A Política Nacional de Resíduos Sólidos – foco na situação de Minas Gerais, por Marcos Paulo Gomes Mol e Danielli Vazzoller Fittipaldi
A Política Nacional de Resíduos Sólidos – foco na situação de Minas Gerais
- Marcos Paulo Gomes Mol, Engenheiro Ambiental,Doutorando em Saneamento pela UFMG.
- Danielli Vazzoller Fittipaldi, Engenheira Ambiental,Mestranda em Sustentabilidade Socioeconômica Ambiental pela UFOP.
[EcoDebate] A Política Nacional de Resíduos Sólidos, sancionada pela lei 12.305 de 2010, tramitou por aproximadamente 20 anos antes de ser oficializada no país. A efetivação da legislação representa, sem sombra de dúvidas, um importante marco na trajetória ambiental de nossa nação. Contudo, é chegado o momento de efetivar as prerrogativas da lei, adequando a realidade de cada município às formas apropriadas de destinação de resíduos.
Segundo a política, a destinação final ambientalmente adequada de resíduos inclui a reutilização, a reciclagem, a compostagem, a recuperação e o aproveitamento energético ou outras destinações que venham a evitar danos ou riscos à saúde pública e a minimizar os impactos ambientais adversos.
Nota-se que o conceito de resíduos passa a ter uma conotação distinta da empregada usualmente. Os resíduos sólidos são entendidos como sendo materiais, substâncias, objetos ou bens descartados resultantes de atividades humanas em sociedade, cuja destinação final se procede, se propõe proceder ou se está obrigado a proceder respeitando o potencial de reaproveitamento, reciclagem, compostagem, ou outra forma de reprocessamento economicamente viável em face da melhor tecnologia disponível.
Por outro lado, os rejeitos passam a ser entendidos como os restos provenientes da atividade humana sem potencial de reciclagem, reaproveitamento ou reprocessamento, depois de esgotadas todas as possibilidades de tratamento e recuperação por processos tecnológicos disponíveis e economicamente viáveis. Para os rejeitos, não há outra possibilidade senão a disposição final ambientalmente adequada, sendo proposto o seu descarte em aterros sanitários. Destaca-se que a Política fixa o prazo final de 02 de agosto de 2014 para a disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos.
A ministra do Meio Ambiente Izabella Teixeira afirmou que ampliar o prazo sem considerar todas as questões é insuficiente, principalmente devido à realidade econômica de cada região brasileira. Porém, a negociação do prazo deve ser acompanhada de discussão técnica e busca por soluções efetivas, que podem ser apresentadas como termos de compromisso e termos de ajustamento de condutas com os municípios.
O contexto do descarte de resíduos urbanos em Minas Gerais pode ser observado acessando os relatórios gerados pela Fundação Estadual de Meio Ambiente – FEAM, através do Panorama da Destinação dos Resíduos Sólidos Urbanos em MG (para acessar o documento completo veja o link nas referências). As informações citadas abaixo são referentes a 2012, e por isso, devem ser atualizadas para uma avaliação mais apropriada do cenário. O objetivo deste texto é incentivar o debate.
Os dados do Panorama indicam que apenas 86 dentre 853 municípios consolidaram os aterros sanitários e possuem potencial para realizar a destinação final apropriada dos rejeitos, conforme disposto na nova Política Nacional. Ou seja, aproximadamente 10% dos municípios mineiros dispunham de uma solução ambiental adequada para destinação dos rejeitos em 2012. Porém, o desafio de consolidar a segregação apropriada de rejeitos e resíduos se mostrou ainda insuperada, uma vez que somente 7 municípios tratam seus resíduos em UTC regularizadas e realizam a disposição final dos rejeitos em aterros sanitários, representando um percentual de 0,8% dos municípios do Estado.
