Um outro modelo de desenvolvimento para a Amazônia, entrevista com a socióloga Letícia Rangel Tura
Para a socióloga Letícia Rangel Tura, existem ações importantes acontecendo no território nacional que precisam ser mais valorizadas
Na opinião da socióloga Letícia Tura, “na Amazônia já ocorre outro modelo de desenvolvimento de várias iniciativas de populações agroextrativistas, agricultores familiares, quilombolas, que têm resistido no território, nas suas unidades de conservação, na sua terra, pensando em várias propostas alternativas de manejo florestal comunitário, de agroecologia, de gestão do território”. A entrevista foi concedida por telefone à IHU-On-Line. Para a pesquisadora, o que é preciso é que tais propostas tenham efetivamente o “apoio governamental, recursos públicos, para que elas de fato possam se desenvolver, construir mercados próprios, do ponto de vista do comércio justo”. E afirma: “acredito que existem várias experiências que deveriam ser sistematizadas, ampliadas, nessa possibilidade de pensar em outra proposta de desenvolvimento”.
Letícia Rangel Tura é socióloga e diretora-executiva do Programa Regional da Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Como avalia o avanço dos projetos de produção de agrocombustíveis no Brasil?
Letícia Rangel Tura – Os vários programas e políticas de agrocombustíveis no Brasil que vêm desde 2004, 2005, apesar de toda a perspectiva de que fossem baseados na agricultura familiar, na verdade, tornaram-se projetos voltados para a produção da soja. Quer dizer, outra grande parte é sebo de boi e não se conseguiu concretizar efetivamente a proposta de se ter uma produção baseada na agricultura familiar. Por outro lado, grande parte desses projetos é baseada numa relação de integração com a indústria, da agricultura familiar com a indústria, o que limita muito as possibilidades de autonomia e independência da agricultura familiar. Por outro lado, são baseados em monocultivos ou em algum outro tipo. A soja, como falei anteriormente, teve essa perspectiva da mamona, mas não tem como base uma matriz diversificada de óleos, uma matriz industrial diversificada também e pequenas indústrias localizadas, coordenadas por cooperativas. E outras, como o etanol, também trazem grandes impactos ambientais, que são os impactos ambientais e sociais de toda a produção monocultiva. Vários tipos de monocultivos, como soja, cana, eucalipto, trazem vários impactos ambientais para os territórios, desde a contaminação por uso intensivo de agrotóxicos, desmatamento, assoreamento de rios etc.
IHU On-Line – Por que chamá-los agrocombustíveis e não biocombustíveis?
Letícia Rangel Tura – Porque bio traz a noção de vida. E da maneira como eles estão se desenvolvendo, como eles foram concebidos, não poderíamos associar isso à vida, uma vez que eles trazem profundos impactos socioambientais onde ocorrem. Por isso é preferível chamá-los de agrocombustíveis.
IHU On-Line – Quais os impactos do agrocombustível sobre a agricultura e a alimentação?
Letícia Rangel Tura – Os agrocombustíveis podem ter uma concorrência enorme com a produção de alimentos. Se você não tiver um controle sobre a quantidade a ser plantada, eles vão concorrer com as áreas de produção de alimentos. Têm estudos que mostraram que isso aconteceu, por exemplo, em algumas regiões de São Paulo, onde a área de cana se impôs sobre área de produção de feijão, arroz. Mas, afora isso, não é só a quantidade de área produzida para se alcançar determinadas metas, mas também a forma como se produz. Novamente voltamos para a questão do monocultivo. Quer dizer, se você pensa a produção de agrocombustível sem associar à produção de alimentos, aquela vai acabar concorrendo com estes. Acredito que tudo depende de qual é o objetivo inicial que você tem. Quando você planeja inicialmente e seu objetivo está voltado para o desenvolvimento local, para a soberania energética e alimentar da população, você estará voltado para o abastecimento industrial.
IHU On-Line – Acredita que a Amazônia pode oferecer ao Brasil uma chance de romper com o atual modelo de desenvolvimento?
Letícia Rangel Tura – Acredito que na Amazônia já ocorre outro modelo de desenvolvimento a partir de várias iniciativas de populações agroextrativistas, agricultores familiares, quilombolas, que têm resistido no território, nas suas unidades de conservação, na sua terra, pensando em várias propostas alternativas de manejo florestal comunitário, de agroecologia e de gestão do território. O que é preciso é que estas propostas tenham efetivamente o apoio governamental, recursos públicos, para que elas de fato possam se desenvolver, construir mercados próprios, do ponto de vista do comércio justo. Acredito que existem várias experiências que deveriam ser sistematizadas, ampliadas, nessa possibilidade de pensar em outra proposta de desenvolvimento.
(Ecodebate, 31/10/2011) Entrevista realizada por Thamiris Magalhães e publicada pela IHU On-line, parceiro estratégico do EcoDebate na socialização da informação.
[IHU On-line é publicada pelo Instituto Humanitas Unisinos – IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.]
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Olá,
Gostaria de colocar minha opinião sobre a questão do modelo de desenvolvimento da Amazônia. Acredito que seja uma idéia pouco “refinada” e não sei realmente se ela é viável politica, social e economicamente falando.
O fato é que penso que o desenvolvimento deveria respeitar as características da região. Não consigo entender porque levar pra lá o modelo do sul-sudeste tendo tanta coisa pra ser feita por lá.
Qual a necessidade de instalar grandes empresas e etc, quando a maior riqueza do local não aproveitada?
Acho sim que faltam condiçoes de vida melhores à população e essa é a questão central. Como atender essas necessidades?
Minha sugestão:
1° É essencial que seja mantida o mais preservada possível, logo surgem as primeiras possibilidades de levar renda e consequentemente desenvolvimento.
A população tem que ser envolvida na preservação, fiscalização. Ou seja, sendo a região de interesse mundial porque não ‘bancar’ a fiscalização, preservação oferecendo remuneração a uma porcentagem da população para que ao mesmo tempo que cuidam têm renda.
Segundo ponto. Dá pra preservar fazendo manejo florestal, logo temos outra fonte de renda para população local, extrativismo conroladao.
2° A Amazônia é uma fonte inesgotável de pesquisa.
Porque não instalar centros de formação acadêmica para que sejam formados cidadãos que podem através da pesquisa cintífica sobreviver e contibuir para a manutenção da região?
Porque não instalar centros de pesquisa farmacêutica (por exemplo)? Quantos compostos poderiam ser descobertos?
3° Incentivando a fiscalização remunerada, a pesquisa científica, a formação acadêmica profissional, consequentemente teríamos aumento de renda, aumento de movimentação da economia de uma forma geral. Logo inumeras oportunidades de trabalho seriam criadas. Prestação de serviço, comércio, etc.
Muita coisa poderia ser mencionada ainda. Como ecoturismo, artesanato entre outras coisas.
Em resumo penso que dá “pra juntar o útil ao agradável” como se diz por ai. Não precisamos de planos mirabolantes nem de mega construções, muito menos agredir o meio ambiente.