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É a realidade que se faz presente ou é a mentira que tem pernas curtas em Belo Monte? artigo de Dion Márcio C. Monteiro

 

Belo Monte: Foto tirada em janeiro/2012, ainda no inicio das obras das ensecadeiras. Foto: João Zinclar
Belo Monte: Foto tirada em janeiro/2012, ainda no inicio das obras das ensecadeiras. Foto: João Zinclar

 

[EcoDebate] Antropólogos, hidrólogos, engenheiros e biólogos, entre outros professores e pesquisadores, que por muito tempo tem avaliado os impactos da UHE Belo Monte, incluindo o Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) e o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) que o Governo Federal encomendou às empreiteiras Camargo Corrêa, Norberto Odebrecht e Andrade Gutierrez, sempre afirmaram que o início das obras no rio Xingu traria consigo grandes problemas aos povos indígenas da região, em especial aos Arara da Volta Grande, Juruna do Paquiçamba e Xicrin do Bacajá.

Os representantes da Norte Energia S.A (NESA) e do Governo Federal sempre negaram que a construção das ensecadeiras e demais estruturas afetaria o modo de vida destes povos, afirmando com todas as letras que não haveria significativos danos às referidas áreas.

Um impacto relativamente pequeno e o não alagamento de terras indígenas tem sido o principal argumento do governo e da empresa, quando justificam a não necessidade de realização das famosas oitivas indígenas, matéria até hoje pendente de julgamento definitivo por parte do Superior Tribunal Federal.

No dia 07 de janeiro/2013, dezenas de índios Juruna fecharam o Travessão do Km 27, estrada que liga a rodovia Transamazônica ao Sítio Pimental, local onde estão sendo realizados os trabalhos de barramento do rio Xingu. Ônibus e máquinas pesadas ficaram presos, e todos os 4 mil operários que lá trabalham paralisaram suas atividades.

Os Juruna decidiram fazer mais esta ocupação devido aos atuais problemas verificados no Xingu, situação resultante, entre outras coisas, do descumprimento de vários acordos realizados entre os povos indígenas, o Governo Federal e a NESA.

Aqui vale lembra que em julho de 2012 foi encerrada uma das maiores ocupações indígenas já realizadas no local. De lá para cá já se passaram seis meses e praticamente nada do que foi acordado foi cumprido pela empresa. Naquele momento ficou definida a criação de um comitê indígena para monitorar a vazão do rio; a criação de um comitê gestor indígena para acompanhar as compensações da obra; a realização de estudos complementares no rio Bacajá, afluente do Xingu; e o plano de proteção das terras indígenas afetadas, entre outras demandas emergenciais.

Com esta nova ocupação os Juruna estão denunciando o que ha muito tempo os especialistas já avaliavam. As águas ficaram turvas e foram contaminadas com rejeitos da obra, prejudicando o uso que os povos indígenas fazem desta. Juruna, Arara e Xicrin, para citar somente alguns grupos da região, utilizam a água do rio Xingu para o banho de adultos e crianças, para lavar a roupa que usam e inclusive para fazer a comida que consomem. A própria pesca também ficou prejudicada, pois os peixes estão muito mais escassos. A navegação é outro item que se encontra bastante comprometido na Volta Grande do Xingu.

Conclusão: as confusões, farsas, mentiras e ilusões criadas pelo Governo Federal e Norte Energia não cessam.

Recentemente o Ministério Público Federal (MPF) conseguiu na justiça que o Governo Federal e a NESA sejam obrigados a utilizar o estudo independente feito por especialistas da Universidade Federal do Pará (UFPA) para a definição da chamada cota 100, limite de altura de 100 metros acima do nível médio do mar.

Abaixo dessa altura pode haver alagamento permanente se a usina for construída, sendo obrigatória a retirada de todos os imóveis. Isto quer dizer que em uma estimativa técnica preliminar a população passível de ser atingida alcança cerca de 25.500 pessoas do núcleo urbano de Altamira, conforme os estudos da UFPA/MPF, e não 16.420, como apontado no EIA/RIMA da NESA, feito pelas empreiteiras a pedido do Governo Federal.

Outro problema recentemente verificado foi o não funcionamento do Sistema de Transposição de Embarcações (STE).

Mesmo a NESA tendo contratado uma empresa de Manaus, que está 24h a disposição de ninguém, o sistema não obteve êxito na primeira vez que foi acionado, no dia 28 de dezembro. Na ocasião o STE não conseguiu transportar uma voadeira de 12 lugares que tentava passar de jusante para montante do rio Xingu.

No mesmo dia que o STE se mostrava inoperante, incapaz de transportar a referida voadeira, o consórcio Norte Energia recebia a primeira parcela dos 22,5 bilhões de reais que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social vai repassar à NESA para a construção de Belo Monte. Recursos públicos que estão sendo remanejados do PIS/PASEP e FGTS, alocados no Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT).

Tanto o Governo Federal quanto a NESA tentam, o tempo todo, caracterizar a UHE Belo Monte como um fato consumado, mas, nesse caso, o verdadeiro fato consumado é a inviabilidade desta obra, em todos os aspectos.

Independente da nossa vontade, a realidade sempre se faz presente, da mesma forma que a mentira tem pernas muito curtas, como dizia nossa avó. A UHE Belo Monte é somente mais um exemplo disso.

Dion Márcio C. Monteiro é Pesquisador do Instituto Amazônia Solidária e Sustentável (IAMAS) e componente do Comitê Xingu Vivo.

