Arrozais na Colômbia já enfrentam o desafio das mudanças climáticas
Arrozal. Foto: Freepik
Em meio a imensas plantações de arroz, camponeses usam espantalhos para afugentar as aves que vêm comer o grão maduro. O método, artesanal, se mantém na Colômbia, mas não é suficiente para enfrentar um mal muito mais nocivo: as mudanças climáticas. Por Philippe Zygel, da AFP, no Yahoo Notícias.
Nas terras baixas tropicais de Monteria (Córdoba, norte), os produtores de arroz desfrutaram, durante muito tempo, das vantagens da região. Perto da costa caribenha, o sufocante calor úmido lhes garantia duas a três colheitas por ano. Mas agora, os caprichos do clima têm causado estragos.
“Ultimamente, o tempo ficou louco, como dizemos coloquialmente aqui, são as mudanças que estão acontecendo no planeta, é uma realidade e temos que aprender a conviver com isso”, contou à AFP Óscar Pérez, agricultor de 46 anos, 15 deles dedicados ao trabalho no campo.
“Isto sempre nos leva à incerteza, ao medo do que faço, do que semeio e aonde ir”, continua.
Em menos de uma década, a região sofreu mudanças drásticas: a temperatura mínima subiu três graus, a umidade aumentou a 85% e as chuvas se tornaram erráticas, alternando-se inundações e secas. Para os agricultores, o golpe foi duro.
“Em cinco anos, os ganhos com os cultivos de arroz na Colômbia caiu uma tonelada por hectare a partir da variabilidade climática”, disse à AFP Patricia Guzmán, gerente técnico da Fedearroz, la federação nacional que reúne 12.000 produtores.
Corrida contra o relógio
Uma tragédia para um país com 450.000 hectares dedicadas ao cultivo de arroz e onde mais de 200 comunidades dependem deste alimento básico. Uma notícia ruim que vem no pior momento.
Em virtude de um tratado de livre comércio com os Estados Unidos, o arroz americano será importado em um prazo de cinco anos sem impostos para a Colômbia, com um custo de produção quase duas vezes menor. “As mudanças climáticas aceleraram esta corrida contra o relógio”, admitiu Guzmán.
Alertado pelo fenômeno, o Centro Internacional de Agricultura Tropical (CIAT), uma organização colombiana que integra o Grupo para a Pesquisa Agrícola Internacional (CGIAR), participou de um programa de análise de dados em escala sem precedentes.
Previsões do tempo, estudo de solos, exame das variedades de arroz segundo sua sensibilidade à radiação solar: todos estes fatores deram lugar a recomendações concretas, em particular sobre o momento ideal para a semeadura.
“Os agricultores podem ser contrários a mudar o que se faz tradicionalmente, sobretudo quando alguém da cidade vem dizer a eles o que fazer. Mas, com as mudanças climáticas, eles perderam seus pontos de referência e estão um pouco angustiados”, disse AFP Sylvian Delerce, pesquisador francês do CIAT, cujo projeto, chamado “Big Data”, foi premiado pelas Nações Unidas por ocasião da cúpula sobre o clima, celebrada esta semana em Nova York.
Uma colheita por ano
Um simples princípio mudou a vida dos camponeses em Monteria: não fazer mais que uma colheita de arroz e, sobretudo, não plantar durante o primeiro semestre porque o aumento da temperatura, combinado com a monocultura intensiva favoreceu o aparecimento de uma bactéria que dizima os campos.
“Grande parte dos agricultores tem muita dificuldade, foi difícil aceitar esta nova política de uma única colheita”, admitiu à AFP Alfonso Blanco, um agricultor de 55 anos, encarregado de 660 hectares, onde até agora se revezam os cultivos de arroz e o de milho.
Agrônomo da Fedearroz, Cristo Pérez convida os mais resistentes a visitar as plantações de arroz semeados sem levar em conta a melhor data. Os talos manchados e as pontas atrofiadas pelas bactérias são um argumento de peso. “Eu digo a eles: olhem os danos. Vão perder suas colheitas se semearem cedo demais”, explica.
As reuniões de informação, que costumam começar com uma oração em grupo, também servem para transmitir a mensagem no campo, onde estações meteorológicas móveis substituíram os espantalhos.
“Compreendemos rápido a situação”, disse Rosario Ganem, produtora de 55 anos, que considera fantástica a ajuda dos cientistas depois de ter adotado seus conselhos, ao contrário do que diziam seus antepassados.
Publicado no Portal EcoDebate, 30/09/2014
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Ainda bem que havia mais uma alternativa, mas ainda é óbvio que se a plantação de arroz passou de três colheitas por ano para uma colheita por ano, então os camponeses estão com só um terço de sua renda e seus alimentos.
São coisas como essa que me fazem hesitar ao ler textos como o vizinho desta edição, sobre a fome.
Biocombustíveis transformam comida em combustível? Sim. Combustíveis fósseis também. De uma forma ainda pior, como os camponeses de Monteria descobriram, como muito mais gente descobriu e ainda vai descobrir.
Em um mundo ideal não seriam necessários carros e caminhões, mas no nosso mundo, as coisas não funcionam assim. Mesmo nos quatro anos que passei sem carro, de vez em quando eu recebia uma carona, pegava um ônibus quase sempre, por vezes pedia comida entregue em casa.
Em um mundo um pouco mais pragmático, existiriam carros elétricos. Ah é, existem no resto do mundo, só no Brasil que não.
Mas nesse nosso fim de mundo, biocombustíveis ainda são a melhor opção. Se não der para trocar pela bicicleta, que também é movida a comida, mas BEM menos.