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Artigo

Pesquisas com sistemas agroflorestais da Embrapa em Machadinho D’Oeste-RO, artigo de João A. Mangabeira

PESQUISAS com sistemas agroflorestais DA Embrapa EM Machadinho d’Oeste – RO

João A. Mangabeira 1

 

[EcoDebate] O Município Machadinho d’Oeste surgiu do Assentamento Rural Machadinho d´Oeste, em Rondônia. Diferenciado em relação aos demais assentamentos rurais no Brasil, este assentamento pioneiro e revolucionário em função de seu planejamento teve como proposta a criação de reservas florestais em blocos. Hoje, com quase 30 anos, é um laboratório vivo e experiência exemplar de integração da agricultura com reservas florestais, tendo a agricultura local moldada pelas experiências, principalmente dos sistemas agroflorestais, pesquisadas pela Estação Experimental da Embrapa em Machadinho d’Oeste.

O traçado do assentamento em Machadinho d’Oeste não obedeceu ao tradicional padrão do tipo “espinha de peixe” existente na maioria dos projetos da região. Em Machadinho d’Oeste, lotes privados foram combinados com reservas florestais comuns. A rede viária implantada levou em conta a topografia e a rede hidrográfica, e esse respeito às características de relevo e hidrografia permite o acesso aos lotes mais remotos. Isso diminui os custos de manutenção, pois no traçado octogonal (“espinha de peixe”) é necessário que sejam construídas pontes e que haja um controle maior da erosão, o que geralmente não é feito nas regiões amazônicas. Como a sazonalidade é uma variável importante que afeta a locomoção, muitos agricultores ficam isolados no período das chuvas. As reservas florestais, em razão de sua disposição em bloco e do arranjo institucional criado, têm sido mantidas relativamente preservadas, criando, assim, a possibilidade de geração de serviços ambientais prestados para agricultura.

Este Assentamento Rural em Machadinho vem sendo monitorando há 22 anos pela Embrapa Monitoramento por Satélite, com apoio da Estação Experimental de Machadinho d’Oeste, e já foram identificados vários benefícios gerados para agricultura pela manutenção das reservas florestais em bloco, bem como pelo incentivo e implantação dos sistemas agroflorestais. Estudos realizados localmente e com tecnologias avançadas por sensoriamento remoto por satélite (geotecnologias) têm comprovado a evidência da contribuição dos serviços ecossistêmicos para a produtividade do café: a produtividade do café perto das reservas florestais em blocos é maior. Para este caso, a taxa média de produtividade é aproximadamente 20% maior nos cafezais perto da mata, o que mostra que a mata, por intermédio de serviços ecossistêmicos diversos, pode estar contribuindo para o aumento da produtividade do café. Os testes geoestatísticos mostram forte correlação espacial positiva da medida do nível crescente de capitalização dos agricultores à medida que os lotes com café aproximam-se das reservas florestais. Neste caso, existe uma forte evidência de que os produtores rurais em Machadinho d’Oeste não se capitalizaram somente pelos padrões convencionais de uma dinâmica de evolução de sistemas agrários. Pode-se afirmar com base no que foi encontrado em uma pesquisa da Embrapa, que existe um componente de serviços ecossistêmicos contribuindo para a trajetória de acumulação de capital nos sistemas de produção agrícola estudados. (MANGABEIRA, 2010).