EcoDebate, 11/01/2013


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8 thoughts on “É a realidade que se faz presente ou é a mentira que tem pernas curtas em Belo Monte? artigo de Dion Márcio C. Monteiro

  • Debora Wanderley

    Estamos vivendo realmente um regime democrático? Ou como sempre no Brasil, prevaleceu a vontade de quem pode mais? Vejam o desastre da transposição do Rio São Francisco. Belo Monte é Mais uma tragédia anunciada, combatida pela técnica e pela ciência, porem imposta pelo poder das grandes coorporações, e alimentada pelo governo que se anuncia de bases populares.

  • Ainda estou sob o impacto do filme Xingu, que assisti ontem à noite, que descreve a saga dos irmãos Vilas Boas.
    A transamazônica cortou terras indígenas e dizimou tribos inteiras. Acontece que, à época, estávamos sob uma ditadura…
    No meu entender, agora que vivemos em um regime democrático, a discussão está colocada em termos errados. É importante saber se, numa análise de custo-benefício, os impactos negativos da usina são maiores que os impactos positivos.
    Querer imaginar que uma obra de engenharia, grande ou pequena, não vá causar impacto ambiental é uma utopia. Qualquer intervenção na natureza provoca impacto e este impacto é tanto maior quanto maior é a obra a ser realizada.
    A questão dos índios é crucial. Baseando-se na análise de custo-benefício, o poder público reduziu em muito a eficiência da usina para não alagar terras indígenas.
    Alguns problemas, no entanto, persistem, como a situação na Volta Grande do Xingu, que afeta o banho dos índios e a produção de peixes.
    Parece-me que são problemas de fácil solução. Ao invés de os índios tomarem banho diretamente no rio, por que não criar uma estação de tratamento de água e distribuí-la diretamente nas habitações indígenas? Tenho a certeza de que eles agradecerão.
    A questão dos peixes também não é de difícil solução. Havendo oxigênio dissolvido e vazão adequada na Volta Grande, os peixes voltarão.
    Portanto, penso que devemos desarmar os espíritos e procurar soluções para os problemas pois, se a usina se tornar inviável, teremos que conviver com fontes sujas de produção de energia que ajudarão a incrementar o tão temido aquecimento global.

  • Até quando os dismandos no país serão beneficiados por governantes sem noção alguma sobre o problemas ambientais. È muito triste

  • Até quando os dismandos no país serão beneficiados por governantes sem noção alguma sobre o problemas ambientais. È uma vergonha

  • A ilusão de viver um regime democrático com resquício de ditadura, e o ranço que sempre esteve ao lado do regime instaurado em 1964, um tal de José Sarney e seus asseclas.
    Pelo que se sabe, democracia é um regime que respeita as leis e a ordem e não impõe a vontade soberana de governos autoritários e truculentos como vêm demonstrando o Governo do PT e seus aliados políticos.
    Como pode-se aceitar a idéia de energia limpa sendo que a floresta inundada produzirá gases,metano e Co², que in natura contribuirão com o efeito estufa que tanto mal está causando para humanidade? Que energia limpa é esssa? Sem contar que o preço final de 1 kw será superior a R$ 70.00 e será fornecido às mineradoras, que poluem nossos recursos hídricos e destroem o meio ambiente, a preços irrisórios? É tanta falacatrua, tantas mentiras, tantas maquiagens e más intenções que nos sentimos impotentes diante de tanta truculência e desmandos, com o dedo sujo do Sarney comandando os marionetes do poder!

  • Olha ai o que estamos fazendo, de tanto nos atrasarmos na implantação das hidreletricas, estamos queimando combustiveis fósseis, o que é muito pior. Porque não escuto ninguem reclamando das usinas termicas???
    Parece que acabar com o oxigenio e exalar gases que provocam efeito estufa pode. Mudar de local meia duzia de indigenas não pode!!!
    Não entendo mais nada!!

  • Ditadura em 1964 ? quem aqui escreveu tanto sobre ditadura não sabe o que fala, em qual parte do mundo já se viu “ditadura” com oposição ? como foi em 1964. A tal ditadura que tantos choram aqui foi um regime que tentou livrar os país dos pilantras que temos hoje, como Lula, Dilma, Zé Dirceu e por ai vai, todos os que foram caçados na época, são os pilantras e ladrões de hoje. Hoje sim podemos dizer que vivemos uma ditadura pois não há oposição, são todos corruptos unidos indiferente de quem esta no poder e nada irá mudar a não ser que o povo faça prevalecer a sua força e vá às ruas exigindo que seja feita a vossa vontade, assim como os chineses fizeram, brasileiro é tudo bundão que não gosta de ouvir a verdade e nem mexer um palito para resolver os problemas da sociedade, mais de 1 milhão se mobilizam para votar em BBB, ir a paradas Gays, paradas pra Jesus, mas ninguém se mobiliza para irem à uma parada contra a corrupção e quem paga o pato são nossos irmãos índios e nossa mãe natureza.

    Brasil, um país de acéfalos.

  • Meu caro, Marcel, você com certeza não viveu os anos duros da ditadura. Oposição? Só se for a do MDB, chamado de partido do sim (em oposição à Arena, que era chamada de partido do sim, senhor). De vez em quando o MDB resolvia colocar as manguinhas de fora e votar contra o Governo, mas pagava caro por isso. Quando se recusou a cassar o mandato de um deputado que ousou criticar o exército, a resposta foi o AI-5 e o fechamento do próprio Congresso.
    Portanto, meu caro Marcel, querer comparar a oposição de hoje com Democratas, PPS, PSDB e companhia com a oposição durante a ditadura militar é uma falácia.

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