Suplementos alimentares ‘emagrecedores’: Por trás da promessa de milagre, o pesadelo
Pessoas que consumiram produtos vetados no Brasil, como OxyElite Pro, Jack 3D e Lipo-6 Black, atestam as consequências nocivas à saúde que esses compostos provocam, como taquicardia, hipertensão e dependência. Em Recife, um jovem morreu. Matéria de Mariana Labossière e Adriana Bernardes, no Correio Braziliense, socializada pelo ClippingMP.
Um corpo perfeito em doses homeopáticas. Apenas alguns gramas para um dia inteiro de disposição. As promessas impressas nos rótulos de suplementos alimentares, como OxyElite Pro, Jack 3D e Lipo-6 Black, vetados no Brasil pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), jogam para escanteio os riscos devastadores dessas substâncias. Os danos ao metabolismo são apenas um detalhe diante da perda irreparável de um ente querido. Por trás da obsessão por resultados estéticos, o Correio desvenda histórias de pessoas que sentiram na pele os efeitos colaterais do consumo (Leia depoimentos).
A secretária Adriana Martins, 42 anos, comprou o OxyElite na esperança de emagrecer. Foram 15 dias de uso, horas de malhação pesada e cinco quilos a menos. “Eu não ficava cansada. Em um sábado, passei a manhã toda me exercitando. Cheguei na academia às 7h e saí ao meio-dia”, relata. A sensação de atingir o objetivo, entretanto, mascarou os perigos do composto. “Os sinais estavam todos ali. Tinha fortes dores na nuca que se transformavam em dores de cabeça, além de taquicardia. A agitação acabava me deixando nervosa, mas só depois descobri que estava tomando uma verdadeira bomba”, acrescenta.
O sinal vermelho veio com uma alteração repentina da pressão. Adriana resolveu buscar um especialista. Ela descobriu que estava hipertensa. Nos seis meses seguintes, teve de ser acompanhada por um cardiologista e um endocrinologista. “Eu não tinha nenhum histórico, por isso, os médicos disseram que o problema foi desencadeado pelo OxyElite”, explica.
E essa não foi a única consequência. Após interromper o uso do composto, Adriana, que pesava 78 kg antes das cápsulas, viu a balança marcar 12 quilos a mais. “Ele causa esse efeito sanfona, pelo que me explicaram. Na hora da empolgação, você não pensa nisso. Fiquei com muito medo de ter problemas para o resto da vida. Confesso ter me arrependido”, expõe. Embora não tenha perdido o peso extra, depois de um longo tratamento, afirma ter voltado à vida normal.
Diante do susto, a secretária, mãe de três filhos, um deles adepto à suplementação, faz reuniões frequentes com a família. Segundo ela, o intuito é alertá-los sobre os malefícios de alguns produtos. “Eu nunca iria deixar um filho meu passar por algo parecido. Num primeiro momento, parece ser sonho, mas você acorda num pesadelo.”
Para a família Sampaio, a tragédia chegou primeiro que o alerta. “Antes de você ligar, estava olhando as fotos dele”. A voz carregada de saudades, do outro lado da linha, é de uma mãe. Em maio próximo, completam dois anos desde a morte do filho, que aconteceu em maio de 2011. Wilson Sampaio Júnior tinha 18 anos quando foi encontrado sem vida pelos pais dentro do banheiro de casa, em Recife (PE). O casal atribui o episódio ao consumo do Jack 3D, vendido ao rapaz por um instrutor de academia.
Gás
O professor de musculação Vitor Ferreira dos Santos, 29 anos, admite que o consumo dos produtos é arriscado. Ele diz já ter usado tanto o Jack 3D como o OxyElite Pro e o Lipo-6 Black. Todos eles antes do veto do órgão sanitário. Com o primeiro, conseguiu perder 2 quilos de gordura em duas semanas e, com o segundo, chegou ao limite da resistência. “Todos me deram mais gás para malhar, mas eu fazia acompanhamento. Era tudo certinho. Agora, a maioria das pessoas não sabe administrar o produto e acaba abusando na dosagem. Já vi pessoas tomando mais de seis cápsulas por dia. Não tem como não passar mal desse jeito”, pontua. “É perigoso porque todos aumentam o batimento cardíaco. Além disso, pode causar dependência”, completa. Santos afirma ter abandonado o consumo desses suplementos. Hoje, o profissional diz optar por produtos similares, inclusive de marcas nacionais.