Aqueles 10% de municípios que possuem aterro sanitário em MG ainda descartam resíduos no aterro sanitário, e estão reduzindo o tempo de vida útil do aterro com materiais que possuem potencial para reaproveitamento ou outra destinação que possa conferir algum valor agregado ao material. Cabe destacar que nossa intenção ao trazer à tona informações sobre a realidade dos municípios mineiros é a de proporcionar uma reflexão acerca do desafio de consolidar melhorias no gerenciamento de resíduos em nosso Estado, diante dos prazos e regulamentações técnicas estipulados pela Política Nacional de Resíduos Sólidos. O gráfico 1 apresenta as formas de destinação dos resíduos sólidos urbanos em MG e também foi extraído do Panorama da FEAM.
Gráfico 1 – Número de Municípios por tipologia de destinação final (2012).
Fonte: FEAM (2013).
Outro destaque necessário é relativo às formas de destinação final irregulares. Nota-se que no Estado de Minas Gerais ainda existem Usinas de Triagem e Compostagem – UTC não regularizadas, além da disposição de resíduos em lixões e aterros controlados. Foram contabilizados 146 municípios tratando os RSU em UTC, sendo 24 dessas não regularizadas e 122 regularizadas. Foram constatados 291 municípios com disposição final em aterros controlados, três municípios encaminhando seus resíduos para tratamento e/ou disposição final fora do Estado de Minas Gerais e, finalmente, 267 municípios ainda dispondo em lixões.
Sob o ponto de vista técnico, a disposição de resíduos em aterro controlado possui algumas vantagens em relação à disposição em lixões, porém os líquidos percolados representam potencial de contaminação em ambas as técnicas, uma vez não há impermeabilização de base para contenção do chorume, que é o produto da decomposição dos resíduos e que possui elevado potencial de contaminação dos corpos hídricos.
Já as Usinas de Triagem e Compostagem (UTC) são um conjunto de estruturas físicas edificadas como galpão de recepção e triagem de resíduos sólidos, pátio de compostagem, galpão para armazenamento de recicláveis, unidades de apoio (escritório, almoxarifado, instalações sanitárias/vestiários, copa/cozinha, etc.) e outras unidades, como tratamento de efluentes gerados (FEAM, 2005) – ou seja, uma estrutura anexa a um aterro sanitário. Porém, é importante que exista coleta seletiva, senão ocorre a contaminação dos materiais recicláveis por matéria orgânica, e o trabalho de triagem torna-se típica da catação nos lixões (VIMIEIRO, 2012). Ainda, o material contaminado possui um valor de venda mais baixo. Destaca-se que a PNRS não faz menção à UTC, apenas à compostagem.
Ressalta-se ainda que dos 263 municípios com destinação para sistemas regularizados, apenas 35 são municípios com população urbana maior que 50 mil habitantes. Dos 57 municípios mineiros com população urbana maior que 50 mil habitantes, 22 ainda dispõem os RSU em sistemas não regularizados; destes, 6 municípios em aterros controlados e 16 municípios em lixões (FEAM, 2013).
Diante do cenário exposto, verifica-se que a grande maioria das cidades mineiras não cumpriram o prazo para a disposição final ambientalmente adequada dos seus rejeitos. Assim, esses municípios precisam inserir a temática ambiental entre suas prioridades, e concentrar esforços técnicos e políticos visando a consolidação das soluções para a gestão e o gerenciamento dos resíduos gerados de forma séria e eficaz.
Avanços foram conquistados
Ainda segundo os dados do Panorama elaborado pela FEAM (2013), é possível identificar a evolução da destinação dos RSU em Minas Gerais de 2001 a 2012. Nota-se que houve uma melhoria na gestão dos resíduos no Estado, motivada por regulamentações dos órgãos ambientais e atuação do Ministério Público. “Em 2001, dos 853 municípios mineiros, 823 dispunham seus RSU em lixões. Em 2005 havia 564 municípios fazendo a disposição final em lixões no Estado, e em 2011 esse número caiu para 278, chegando a 267 em 2012, registrando uma redução de 68% no período 2001-2012” (FEAM, 2013).
