O Estado Estacionário e Ambientalmente Sustentável, artigo de José Eustáquio Diniz Alves
[EcoDebate] Num Planeta finito, é impossível que a economia e a população cresçam de maneira infinita. Esta verdade evidente já foi repetida inúmeras vezes. Mas ninguém sabe dizer quais são os limites exatos do crescimento e qual será o futuro da humanidade e do meio ambiente.
De 1800 a 2011 a população cresceu cerca de 7 vezes (de um bilhão para 7 bilhões de habitantes) e a economia cresceu cerca de 60 vezes. Na soma dos primeiros 14 anos do século XXI, a economia mundial deve crescer mais do que o PIB global acumulado do ano 1 a 1800 (de acordo com dados de Angus Maddison) e a população mundial aumentou em mais 1 bilhão de habitantes somente entre 1999 e 2011. Na velocidade do mundo atual, cada 14 anos valem o equivalente ao que se fazia nos primeiros 1800 anos da era cristã.
Por tudo isto, o impacto das atividades humanas sobre o meio ambiente tem sido devastador. Segundo dados da pegada ecológica, as atividades antrópicas já ultrapassaram em 50% a capacidade de regeneração do Planeta. A economia atual tem crescido utilizando riquezas naturais produzidas no passado, como as energias fósseis e os aquíferos fósseis, que não são renováveis e vão se esgotar em um futuro relativamente próximo. A maior parte da produção econômica libera gazes de efeito estufa (CO2, metano, etc.) que estão se acumulando na atmosfera e provocando o aquecimento global. Temperaturas mais elevadas significam a elevação do nível do mar, maior acidificação das águas e mudanças climáticas extremas, como secas e enchentes. Das quase 9 milhões de espécies vivas da Terra, cerca de 30 mil desaparecem todos os anos.
Tem sido dificil mudar esta rota equivocada, pois o crescimento econômico é impulsionado pelas aspirações ilimitadas dos seres humanos e por três conjuntos de forças: a pressão dos trabalhadores por emprego e renda, a pressão das empresas capitalistas pelo crescimento das vendas e dos lucros e a pressão dos Estados Nacionais em busca do poderio nacional. Para atender estas três demandas, os políticos (em democracias ou em regimes autoritários) prometem manter elevadas taxas de crescimento econômico e de geração de trabalho.
Porém, o crescimento econômico e do consumo, a qualquer custo, está colocando a humanidade e a biodiversidade na beira de um precipício. Falta pouco para o modelo rolar pela ladeira abaixo. Cresce a convicção de que o caminho contemporâneo é insustentável. Portanto, não dá para continuar crescendo no ritmo e no modelo atual. Qual a alternativa?
Os autores clássicos da economia, como Adam Smith e David Ricardo, consideravam que, no processo de desenvolvimento econômico, o avanço das forças produtivas levaria a um “excesso de capital” que provocaria uma queda da taxa de lucros até um ponto que não haveria estímulo ao investimento e, consequentemente, haveria uma situação caracterizada como “Estado Estacionário”. Para Smith e Ricardo o Estado Estacionário, poderia ser adiado, mas seria atingido após o país esgotar a sua fase “progressista” de acumulação e atingir os limites naturais (“solo e clima” nas palavras de Adam Smith).
Para Karl Marx, a tendência à redução da taxa de lucro levaria não só ao Estado Estacionário, mas ao fim do capitalismo e, por meio da união dos trabalhadores, surgiria uma sociedade sem classes, onde prevaleceria o princípio: “De cada um segundo suas capacidades a cada um segundo as suas necessidades”.
Assim, por perspectivas teóricas diferentes, a economia clássica, considerava que existia um limite à continuidade do desenvolvimento econômico. Haveria um ponto de saturação. O Estado estacionário seria o destino final da tendência da redução das taxas de lucro.
O economista Jonh Stuart Mill, no livro “Princípios de economia política”, escrito em 1848, seguindo as premissas da economia clássica, também considerava que a economia iria, mais cedo ou mais tarde, parar de crescer. Mas ao contrário dos autores citados, Stuart Mill via de maneira positiva o fim do processo de crescimento econômico e populacional, que levaria ao Estado Estacionário. Na sua visão, o Estado Estacionário corresponderia a um Estado de bem-estar, onde as necessidades materiais da sociedade seriam atendidas sem desrespeitar o meio ambiente e a biodiversidade.
Existem diversos autores que consideram que as idéias de Stuart Mill poderiam servir de base para um modelo de desenvolvimento que deixe de lado a obsessão pelo crescimento material da economia. Como a população mundial ainda está crescendo e necessita de comida, edução, saúde, moradia e outros tipos de consumo, o sistema econômico ainda precisa atender a estas necessidades.
Mas as idéias de Stuart Mill podem servir de base para uma situação em que a população e a economia global se estabilizem até, por exemplo, o ano de 2050. A idéia de um Estado Estacionário, não significa parar a história no tempo. Antes mesmo de se atingir o Estado Estacionário, é preciso fazer a transição da economia de alto carbono para a economia de baixo carbono. É preciso aumentar a eficiência energética e produtiva, reduzir os desperdícios e aumentar a reciclagem do material utilizado nos bens de consumo.
Por fim, podemos imaginar que para se chegar ao Estado Estacionário é preciso fazer a transição da economia do consumo para a economia criativa e do conhecimento. No Estado Estacionário, o crescimento quantitativo seria substituido pelo crescimento qualitativo. A produção com base no consumo intensivo de matérias-primas seria substituida pela produção de bens imateriais e intangíveis. A autodeterminação da população e o controle do crescimento econômico material daria lugar ao florescimento de outras espécies vivas do Planeta. O antropocentrismo daria lugar ao ecocentrismo.
José Eustáquio Diniz Alves, colunista do EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br
EcoDebate, 21/12/2011
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