Nota Pública da CPT – Conflito entre deputado e comunidade quilombola no Maranhão, uma lição de realidade
Após ofício do deputado estadual César Pires, do DEM do Maranhão, CPT divulga Nota Pública sobre o conflito que envolve o parlamentar e a comunidade quilombola de Santa Maria dos Moreiras, no município de Codó. Moradores do local têm relato e denunciado, há anos, ações contra os quilombolas e seu território. Confira o documento na íntegra:
A Comissão Pastoral da Terra quer de público agradecer ao deputado estadual César Pires, do DEM do Maranhão, líder do governo Roseana Sarney na Assembleia Legislativa, pelos esclarecimentos que faz a toda a sociedade, sobre como agem os poderes constituídos em relação a conflitos agrários.
Estes esclarecimentos estão contidos no Ofício 71/2013, que o deputado encaminhou na data de 23.09.2013 ao desembargador Gercino José da Silva Filho, ouvidor agrário nacional e presidente da Comissão Nacional de Combate à Violência no Campo. O ofício se reporta ao conflito envolvendo, de um lado, a comunidade quilombola de Santa Maria dos Moreiras, em Codó – MA, e de outro, o próprio deputado.
A comunidade quilombola de Santa Maria dos Moreiras integra um dos maiores territórios étnicos do estado do Maranhão. Pesquisas acadêmicas identificam sua existência há mais de 200 anos. Em 24.01.2008, a Fundação Cultural Palmares reconheceu e certificou o território de Bom Jesus onde se encrava Santa Maria dos Moreiras. Desde 1992, os quilombolas travam uma luta dura pela preservação do seu território, contra o deputado que se arvora dono da área.
Neste período foram destruídas roças, houve proibições de acesso às fontes de água, restrição de uso dos caminhos de roça e construção de cercas de arame farpado impedindo o acesso das famílias às matas de babaçu e às roças.
Em 3 de novembro de 2012, três policiais militares, acompanhando dois “encarregados” da fazenda, bloquearam a estrada do quilombo impedindo a passagem das pessoas e disparando tiros de armas de fogo. Antes de irem embora, passaram perto das casas dando tiros para cima.
Em 31 de janeiro de 2013, enquanto os quilombolas realizavam Assembleia da comunidade, um jagunço e um tenente da Polícia Militar incendiaram duas casas.
Por conta destas violências, em 22 de agosto de 2013, foi realizada audiência pública nesta comunidade, reunindo também representantes de outras comunidades com representantes do INCRA e da Ouvidoria Agrária Regional. Os quilombolas relataram as inúmeras violências que têm sofrido, principalmente da parte do deputado estadual Cesar Pires, que tem como forte aliado o prefeito do município de Codó, Zito Rolim, do PV. Este figura, desde 2011, na lista suja do Ministério do Trabalho e Emprego, por exploração de mão de obra em condições análogas às de escravo.
Dias depois da audiência, em 02.09.2013, bois do parlamentar invadiram a roça de Gilberto Bezerra de Araújo, destruindo o que estava plantado.
Segundo se depreende do ofício do deputado, os quilombolas reagiram à destruição da roça e mataram um boi. O fato foi prontamente denunciado e o Sr. Antônio Cesar Pereira dos Santos, presidente da Associação Quilombola de Santa Maria dos Moreiras, foi indiciado pela polícia e “o processo será ou já foi encaminhado à justiça”. Poucos dias depois, a delegacia local iniciou procedimentos para apurar responsabilidades, pela morte de outro boi. “Para minha surpresa já hoje (26/09/2013) (sic) voltaram a matar outro animal, desta vez um burro”, diz o ofício datado de 23/09/2013.
Nele se lê ainda que a Secretaria de Agricultura do município elaborou relatório atestando a inexistência de roças dos quilombolas na área: “as plantações de vazantes são feitas em meu açude sem autorização”.
Realmente este ofício é uma peça pedagógica e ganha consistência maior pela pessoa que o enviou. Mostra com clareza meridiana a diferença de tratamento dado a quem tem poder e dinheiro e aos camponeses e pobres. A morte de animais são denunciadas e apuradas com rapidez incomuns, levando ao indiciamento de supostos culpados. Não se tem notícia de que as agressões sofridas pela comunidade tenham merecido atenção das autoridades. Mostra, também, como interagem diversos poderes.
