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Perdendo o trem, artigo de João Charlet Pereira Júnior

 

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[EcoDebate] A instabilidade do cenário macroeconômico brasileiro tem sido motivo de recorrentes reflexões no meio acadêmico e empresarial, bem como tem estado constantemente no centro dos debates e dos esforços de previsão por parte dos agentes de mercado.

Ainda engatinhando no quesito política desenvolvimentista, pós redemocratização, o Brasil padece com o encolhimento da economia e vê passar direto para o ralo o potencial de crescimento socioeconômico por não se debruçar seriamente sobre os problemas/necessidades estruturais e multiplicar os remendos conjunturais, como emendas constitucionais inexpressivas, leis complementares limitadas e corporativistas, medidas provisórias de natureza perene, políticas de governo assistencialistas e intervenções improdutivas e setoriais.

Num ambiente de mercado e institucional tão inseguro, não causa grande surpresa a piora dos índices econômicos nacionais ao longo dos últimos 10 anos. Evidência disso é a exposição cada vez maior da dinâmica econômica brasileira frente as variações e crises trazidas pelos ciclos econômicos globais, bem como a elevação vertiginosa dos índices inflacionários (fechando 2013 com um acumulado de 5,91%, a inflação oficial do País, mais uma vez, ultrapassou o centro da meta); nas transações correntes (exportações menos importações, mais os gastos dos brasileiros no exterior), registrou o pior resultado histórico das transações econômicas com o estrangeiro, em paralelo à redução da atividade produtiva e dos investimentos estruturantes.

Relatório do Fundo Monetário Internacional – FMI, divulgado no último dia 21 de janeiro, relata mais uma redução da expectativa de crescimento do Brasil em 2014, 2,5% para 2,3%, diante de uma elevação da projeção de crescimento da economia mundial, de 3,6% para 3,7%. As previsões 2015 seguem as mesmas tendências: redução do PIB brasileiro e aumento do PIB mundial. Segundo o economista-chefe do FMI, Olivier Blanchard, passadas as crises financeiras da última década, a recuperação da economia mundial começa a ganhar força. O principal motivo é que os freios impostos às economias durantes as crises severas estão progressivamente sendo afrouxados, e os EUA dão cada vez mais evidência disso. Se estivesse empenhado na resolução dos problemas estruturais e reformas institucionais prementes, como a tributária e a previdenciária, o Brasil não perderia a passagem do trem.

Medidas políticas imediatistas, atreladas a resultados no curto prazo nunca foram as melhores iniciativas para se alavancar uma nação de democracia incipiente, no despertar da maturidade de suas instituições jurídicas e sociais. Os planejamentos de âmbito plurianual figuram como deslumbrantes instrumentos conceituais, porém, na prática, logo se revelam demagógicos e inoperantes, dada a falha ou nenhuma aplicação daquilo que preceituam como diretrizes, objetivos e metas desenvolvimentistas de longo prazo.

Toda a problemática descrita até aqui vem travando o crescimento sustentado, impedindo o efeito multiplicador sobre a melhoria de indicadores sociais. A ideologia econômica retrógrada resulta no enfraquecimento da produtividade agregada do trabalho, na medida em que vem patrocinando a expansão de um ambiente de mercado em que poucos produzem para que muitos apliquem o resultado da produção essencialmente em consumo, sobrecarregando o fator trabalho e culminando em capacidade instalada ociosa. Esse cenário traz consigo inevitavelmente elevação da inflação de consumo, do endividamento popular, das taxas de juros (2,75 pontos percentuais só em 2013), da dívida pública e perda de competitividade.

Quando se fala em necessidade de políticas governamentais direcionadas para a estruturação econômica e social, deve-se partir, em qualquer hipótese, dos investimentos em educação de qualidade. Estudos recentes realizados pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico – OCDE mostram claramente a relação inversa no Brasil entre a escolaridade da população e o retorno sobre o investimento em educação. Enquanto a primeira variável vem crescendo exponencialmente nos últimos 10 anos, a segunda indica queda vertiginosa desde o ano de 2003, denotando uma formação educacional de baixa qualidade e deficiente em relação às inserção no mercado.

Além da abertura comercial estratégica e inserção em redes de valor globais, os ganhos de competitividade estão diretamente relacionados à produtividade do trabalho e esta depende originalmente da eficiência e eficácia do sistema educacional, bem como de fortalecimento de processos inovadores e empreendedores (consequência direta de investimentos em ciência e tecnologia). As atuais políticas de simples transferência de renda e concessão de crédito barato à população, portanto, deveriam ter um caráter complementar e transitório.

O melhor sinal que o capital produtivo e empreendedor poderia receber para retomar a confiança em investir no mercado brasileiro é a mudança urgente de rota na política econômica vigente, deixando de lado o foco eleitoral e o preconceito ideológico contra a iniciativa privada.

A agenda “produtividade e agregação de valor” foi absolutamente abandonada pelo Governo Federal. Educação crítica e científica; infraestrutura de transporte, armazenagem e comercialização; saneamento urbano; leis trabalhistas racionais e claras; carga tributária menor; são requisitos básicos para que a economia do País possa crescer com elevação de produtividade e, portanto, de forma sustentada, substituindo-se o atual modelo intensivo em comercialização de commodities pela diversificação produtiva. Uma política de retorno à industrialização traz, entre tantos benefícios, o de tornar a economia de um país menos sensível às oscilações do mercado global.

João Charlet Pereira Júnior, Técnico em Gestão Pública – SEDUC/PA, Economista – CRE 3574. Especialista em Economia Agrobioindustrial (UFPA).

 

EcoDebate, 24/03/2014


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