Problemas nas casas para os atingidos levam MPF à Justiça pela vigésima vez contra Belo Monte
Procuradores pedem suspensão da licença da usina para corrigir irregularidades, adequar o projeto ao que tinha sido prometido e obrigar a Norte Energia a ouvir a população
O Ministério Público Federal no Pará (MPF/PA) entrou essa semana com a vigésima ação judicial que trata de irregularidades na hidrelétrica de Belo Monte. O processo trata das irregularidades cometidas pela Norte Energia S.A na construção de casas, onde a empresa pretende reassentar as famílias da área urbana de Altamira que serão atingidas pelo lago da usina. Além da empresa, o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama), responsável pelo licenciamento de Belo Monte, é réu na ação, que pede a suspensão da licença do empreendimento enquanto o problema dos atingidos não for resolvido.
A construção de casas para os moradores de Altamira que serão removidos por causa do alagamento de Belo Monte faz parte das licenças concedidas pelo Ibama à Norte Energia. De acordo com todos os documentos do Ibama que tratam do assunto, o objetivo central do reassentamento é “garantir condições de moradia superiores àquelas de que dispunha a população afetada antes da instalação do empreendimento”. Em vez disso, uma série de irregularidades e mudanças nos projetos feitas sem debate provocaram grande descontentamento nos atingidos.
“A população encontra-se inconformada. O MPF recebe recorrentes visitas e declarações de pessoas que questionam todo o processo de reassentamento e demonstram insegurança e descontentamento com as modificações promovidas unilateralmente pela concessionária”, diz a ação judicial assinada pelos procuradores Bruna Menezes, Thais Santi, Gabriela Azevedo e Ubiratan Cazetta.
Serão removidos todos os que moram em áreas de Altamira abaixo da chamada cota 100 (100 metros acima do nível do mar), um número que pode ser de 16 mil a mais de 25 mil pessoas. Ao apresentar o programa de reassentamento em 2012 a empresa prometeu três opções de casa, com tamanhos variados de acordo com a família. Em 2013 informou sem discussão prévia com os atingidos que só haverá um tamanho de casa, de 63 metros quadrados.
Para o MPF, houve quebra da expectativa da população afetada, porque o compromisso público assumido pela própria empresa não foi cumprido. “Quando receberam oferta de casa de alvenaria, os afetados jamais supuseram que as casas não seriam feitas de tijolos, no modelo tradicional, à medida que na região amazônica e, em especial na região de Altamira, o modelo construtivo empregado no projeto destinado ao reassentamento era totalmente desconhecido”, explica a ação do MPF. As casas estão sendo construídas com placas de concreto.
Além da falta de debate e das mudanças controversas nas casas, uma série de irregularidades nos projetos foram encontradas pelos técnicos do MPF. Foram violadas normas brasileiras tanto para acessibilidade quanto para as instalações elétricas das residências. As casas também estavam em desacordo com o Código de Obras do município de Altamira. Em vez de exigir a solução dos problemas, no entanto, a prefeitura da cidade enviou e a Câmara de Vereadores aprovou na semana passada a alteração do Código para adequá-lo aos projetos da Norte Energia.
“As alterações promovidas não atendem ao interesse público e significam arbitrário retrocesso em matéria de resguardo a direito fundamental, sendo inconstitucionais por afronta à dignidade humana”, diz o MPF. Dentre as contrariedades ao Código de Obras do Município de Altamira, em sua redação original, constam, por exemplo, a irregular espessura da parede interna, a altura do revestimento da cozinha, bem como sua indevida comunicação direta com as instalações sanitárias, e, ainda, as dimensões mínimas de cômodos das casas em construção. As irregularidades foram reconhecidas pela própria Secretaria de Obras de Altamira em ofício ao MPF.
Os procuradores lembram que, “como bem reconhece o Plano Básico Ambiental de Belo Monte, a realização de grandes empreendimentos hidrelétricos no Brasil é marcada por experiências que resultaram em grandes conflitos sociais”. Os problemas já estão se repetindo em Altamira. Questionado pelo MPF sobre as condições e o método de construção das casas, o Ibama se limitou a dizer que elas atendiam ao modelo preconizado pelo Ministério das Cidades em programas habitacionais e afirmou que a fiscalização era responsabilidade da prefeitura.
O MPF pediu à Justiça que intervenha no licenciamento, suspendendo a licença até que as irregularidades sejam sanadas, principalmente porque os moradores de Altamira não estão sendo beneficiários de um programa habitacional do governo, mas sim compulsoriamente desalojados de suas casas, impactados por uma obra de interesse governamental.
A ação será julgada pela Vara Federal de Altamira e tramita com o nº 0002464-06.2013.4.01.3903
Fonte: Ministério Público Federal no Pará
EcoDebate, 28/10/2013
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