Enchentes em São Paulo: Governador, é preciso virar a mesa, artigo de Álvaro Rodrigues dos Santos
[EcoDebate] Há poucos dias o Governador Geraldo Alckmin deu surpreendente e reveladora declaração à imprensa: a prioridade do governo no combate às enchentes estaria em construir mais dezenas de piscinões e, através de operações de desassoreamento, transformar o Tietê também em um grande “piscinão”, recuperando sua capacidade de vazão de 2005, ano da conclusão das últimas obras de ampliação da calha, 1.048 m³ por segundo nas proximidades do Cebolão. Vazão, diga-se de passagem, já hoje insuficiente para dar conta do gigantesco volume de águas pluviais que aportam ao rio em episódios de chuvas mais intensas na região.
Primeiro, uma admissão da culpa direta da administração pública pelas enchentes que ocorreram nesses últimos anos, dada a voluntária interrupção do desassoreamento do rio e seus afluentes; segundo, uma triste rendição do governo à continuada e incrivelmente equivocada estratégia de combate às enchentes que vem sendo há anos adotada pelo governo estadual e pelos governos municipais da RMSP. Estratégia a eles “vendida” por aqueles que arrogantemente e irresponsavelmente, e talvez interessadamente, insistem em afirmar que as enchentes somente serão evitadas com grandes obras hidráulicas bilionárias e com o espalhamento dos deletérios e caríssimos piscinões por toda a metrópole. Estratégia que, por segurança, adota também o esperto costume, induzindo os governantes a também adotá-lo, de culpar a Natureza, o aquecimento global e São Pedro pelas chuvas que dizem sempre ser “anormais”.
Prezado Governador, nossas enchentes são decorrência direta e exclusiva de três fatores causais que têm marcado a história de nosso crescimento urbano: a impermeabilização generalizada da cidade, o excesso de canalização de cursos d’água e a redução da capacidade de vazão de nossas drenagens pelo volumoso assoreamento provocado pelos milhões de metros cúbicos de sedimentos que anualmente provém dos intensos processos erosivos que ocorrem nas frentes periféricas de expansão urbana e pelo lançamento irregular de entulhos da construção civil e do lixo urbano.
Desde há muito impõe-se como um imperativo da lógica técnica uma nova estratégia baseada no esforço em se reduzir o impacto desses fatores causais, revertendo a impermeabilização das cidades para que a região urbanizada recupere boa parte de sua capacidade original de reter as águas de chuva, não mais retificando e canalizando cursos d1água e, concomitantemente, promovendo um intenso combate técnico à erosão e ao lançamento irregular de entulho e lixo, com o que se reduziria o fantástico grau de assoreamento do sistema de drenagem. Se com a adoção dessa nova estratégia algumas obras hidráulicas de maior porte eventualmente ainda se mostrarem necessárias, por certo serão de muito menor dimensão e de custos financeiros extremamente mais reduzidos. Como também serão de muito menor porte e custo as indispensáveis operações de desassoreamento.
Depois de décadas de contínua aplicação não cabem mais dúvidas, Governador, a atual estratégia de combate às enchentes fracassou fragorosamente em seus objetivos e promessas. Sendo que a incrível insistência na manutenção dessa estratégia vem custando um altíssimo preço à sociedade paulistana.
Como na medicina, caro Governador, ouvir uma segunda opinião e atacar as causas da doença. Esperamos todos que não lhe faltem a coragem e o discernimento para tal decisão, pela qual os paulistanos lhe seriam eternamente agradecidos.
Geól. Álvaro Rodrigues dos Santos (santosalvaro@uol.com.br)
* Ex-Diretor de Planejamento e Gestão do IPT e Ex-Diretor da Divisão de Geologia
* Autor dos livros “Geologia de Engenharia: Conceitos, Método e Prática”, “A Grande Barreira da Serra do Mar”, “Diálogos Geológicos” e “Cubatão”
* Consultor em Geologia de Engenharia, Geotecnia e Meio Ambiente
Membro do Conselho de Desenvolvimento das Cidades da Fecomércio
* Articulista do Portal Ecodebate
EcoDebate, 13/04/2012
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A região onde se situa São Paulo, denominada de Planalto de Piratininga, que em lingua indigena original quer dizer “Peixe Seco”. Porque? Porque alí e quando nem a cidade ainda existia, o rio já transbordava e ao retornar ao seu leito normal, os peixes morriam na seca.
Alterar a natureza em uma dimensão como aquela é um sonho que nunca irá se concretizar.
Se não é possivel profundar mais a calha e nem tampouco dimensiona-la em largura maior, então somente existe uma solução: aumentar a vazão – velocidade com que esta água deve escorrer -. Julgo que esta é a melhor solução, e que não irá resolver de todo o problema, mas que pode diminuir em muito ele.