Outro estudo realizado em Machadinho d´Oeste para comprovar a importância dos sistemas agroflorestais foi realizado por meio de uma análise comparativa via produtividade agrícola, com intuito de valorar os serviços ambientais de café em sistema agroflorestal (sombreado) versus café a pleno sol, a partir de uma amostra de 172 pequenos agricultores familiares que plantam e produzem café na área de assentamento agrícola em Machadinho d’Oeste, RO. Os produtores são acompanhados sistematicamente pela equipe da Embrapa Monitoramento por satélite há 22 anos. Em 2008 foi realizado mais um levantamento de campo, por intermédio de dados declaratórios pelos produtores rurais, em toda a amostra de propriedades familiares que serviu como base para esse trabalho. Os dados da produtividade média agrícola dos dois sistemas de cultivos foram comparados pelo teste t ao nível de 5% de probabilidade, bem como foram descritos alguns indicadores comparativos de forma descritiva para os dois sistemas. Com o intuito de corroborar a importância dos sistemas agroflorestais (SAF’s) alguns exemplos positivos destes sistemas em relação aos serviços ambientais foram descritos por intermédio de dados secundários oriundos da literatura. Os primeiros resultados alcançados mostram a vantagem aparente do café sombreado em relação ao plantado a pleno sol em Machadinho d’Oeste-RO. Os SAF’s com café, neste caso, mostram-se favoráveis do ponto de vista ambiental. Apresentam-se também favoráveis do ponto de vista social pelo bem estar do trabalhador e pelo fato de o agricultor manejar o café à sombra Do ponto de vista econômico são altamente viáveis, se for computada no futuro a possibilidade da exploração da madeira dos SAF’s (MANGABEIRA, et. al.2009).

Vários outros estudos foram realizados utilizando como base a Estação Experimental de Machadinho d’Oeste, e contribuíram para não só o desenvolvimento local, mas também para a geração de parâmetros na indicação de sistemas de produção sustentáveis para a Amazônia e para o Brasil. Vale destacar os trabalhos dos pesquisadores: Abadio Hermes Vieira, Francisco das Chagas Leônidas, Marilia Locatelli, Michelliny de Matos Bentes Gama, entre outros. O estudo de Michelliny de Matos Bentes Gama (2003) pesquisou a produção, a eficiência do uso da terra, o retorno financeiro e o risco de investimento nos SAFs. Os dados dos sistemas agroflorestais foram originários de um experimento de 15 anos, pertencente à Embrapa, instalado no Campo Experimental de Machadinho d’Oeste. As espécies utilizadas foram: banana (Musa sp.) – Ba, pimenta-do-reino (Piper nigrum L.) – Pm, cupuaçu (Theobroma grandiflorum (Willd. ex Spreng.) K. Schum.) – Cp, castanha-do-brasil (Bertholletia excelsa H.B.K.) – Ca, freijó (Cordia alliodora ((Ruiz & Pav.) Oken) – Fr e pupunha (Bactris gasipaes Kunth) – Pu. Os tratamentos consistiram em sistemas agroflorestais: T1 (Ca-Ba-Pm-Cp), T2 (Fr-Ba-Pm-Cp), T3 (Pu-Ba-Pm-Cp) e monocultivos: T4 Ca, T5 Fr, T 6 Pu, T7 Ba e T8 Pm. Os dados dos SAFs foram analisados de forma comparativa com os dos monocultivos e a situação observada nos SAFs foi considerada favorável. Todos os sistemas de produção foram economicamente viáveis, sendo o T1 aquele com melhor desempenho financeiro e, apesar do alto custo de implantação e manutenção, o risco de investimento neste sistema agroflorestal foi comprovadamente menor, com resultados favoráveis ao investimento, de acordo com as simulações de risco e os resultados dos indicadores financeiros aplicados (GAMA, 2003).

 

Mais ações baseadas nas pesquisas da Embrapa localmente

 

