Maldivas: Thilafushi é uma gigantesca lixeira flutuante que queima vagarosamente
Foto aérea de Thilafushi, Maldivas. Foto do blogue Bluepeace
Por de traz de arquipélago paradisíaco, Maldivas se tornam lixeiras gigantes – A fumaça sobe em espirais espessas acima da ilha e se perde na luz do Oceano Índico. Thilafushi é uma gigantesca lixeira flutuante que queima vagarosamente. Uma mancha, uma sujeira no quadro das Maldivas, o paradisíaco arquipélago com 1.200 ilhas de lagoas transparentes e turismo próspero. Matéria de Frédéric Bobin, Le Monde.
Percorrer Thilafushi é um desafio. É preciso tapar o nariz com um lenço – por causa das exalações tóxicas – e contar com a sorte para não torcer o pé em depósitos de lixo esburacados. Por trás de uma parede de blocos de concreto se elevam montanhas de garrafas de plástico. No final do caminho, afogados na bruma insalubre, caminhões despejam suas cargas de detritos.
Thilafushi é o inverso do cartão postal. Ela é o preço a ser pago pela felicidade maldiva. Ilha artificial criada em 1992 sobre uma laguna superficial, ela primeiramente serviu de lixeira gigante para Male, a capital saturada – onde hoje se concentram quase um terço dos 300 mil habitantes do arquipélago – , situada a menos de meia hora de barco. Vinte anos mais tarde, a fonte dos detritos se diversificou incrivelmente com o estouro da indústria do turismo. Cerca de 850 mil visitantes estrangeiros em 2011 – além da população nativa -, o que gera muito material residual a ser tratado.
Esses restos inevitavelmente convergirão para Thilafushi, parte deles às vezes caindo no mar. Da centena de ilhas por onde os complexos balneários estão espalhados (as outras não são abertas para o turismo) saem regularmente barcos-lixeiras com destino a Thilafushi. Segundo números oficiais, um turista produz 3,5 quilos de lixo por dia – ou seja, duas vezes mais que um habitante de Male e cinco vezes mais que um habitante das outras ilhas do arquipélago.
“Entre 300 e 400 toneladas” desses detritos são despejados a cada dia na lixeira gigante a céu aberto, segundo Shina Ahmed, o diretor administrativo da Thilafushi Corporation, a agência governamental encarregada de gerenciar a ilha.
“Thilafushi é uma bomba tóxica no oceano”, denuncia continuamente o Bluepeace, principal movimento ambientalista das Maldivas. O uso da ilha como aterro para parte dessa massa residual – sobretudo para criar terra firme sobre a laguna – apresenta grandes riscos. Os vazamentos no oceano de produtos extremamente tóxicos (chumbo, mercúrio, cádmio, amianto…), sobretudo aqueles resultantes de lixo eletrônico, aceleram a degradação do ambiente submarino, e até entram na cadeia alimentar através da fauna marinha.
E quando eles não são enterrados, esses resíduos são queimados ao ar livre – por falta de incineradores – soltando todas essas fumaças insalubres. “É perigoso!”, diz Hakim Mohammed, um operário bengalês imigrante que, munido de um bastão, procura o que é aproveitável no amontoado de detritos. “Quando o vento sopra do oeste, todos nós no escritório ficamos com enxaqueca”, admite o próprio Shina Ahmed. Como Male não é longe, é fácil imaginar que mesmo a população da capital fica exposta.
Por falta de investigações, não há nenhum número disponível sobre o impacto de Thilafushi sobre a saúde pública. “Mas podemos supor que esse impacto existe quando se vê o número de doenças pulmonares em Male”, admite com muita sinceridade Ahmed Murthaza, diretor de gestão dos resíduos na Agência de Proteção Ambiental (EPA, sigla em inglês) das Maldivas.
A “bomba” de Thilafushi contribui para a fragilização geral do meio ambiente nas Maldivas, tema extremamente delicado no contexto da elevação do nível do mar associado ao aquecimento global. Situado a menos de um metro acima do oceano, o arquipélago está entre os mais expostos do mundo, ao lado de certos Estados insulares do Pacífico sul.
A acidificação da água provocada pela pressão humana tem efeitos desastrosos sobre os corais, que fabricam recifes e, portanto, produzem ilhas.
Agora é uma corrida contra o tempo. As autoridades das Maldivas têm procurado, com dificuldades, limitar a nocividade de Thilafushi. Está sendo elaborada uma lei que especificará o tipo de detritos autorizados para a combustão. “Somente as matérias orgânicas serão incineradas”, explica Murthaza. Paralelamente, as Maldivas incentivam a exportação do lixo reciclável, em especial o ferro e o plástico, para a China, a Malásia e, sobretudo, a vizinha Índia.
Esse lixo já constitui o segundo maior item de exportação do país, atrás dos produtos da pesca.
Tradutor: Lana Lim
Matéria [Thilafushi, la bombe toxique des Maldives] do Le Monde, no UOL Notícias.
EcoDebate, 02/05/2012
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