Neste caso a fábula do lobo e do cordeiro encontra aplicação prática: as ações dos pequenos, no caso os quilombolas, têm como único objetivo provocar a quem se julga detentor de direitos para depois se fazerem passar por vítimas: “as cercas são frágeis feitas com um único propósito de provocar-me e tentar justificar as mortes dos animais.” “A violência no campo do Maranhão”, deixa explícito o deputado: “às vezes chega a ser fantasiada e alardeada numa tentativa de alguém tirar proveito dos fatos.”.
“Matar animais indefesos com armas de grande calibre, e de grande porte. Bandidagem,” registra o ofício. Destruir plantações, impedir o livre trânsito de pessoas, queimar residências, intimidar com armas de fogo, o que será?
Para o deputado, os advogados dos quilombolas, não têm “conhecimento”, “nem talento e criatividade”, por isso apelam para a “provocação”, “para torná-los vítimas, única forma de aparecerem”.
Quem, durante 21 anos, intimidou, ameaçou e agrediu, agora declara: “Sinto-me ameaçado de morte e quero registrar isso a nível nacional”, cômico, não fosse trágico.
Mais uma vez a Comissão Pastoral da Terra, citada pelo deputado, quer agradecer a lição prática sobre como se dão as relações na sociedade brasileira.
Goiânia, 18 de outubro de 2013.
Dom Enemésio Lazzaris
Presidente da Comissão Pastoral da Terra (CPT)
EcoDebate, 22/10/2013
[ O conteúdo do EcoDebate pode ser copiado, reproduzido e/ou distribuído, desde que seja dado crédito ao autor, ao EcoDebate e, se for o caso, à fonte primária da informação ]
Inclusão na lista de distribuição do Boletim Diário do Portal EcoDebate
Caso queira ser incluído(a) na lista de distribuição de nosso boletim diário, basta clicar no LINK e preencher o formulário de inscrição. O seu e-mail será incluído e você receberá uma mensagem solicitando que confirme a inscrição.
O EcoDebate não pratica SPAM e a exigência de confirmação do e-mail de origem visa evitar que seu e-mail seja incluído indevidamente por terceiros.
Remoção da lista de distribuição do Boletim Diário do Portal EcoDebate
Para cancelar a sua inscrição neste grupo, envie um e-mail para ecodebate@ecodebate.com.br. O seu e-mail será removido e você receberá uma mensagem confirmando a remoção. Observe que a remoção é automática mas não é instantânea.
O Congresso Nacional e seus representantes são uma vergonha para o nosso país. Este deputado do DEM é um claro exemplo disso, e pior são as pessoas que se alinham com este tipo de gente. Não me admira ver o PV envolvido com tal personagem, uma vez que este partido só tem preocupação socioambientais na sua sigla, e tão somente. É mais do mesmo…
O Congresso Nacional e seus representantes são uma vergonha para o nosso país. Este deputado do DEM é um claro exemplo disso, e pior são as pessoas que se alinham com este tipo de gente. Não me admira ver o PV envolvido com tal personagem, uma vez que este partido só tem preocupação socioambientais na sua sigla, e tão somente. É mais do mesmo…
Meus comentários estão sendo sistematicamente bloqueados pelo site, porque (será mais um a ser bloqueado?)
Prezado Renato Prado,
Seus comentários NUNCA foram bloqueados, sistematicamente ou não.
TODOS os comentários foram publicados, sem restrições. O EcoDebate NÃO pratica censura ou qualquer restrição ao direito de opinião. NUNCA deixamos de publicar um comentário que estivesse de acordo com nossas regras [ http://www.ecodebate.com.br/regras/ ].
Nosso trabalho [redação, colunistas, articulistas e colaboradores] é voluntário e realizado em meio às nossas atividades profissionais. Por isto, nem sempre conseguimos nos manter online, o que impede o acesso e liberação de comentários em tempo real.
Compreendemos a impaciência dos(as) comentaristas, mas, sinceramente, já fazemos muito mais do que seria esperável diante de nossas dificuldades e limites.
Não é, portanto, uma perseguição ou censura pessoal. É uma limitação de nossa parte.
No mais, acione a tecla F5 de seu teclado para atualizar o cache de seu navegador e verá os comentários devidamente publicados.
Atenciosamente,
Henrique Cortez
coordenador editorial do Portal EcoDebate