A professora de dança Júlia Satiê, 29 anos, foi apresentada ao OxyElite pelo namorado. Para aguentar mais de 12 horas de serviço, começou a tomar o composto por conta própria. “Fiquei antenada, trabalhava sem cansaço. A minha parte sensorial também ficou muito aguçada. Em contrapartida, andava nervosa e ele me causou uma certa dependência psicológica, pois andava com o suplemento na bolsa, para ter segurança”, revelou. O uso frequente, no entanto, foi interrompido depois de uma aluna mencionar a possibilidade de o suplemento causar falência renal. “Fui pesquisar sobre o assunto e descobri que ele estava proibido. Tomei um susto. Fiquei com medo e hoje busco meios mais naturais de melhorar meu desempenho”, garante. Os depoimentos reforçam o perigo dos produtos, mostrado pelo Correio em uma série de reportagens sobre o assunto iniciada há uma semana.
Sonho destruído de um atleta
Wilsinho, como era carinhosamente chamado pela família, sonhava em ser jogador de futebol profissional. Durante 10 anos, batalhou pelo sonho. Chegou a jogar pelo juvenil do Sport Club, em Recife, e estava prestes a ingressar no time juniores do Santa Cruz. O esforço que durou uma década, no entanto, acabou em apenas uma mês de uso de suplementação. “Ficamos cego. Não acreditamos que algo recomendado por um pessoa em uma academia poderia fazer mal. Infelizmente, só percebemos tarde demais”, desabafou a mãe de Wilsinho, a funcionária pública Marcelle Sampaio, 42 anos. Desde a morte do filho, tanto ela quanto o pai do menino, o dentista Wilson Sampaio, 50, lutam em Pernambuco para que outros jovens não passem pela mesma situação.
Para Marcelle, o consumo de suplementos deve ser observado de perto pelos pais. Ela ressalta ainda a importância de um acompanhamento especializado por parte do nutricionista. “À época, ficamos preocupados, pois sabíamos o que meu filho estava fazendo, mas não tínhamos ideia do que poderia acontecer. O rótulo do produto ainda estava em inglês, não conseguíamos ler”, mencionou. “Os pais devem ir nas academias e verificar os profissionais que acompanham os filhos e também o suplemento que eles irão tomar. Às vezes, até o que é vendido na farmácia não está correto”, completou a mãe, que mora em Recife.
Indiciamento
O professor estagiário José Dorgival Cavalcanti Júnior foi indiciado pela Delegacia do Consumidor de Pernambuco por comercializar o Jack 3D. Além responder pela venda, ele poderá cumprir pena por crime contra a saúde pública e pegar até 15 anos de prisão. Por ora, está solto. Para Marcelle, a falta de tecnologia suficiente no Brasil impediu que fosse possível identificar a substância do suplemento alimentar no corpo do filho. Com isso, Cavalcanti acabou não respondendo por homicídio culposo — quando há intenção de matar. A mãe ainda tem esperança de que a comprovação aconteça em laboratório estrangeiro. “Quero provar para o Brasil todo que meu filho morreu por isso.” (ML)
Legislação
Por conta do caso de Wilson, uma lei sancionada em abril de 2012 determina que as academias do estado de Pernambuco exibam avisos sobre o risco do uso de suplementos alimentares sem consulta médica. No Distrito Federal, existe uma lei similar que trata sobre anabolizantes, mas ainda falta ser regulamentada.
Depoimentos
“Lojas continuam oferecendo”
“A procura pelo OxyElite sempre foi grande na loja onde eu trabalho. Com a proibição, no entanto, as lojas continuaram oferecendo o suplemento alimentar, mas de forma camuflada. Com isso, os prejuízos foram incalculáveis, pois era grande a saída desse produto. Até hoje, as pessoas ligam querendo, perguntando se funciona, mas optamos por vender similares, que não têm as substâncias proibidas. Procurávamos indicar o OxyElite para pessoas com boa saúde. Sempre perguntávamos o histórico dela antes, pois claro que não iríamos vender para um hipertenso, mas isso não acontecia em todas as lojas.” Sócio-proprietário de uma loja de suplementos, que preferiu ter a identidade preservada
“Tem efeitos colaterais”
“Consegui perder dois quilos em duas semanas, mas não achei legal. Foi muito rápido e temi os riscos. Além disso, tem todos os efeitos colaterais, o coração acelerado, dá gastrite também. Eu tomava uma cápsula apenas e meu intuito era perder peso, mas também malhava, fazia uma dieta. A gente sabe, entretanto, que nem todas as pessoas fazem isso. De toda forma, o OxyElite, assim como qualquer outra substância em excesso, faz mal.” Paulo Henrique Açunção Leal, 24 anos, professor de educação física
EcoDebate, 21/01/2013
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