Movimentos sociais duvidam que reforma política saia do papel
Brasília, 17/06/2013 – Manifestantes ocupam teto do Congresso Nacional em protesto contra gastos na Copa, corrupção e por melhorias no transporte público, na saúde e na educação
Sob a descrença de movimentos sociais, os deputados que fazem parte do grupo de trabalho da reforma política da Câmara terão o desafio de chegar na próxima semana a um texto que concilie os interesses dentro e fora do Congresso. O Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE) questiona o sucesso da discussão do tema no Congresso. “Há um pessimismo sobre o que este Congresso pode produzir sobre reforma política”, disse o advogado especialista em direito eleitoral do MCCE, Luciano Santos. Para ele, até agora, todas as vezes que deputados e senadores se movimentaram “foi para retroceder, facilitar a vida de quem hoje já detém mandato”.
O advogado lembrou que a mais recente comissão fracassada sobre o tema, que teve como relator do deputado gaúcho Henrique Fontana (PT), trabalhou por mais de dois anos. A proposta foi engavetada antes de ser votada em plenário. “Foi gasto muito dinheiro nisso, a comissão realizou audiências públicas em todo o país”, disse.
Hoje o projeto (PL 5735/13) que serve de base para a discussão do novo grupo que trata do assunto tem vários pontos polêmicos como o que autoriza candidatura de quem teve as contas rejeitadas pela Justiça Eleitoral. Ainda pela proposta, as despesas pessoais do candidato, como deslocamento em automóvel próprio, remuneração de motorista particular, alimentação, hospedagem e chamadas telefônicas de até três linhas registradas no nome do candidato não precisarão ser comprovadas na prestação de contas.
Na avaliação de movimentos que militam nessa causa, a única alternativa viável para uma verdadeira reforma política é a aprovação de um projeto de iniciativa popular. Duas propostas estão em fase de recolhimento de assinaturas. A do MCCE batizada de eleições limpas, sugere em um dos pontos a adoção do sistema eleitoral em dois turnos para o legislativo. “No primeiro turno o eleitor votaria só na plataforma do partido e no segundo turno escolheria que candidato deveria executar o plano”, explicou Luciano Santos.
A outra proposta, elaborada pela Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político, propõe um texto mais amplo que do MCCE: defende que determinados temas como, por exemplo, aumento dos salários dos parlamentares, grandes obras e privatizações, só possam ser decididos pelo povo por meio de plebiscito e referendo. Para que um projeto de iniciativa popular seja apresentado ao Congresso é necessário que ele venha avalizado por 1,5 milhão de assinaturas.
Para que as novas regras tenham validade nas eleições de 2014, o texto teria de ser votado pelo Congresso e sancionado pela presidenta Dilma Rousseff até o dia 3 de outubro. A dois meses do fim desse prazo representantes dos movimentos reconhecem que as chances são pequenas.
Na avaliação da Plataforma dos Movimentos Sociais apesar de chamar de reforma política, o Congresso até hoje só propôs mudanças restritas à questão eleitoral. “O Congresso nunca aceitou, por exemplo, o fortalecimento de mecanismos democráticos de participação popular. Uma proposta de reforma política tem que pensar numa melhor representação dos grupos: mulheres, negros, indígenas e homoafetivos”, ressaltou José Antônio Moroni, membro da Plataforma.
Na tentativa de mostrar transparência e disposição de ouvir a sociedade foi lançada há pouco mais de uma semana, dentro do portal da Câmara dos Deputados, uma comunidade virtual para discutir o tema. A ferramenta já teve mais de 16 mil acessos. O financiamento de campanha e sistema eleitoral são os assuntos que mais despertaram interesse até agora.
Sobre financiamento de campanha, Geraldo César Rodrigues, participante de um dos fóruns, defendeu que ele passe a ser exclusivamente público. “Doações podem sugerir sutilmente tráfico de influência e troca de favores – ou intenções de favorecimento – no meio político”. Para ele, campanhas eleitorais financiadas exclusivamente com recursos públicos inibem essas práticas.
“Penso que não se deva proibir a doação de pessoas físicas. Foi com base nessas doações que Obama se elegeu. O que é preciso é estabelecer limites. Além disso, a doação de pessoas físicas pressupõe a participação efetiva do cidadão que puder contribuir. O financiamento exclusivo não impede a existência de caixa-dois pelos candidatos poderosos”, avaliou outro participante, Claudionor Rocha.
Para a coordenadora da Frente Parlamentar pela Reforma Política com Participação Popular, deputada Luiza Erundina (PSB-SP), o canal virtual que foi aberto para receber sugestões da sociedade não supre a necessidade de novos debates com a sociedade. Ela acredita que a proposta em discussão é um grande retrocesso para o país já que estimula o abuso do poder econômico e flexibiliza a Lei da Ficha Limpa.
Ainda segundo a deputada, os protestos de junho, realizados em várias cidades brasileiras, não explicitaram com força a necessidade de realização de uma reforma política no país. Erundina lembrou ainda que na legislatura passada, a Frente apresentou uma proposta que nem sequer chegou a ser votada na Comissão de Legislação Participativa da Câmara. “Na verdade não há vontade política. O Congresso não vai dar uma resposta a todo esse marco legal que está obsoleto. Lamentavelmente será mais uma frustração que só contribui para desqualificar o poder legislativo”, disse.
Edição: José Romildo
Reportagem de Karine Melo, da Agência Brasil, publicada pelo EcoDebate, 05/08/2013
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