Baseadas nas experiências que partem da Estação Experimental da Embrapa em Machadinho d’ Oeste, várias ações estão sendo implementadas no município de Machadinho d’Oeste, como é o caso do Projeto Café Florestal, que contemplará agricultores assentados pelo processo de reforma agrária no município. Esse projeto é baseado na implementação de um sistema diversificado, que associa o café (Coffea arábica L. e Coffea canephora) com o cultivo de culturas anuais como feijão, milho, mandioca, entre outras culturas, e que, além disso, implanta na mesma área de cultivo espécies de árvores nativas da Floresta Amazônica, como mogno, emburana de cheiro, samaúma, castanheira, pau d’arco, mulateiro, maçaranduba e outras. As áreas de café na floresta são implementadas principalmente nos assentamentos próximos a fragmentos florestais, os quais desempenham o papel de trampolins ecológicos, ou seja, bosques florestais que viabilizam o trânsito de algumas espécies da nossa fauna. Essa comunicação entre um fragmento e outro possibilita o fluxo gênico e aumenta a diversidade genética nestes locais. A presença das árvores no sistema agrosilvipastoril possibilita um microclima propício ao cultivo do café e também constitui uma barreira biológica, pois promove, por intermédio da presença dos inimigos naturais (pássaros ou insetos predadores), a eliminação de pragas de grande risco na produção do café. Além disso, um manejo totalmente orgânico afasta a possibilidade de danos causados pelo uso do agrotóxico, os quais afetam o produtor, o meio ambiente e quem consome os produtos ali gerados. Outra vantagem desse projeto encontra-se na condição de auto-suficiência do produtor na condução da cultura do café, pois os insumos (biofertilizantes, inseticidas orgânicos e o húmus de minhoca utilizado na adubação do café) podem ser encontrados na sua propriedade ou produzidos pelo agricultor, o que diminui os custos do cultivo (BULHÕES, 2008).

Várias outras ações foram e estão sendo desenvolvidas em Machadinho, como no caso do SEGUNDO DIA ESPECIAL DO CAFÉ EM MACHADINHO D’OESTE: FOCANDO A QUALIDADE DO CAFÉ, realizado no dia 22 de maio de 2011 no Campo Experimental da Embrapa no município, que contou também com a participação da Secretaria de Estado da Agricultura (Seagri), Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira (Ceplac), Incra, Idaron, associação de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Rondônia (Emater), do Banco do Brasil, Prefeitura Municipal de Machadinho d’Oeste e da Cooperativa Mista Agroindustrial de Machadinho d’Oeste (Comamo).

A pesquisadora Vanda Gorete Rodrigues da Embrapa Rondônia (Porto Velho, RO) esteve neste dia de campo (22/05/2011) em Machadinho d’Oeste, falando sobre sistemas agroflorestais com café, destacando os dois componentes importantes: a árvore e o cultivo agrícola do café, de acordo com Suleiman (2011).

Ela explicou que, sendo a árvore o componente maior do sistema e que modifica o ambiente onde está o café, o trabalho da pesquisa é identificar soluções para que esse efeito seja positivo para aumentar a produtividade e a sustentabilidade do sistema. Entre os efeitos positivos, a pesquisadora enumera a diminuição da intensidade de luz e das temperaturas ambiente e do solo. “Além disso, a queda de folhas e galhos proporciona a formação da cobertura de serapilheira que protege o solo das plantas invasoras, mantém a umidade do solo e aumenta a incorporação de nutrientes a partir da decomposição dessa biomassa”, explicou (SULEIMAN, 2011).

As espécies arbóreas que podem fazer parte do sistema incluem as florestais, frutíferas e as árvores de “serviço”. Vanda explica que essas últimas oferecem sombra e melhoram o ambiente da lavoura favorecendo, inclusive, o trabalho do agricultor no campo, sob condições de temperaturas mais amenas. “Isso é especialmente bem-vindo na época de colheita, que compreende os meses de maio a julho, período do verão amazônico”, destaca(SULEIMAN, 2011).

Outro fator positivo das “árvores de serviço”, de acordo com a pesquisadora, é o sequestro de carbono da atmosfera, contribuindo assim com uma questão crucial para o meio ambiente: a redução dos gases de efeito estufa (SULEIMAN, 2011)..

As espécies florestais estudadas pela Embrapa Rondônia e que apresentaram melhores resultados, até o momento, no Campo Experimental da Empresa em Machadinho d’Oeste, são a bandarra, o pinho cuiabano e a teca. A partir de diagnósticos realizados pela Embrapa em áreas de produtores, na região central do Estado, foram encontradas cerca de 20 espécies florestais e frutíferas – leguminosas ou não – consorciadas com lavouras de café (SULEIMAN, 2011).

