha deixado de ser preocupante há muito tempo, naturalizando-se a ideia de que isso era inevitável (como se o desmatamento massivo para o cultivo da cana em épocas passadas não estivesse por trás disso também) ou um desígnio divino.
Mentiras convenientes, como muitas que querem impingir ao povo brasileiro. Como as mais atuais, que informam que o único desenvolvimento econômico possível para o país consistiria em abusar sistemática e irresponsavelmente de modelos extrativistas, centrados na monocultura e numa balança comercial dependente da exportação de commodities.
De posso do novo e dilacerador Código Florestal e de políticos que não relacionam lucro ambiental e conservação, logo logo vai faltar água para o corpo todo..
Para um país que se imaginava dono do maior rio do mundo, do maior aquífero do planeta e outros delírios de grandeza, um pouquinho de humildade e reconhecimento não há de fazer mal algum. Talvez até ajude a resolver e prevenir muitos outros problemas com esse líquido tão pouco valorizado, dada a nova mania nacional de enxergar solução para tudo no pré-sal.
Que eu saiba, mesmo que um dia o retirem de lá, o que por si só é duvidoso, ainda não existe no mundo tecnologia disponível que transforme o líquido preto nesse outro, que finalmente passa a adquirir o devido valor.
Lucio Carvalho é Coordenador-Geral da Inclusive – Inclusão e Cidadania (www.inclusive.org.br) e autor de Morphopolis (http://www.morphopolis.wordpress.com).
Publicado no Portal EcoDebate, 14/11/2014
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“Amazônia tem “oceano subterrâneo”
A Amazônia possui uma reserva de água subterrânea com volume estimado em mais de 160 trilhões de metros cúbicos, estimou Francisco de Assis Matos de Abreu, professor da Universidade Federal do Pará (UFPA), durante a 66ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), que terminou no dia 27 de julho, no campus da Universidade Federal do Acre (UFAC), em Rio Branco.”.
(http://agencia.fapesp.br/amazonia_tem_oceano_subterraneo/19541/)
Joma, e em que a existência de um aquífero cujas águas são predominantemente salobras influi em qualquer coisa do exposto no texto?
Águas subterrâneas são muito bacanas, mas a existência delas não vai resolver nossos problemas. No máximo elas podem adiá-los. Mas dada a contaminação de nossos aquíferos (esse da Amazônia já tem problemas com mercúrio e com radiotividade, e um aquífero contaminado é algo muito mais complicado que um rio contaminado), nem com isso eu contaria.
O Brasil desidratado e esquartejado, mas não tá nem aí.
Afinal, o Brasil não está só. Esse problema de desidratação está em toda parte do Planeta, mesmo onde há geleiras, pois elas, também, estão a desabar.
Mas o Brasil não tá nem aí, nem ninguém está.
Os desenvolvidos e os que estão em desenvolvimento, estão é lá, na Austrália, participando do G20, buscando meios para mais se desenvolverem. E o meio ambiente? -Bem, isso foge a nossa alçada. Dizem todos, cuja fixação é o desenvolvimento econômico e o crescimento populacional, para sempre.