Um grande desafio aos gestores municipais que atuaram na consolidação dos aterros sanitários está associado com a manutenção de recursos financeiros e técnicos para a operação contínua dos aterros. Isto, pois, trata-se de uma obra que requer significativo valor inicial para consolidação, além de demandar recursos contínuos e equipe técnica qualificada para manter o funcionamento ao longo do tempo. Esses desafios devem ser equacionados pelos municípios, sob o risco de perder as características construtivas e, ao longo do tempo, depreciar o aterro sanitário de forma a passar a operar como um aterro controlado ou mesmo um lixão.
Diante do desafio financeiro e técnico que a operação dos aterros sanitários representam, especialmente aos municípios de pequeno e médio porte, a Política Estadual de Resíduos Sólidos de Minas Gerais, disposta pela lei 18.031 de 2009 e que define a Gestão Integrada dos Resíduos Sólidos Urbanos (GIRSU), prevê o gerenciamento técnico através de um processo de gestão participativa, dentro do conceito de gestão integrada de resíduos sólidos.
“Uma das formas de realizar a GIRSU é por meio dos consórcios públicos, com o objetivo de prestar um serviço de qualidade com a possibilidade de redução de custos e otimização de resultados, envolvendo todos os serviços ou apenas a coleta, o tratamento ou a disposição final. Destaca-se a implantação e operação de aterro sanitário como a solução mais fácil de ser viabilizada por essa via, pois além de atender diretamente aos interesses dos municípios envolvidos, geralmente apresenta maior economia de escala, traz mais vantagens aos parceiros e apresenta resultados mais significativos do ponto de vista da gestão integrada” (IBAM, 2007).
Outra alternativa apresentada pelo Governo de Minas através do Sistema Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos – SISEMA é a divisão de MG em Arranjos Territoriais Ótimos – ATO. Enquanto o consórcio depende do interesse dos municípios envolvidos, a ATO é consolidado a partir de critérios técnicos de condições ambientais, econômicas, sociais, logísticas, etc. Ou seja, trata-se de uma avaliação técnica regional que servirá de base para a indicação de potenciais consórcios a serem estabelecidos.
Em 2013, dados da Associação Mineira de Municípios – AMM indicavam em MG a existência de 7 consórcios com sistemas em operação, 12 formatados com sistema em implantação, 34 em formatação e 3 em mobilização. (FEAM, 2013a)
Referências
BRASIL. Lei nº 12.3051 de 2 de agosto de 2010. Institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos; altera a Lei no9.605, de 12 de fevereiro de 1998; e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/lei/l12305.htm. Acessado em abril de 2014.
FEAM, Fundação Estadual de Meio Ambiente. Panorama da Destinação dos Resíduos Sólidos Urbanos no Estado de Minas Gerais em 2012. FEAM-DGER-GERUB. Belo Horizonte – MG. 2013. Disponível em: http://www.feam.br/images/stories/minas_sem_lixoes/2013/novo/relatrio_de_progresso_2012_classificao%20e%20panorama%20rsu.pdf. Acessado em abril de 2014.
FEAM, Fundação Estadual de Meio Ambiente. As Políticas Nacional e Estadual de Resíduos
Sólidos – Desafios e Oportunidades. In: Congresso da Associação Mineira de Municípios. 2013a. Disponível em: <http://www.portalamm.org.br/files/Congresso/Palestras/ST5/Congresso_AMM_2013_7_maio.pdf>. Acessado em abril de 2014.
FEAM, Fundação Estadual de Meio Ambiente. Orientações técnicas para a operação de usina de triagem e compostagem do lixo. Belo Horizonte: FEAM, 2005. Disponível em: <http://www.feam.br/images/stories/arquivos/Usina2.pdf>. Acessado em agosto de 2014.
IBAM, Instituto Brasileiro de Administração Municipal. Gestão integrada de resíduos sólidos. 2007. http://www.ibam.org.br/media/arquivos/estudos/01-girs_mdl_1.pdf – Acessado em abril de 2014.
VIMIEIRO, G.V. Usinas de Triagem e Compostagem: Valoração de Resíduos e de Pessoas – Um Estudo sobre a Operação e os Funcionários de Unidades de Minas Gerais. 2012. 367f. Tese (Doutorado em Saneamento) – Programa de Pós-Graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos, Escola de Engenharia, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2012.
EcoDebate, 14/08/2014
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