Além do benefício para o cafeeiro, essa prática agrícola fornece alimentos, lenha e madeira, além de forragem para animais, o que gera uma renda extra ao produtor”, diz a pesquisadora. Ela acrescenta que, além desses produtos serem usados para o sustento próprio e da família, o agricultor pode comercializar o excedente de produção e usufruir dessa renda o ano todo, e não somente da obtida com o café (SULEIMAN, 2011)..

O dia especial partiu de um clamor local e pretendeu apontar um norte de trabalho e prosperidade à cafeicultura regional. O evento objetivou proporcionar condições para o desenvolvimento de um pólo produtor de qualidade superior de café em Machadinho, possibilitando sustentabilidade socioeconômica e ambiental com a agregação de valores, gerando renda às famílias de pequenos produtores rurais, em regime familiar. Ainda que predominem na região de Machadinho d’Oeste pequenos produtores utilizando sistema de produção similar ao utilizado nas regiões produtoras tradicionais do país o qual é pouco adequado às condições ecológicas locais, e que, infelizmente, prevaleça o café vendido na folha, é de suma importância o incentivo e pesquisas do café produzido pela agricultura familiar amazônica em SAFs. Desde que os agricultores sejam bem remunerados, os SAFs podem deter o êxodo rural e o avanço sobre a floresta, além de servirem para recompor as áreas da reserva legal. O café oriundo de manejo sustentável na floresta amazônica pode ter “over price” em qualquer mercado internacional por meio do comércio justo e solidário: “Beba café e preserve a floresta Amazônica” é uma mensagem que pode ser exclusiva dos povos da floresta. Ou seja, “BEBA CAFÉ COM O MELHOR DO SABOR BRASILEIRO E PRESERVE A FLORESTA AMAZÔNICA” é exclusividade do blend desenvolvido pela Cooperativa Mista Agroindustrial de Machadinho d’Oeste.

Para este caso, já existe iniciativa local para certificar este tipo de produção diferenciada em Machadinho d’Oeste, por intermédio da Agência de Defesa Sanitária Agrosilvopastoril do Estado de Rondônia – Idaron – que considera a importância socioeconômica e ambiental da cultura do café no Estado de Rondônia e a necessidade da caracterização do café produzido nas diferentes regiões ecológicas do Estado Rondônia, justificando a necessidade de normatizar o cadastramento, o registro de pessoa física e jurídica e o credenciamento de cooperativas e entidades representativas dos produtores de café do Estado, visando emissão do Certificado de Origem e Qualidade do Café, considerando a necessidade de disciplinar o uso e estabelecer normas destinadas à emissão do Certificado de Origem e Qualidade do Café, junto ao CADASTRAMENTO E DO REGISTRO NO CERTIFICAFÉ.

Por outro lado, com o intuito de corroborar a importância de uma estação experimental com sistemas agroflorestais, pesquisas realizadas pela Embrapa Monitoramento por Satélite, durante 22 anos de monitoramento da agricultura e dos agricultores em Machadinho d’Oeste, foram elaboradas enquetes juntos aos produtores sobre freqüências dos que conhecem e se já visitaram a Estação Experimental da Embrapa em Machadinho d’Oeste, tendo como resultado apresentada na tabela 1 abaixo. O acesso às informações de tecnologias pode ser um fator determinante do sucesso na agricultura, portanto, em Machadinho d’Oeste, a busca destas informações pode ser medida pelo conhecimento da Embrapa local e pelas visitas dos produtores rurais. Neste caso, pode-se afirmar que maioria dos produtores rurais em Machadinho d’Oeste conhece e já visitou a Embrapa local (TABELA 1)

 

 

Tabela 1 – Freqüências dos produtores que conhecem a Embrapa e se já visitaram.

