Pesquisa aponta queda da mortalidade e aumento na prevalência de Aids em São Paulo
Pesquisa aponta mudanças no perfil da Aids em São Paulo – A disponibilização do acesso universal e gratuito ao diagnóstico e tratamento da Aids em São Paulo a partir de 1996 resultou em uma queda de, em média, 30% da mortalidade e em um aumento de 50% na prevalência (número de pessoas vivendo com a doença) no estado nos últimos anos.
Essa queda drástica da mortalidade e aumento da sobrevida de pacientes com Aids está mudando o perfil da doença e provocando mudanças nas estratégias de atendimento dos pacientes em São Paulo, que tende a se tornar muito diferente da que o sistema de saúde conhecia e estava acostumado a lidar.
As constatações são de um projeto realizado por pesquisadores de quatro instituições no Estado de São Paulo, incluindo as Faculdades de Medicina e Saúde Pública (FSP) da Universidade de São Paulo (USP), o Instituto de Saúde e a Coordenação Estadual de DST/Aids, da Secretaria da Saúde do Estado de São Paulo, e a Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (Seade).
Financiado pela FAPESP por meio do Programa de Pesquisa em Políticas Públicas, o objetivo do estudo foi criar uma sistemática de diagnóstico de vulnerabilidade à Aids em São Paulo por meio da seleção de indicadores sociais, individuais e programáticos, com a finalidade de identificar comunidades e segmentos populacionais em áreas geográficas no estado que devem merecer políticas públicas e intervenções específicas.
Para isso, os pesquisadores avaliaram o impacto da introdução dos antirretrovirais altamente potentes no estado a partir de 1996, analisando três indicadores epidemiológicos: taxa de mortalidade, prevalência e incidência (número de casos novos).
Alguns dos principais apontamentos do estudo foram que, em função da introdução do programa, houve uma queda da mortalidade por Aids em todo o Estado de São Paulo e a incidência também passou a cair a partir de 1998.
“Entre 1998 e 2005, que foi o último ano que analisamos, a queda da taxa de mortalidade foi de, em média, 30% e, dado que o tratamento não cura, verificou-se um aumento da prevalência de cerca de 50%. Também houve uma melhora da qualidade de vida dos pacientes”, disse Eliseu Alves Waldman, pesquisador da Faculdade de Saúde Pública da USP e coordenador do projeto, à Agência FAPESP.
De acordo com o pesquisador, de modo geral, o programa estadual de prevenção e controle de DST/Aids tem sido bem-sucedido em 93% dos municípios paulistas que apresentam casos de Aids. Entretanto, o desempenho do programa não é igual em aglomerados urbanos pequenos, médios e grandes.
O programa apresenta desempenho melhor nos centros urbanos médios e grandes, que dispõem de melhores serviços de assistência básica à saúde, maior número de serviços especializados e onde os níveis de escolaridade da população são mais elevados, o que aumenta a probabilidade de diagnóstico precoce e introdução do tratamento.
Já nos municípios muito pequenos, que correspondem a, aproximadamente, 5% das regiões analisadas no estudo, os resultados apontam a necessidade de estratégias específicas de intervenção.
“São municípios tão pequenos que, muitas vezes, não dispõem de serviços próprios de atendimento especializado e o diagnóstico e tratamento dos casos acabam sendo tardios”, explicou Waldman. “Para isso, há tentativas de se trabalhar com consórcios, em que um ambulatório especializado atenderia um conjunto de pequenos municípios.”
Na Grande São Paulo, por exemplo, que foi uma das áreas homogêneas estudadas na pesquisa, a taxa de mortalidade e incidência de Aids nos últimos anos caiu, aproximadamente, 60%, e houve um aumento mais acentuado da prevalência.
“Esses resultados são equivalentes aos dos programas de prevenção e controle de Aids/DST desenvolvidos nos principais centros urbanos norte-americanos e europeus”, destacou Waldman.
Mudança de perfil
Segundo Waldman, entre alguns dos resultados mais bem-sucedidos do programa paulista estão a expressiva diminuição da transmissão vertical (de mãe para filho) no Estado de São Paulo e um aumento da sobrevida de pacientes que já nasceram infectados.
Em todas as regiões do estado, incluindo os pequenos municípios e com maior predominância nos grandes centros, os pesquisadores verificaram que, em consequencia da ampliação da sobrevida, houve aumento no número de adolescentes e adultos jovens vivendo com Aids, que representam um tipo de paciente muito diferente dos que os serviços de assistência à saúde conheciam e estavam acostumados a lidar.
Isso, segundo Waldman, implicará na necessidade de políticas públicas que promovam o desenvolvimento de novas tecnologias e a criação de atendimento adequado a esse tipo de paciente no sistema público de saúde paulista.
“Será preciso acompanhar não só os efeitos colaterais dos antirretrovirais nesses pacientes, mas, à medida que se tem mais pessoas sendo tratadas por longos períodos, precisaremos ter laboratórios que acompanhem, por exemplo, o surgimento de resistência às drogas, que é algo que tem que ser monitorado porque isso implica, muitas vezes, mudanças nos esquemas terapêuticos”, disse.
Outra constatação do estudo foi que a queda da mortalidade por Aids entre pessoas acima de 50 anos não ocorreu de forma tão intensa como a observada entre jovens, indicando que esse grupo também necessita de cuidados especiais de profissionais e serviços ambulatoriais e demandará estratégias específicas do programa de controle e prevenção de Aids paulista, como as que já vêm sendo implementadas em outros países.
“A pior resposta aos antiretrovirais apresentada por esse grupo etário necessita ser mais estudada. Em parte, ela pode ser atribuída à diminuição natural da resposta imune entre os idosos e também à maior prevalência de co-morbidades, muitas vezes tratadas com medicamentos que deprimem o sistema imunitário”, apontou Waldman.
Segundo o pesquisador, algumas das possíveis implicações em políticas públicas dessas mudanças no perfil da Aids no Estado de São Paulo poderão ser a necessidade de recursos para pesquisa e desenvolvimento tecnológico, que possibilitem condições para a criação de novas estratégias para o tratamento e acompanhamento desses pacientes afetados pela doença, de evolução crônica, e que são vulneráveis, por exemplo, aos efeitos colaterais decorrentes do uso prolongado de medicamentos.
Um dos resultados do projeto foi um conjunto de indicadores sociais, demográficos e programáticos para o monitoramento da epidemia de Aids no estado de São Paulo, que foram disponibilizados na forma de um aplicativo no site do CRT DST/Aids para os gestores municipais, que são responsáveis pela execução do programa no estado.
Matéria de Elton Alisson, da Agência FAPESP, publicada pelo EcoDebate, 13/02/2012
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