  Freqüência Absoluta Freqüência Relativa (%)
Contato com a Embrapa em 1986
Conhece 153 34,9
Já visitou 49 11,2
Contato com a Embrapa em 1989
Conhece 217 61,1
Já visitou 116 32,7
Contato com a Embrapa em 1996
Conhece 203 51,9
Já visitou 138 35,3
Contato com a Embrapa em 1999
Conhece 270 61,5
Já visitou 169 38,5
Contato com a Embrapa em 2020
Conhece 198 61,7
Já visitou 127 39,6
Contato com a Embrapa em 2005
Conhece 230 58,5
Já visitou 155 67,4
Contato com a Embrapa em 2008
Conhece 235 66,9
Já visitou 220 62,7

 

Outras ações de pesquisa com o mesmo enfoque desenvolvido em Machadinho d’Oeste-RO

Iniciativas como esta de pesquisa, preservação de reservas florestais e incentivos de implantações de sistemas agroflorestais, principalmente com café, para preservação de remanescente florestal, já ocorrem em outros lugares do Brasil como é o caso do Café que Abraça a Floresta ou Café com Florestas, desenvolvidos pela ONG Instituto de Pesquisas Ecológicas – Ipê -, no Pontal de Paranapanema, extremo oeste de São Paulo. Estes trabalhos têm conseguido incutir nos pequenos agricultores assentados pelo programa de Reforma Agrária um novo conceito de produção, que conserva a vegetação nativa. De acordo com Jefferson Ferreira Lima, do Ipê, assentados de outras regiões já procuraram o Ipê para conhecer as bases do Projeto Café com Floresta. A ONG está inclusive estudando formas de estender para outras regiões do Brasil o conceito desenvolvido em prática no projeto Café com Floresta, iniciado em 2001. Jefferson Lima e sua equipe propuseram um modelo de agroecologia baseado na diversidade. Esse modelo associa o café às culturas anuais – milho, mandioca, feijão etc – e os assentados plantam, na mesma área de produção, espécies de árvores nativas da Mata Atlântica, como Ingá, Loro Pardo, Timburi e Ficheira. Essa implementação se dá prioritariamente nos assentamentos próximos a fragmentos florestais considerados como trampolins ecológicos. Ganham a natureza e os produtores, já que as árvores tornam a produção do café menos suscetível aos riscos de geadas, no caso de S. Paulo. Além disso, o manejo totalmente orgânico é lucrativo não só pela dispensa de agrotóxicos, mas também em função de um aproveitamento quase total das transformações da natureza.

Atualmente, a mudança de comportamento dos produtores em relação ao novo modelo de produção já pode facilmente ser visualizada na condução da propriedade, não somente na área referente ao Projeto Café com Floresta, mas em outras atividades da propriedade. Cada uma das áreas em desenvolvimento deste projeto tem como função inicial servir de Unidade Demonstrativa, onde as difusões das técnicas aplicadas são visíveis, o que facilita a reprodução por outros produtores da região. Algumas adoções destas práticas já podem ser notadas nas propriedades vizinhas, principalmente na utilização de minhocário para produção de húmus, na construção de composteiras e no manejo de mato como cobertura da terra.

Outro ótimo resultado do trabalho do Ipê é o plantio diversificado com culturas de subsistência aplicado nas propriedades. Do mesmo lote onde se encontra a plantação de café, o produtor retira outros produtos como: mamão, banana, abóbora, milho, mandioca, tomatinho, melancia, melão, batata-doce, quiabo, arroz, feijão, entre outros. A reunião de todas essas culturas pode ser encontrada em uma mesma área, dando uma condição de fartura na subsistência familiar (que antes não acontecia por simples falta de orientação) e enriquecendo o solo para futuras plantações.

O Projeto Café com Floresta é uma pequena parcela da somatória de esforços de todos os trabalhos relacionados à biologia da conservação, desenvolvida pelo Ipê no Pontal do Paranapanema. Ele complementa as atividades realizadas nos projetos de educação ambiental, detetives ecológicos e medicina da conservação, entre outros.

O futuro da Agricultura em Machadinho d’Oeste e da Estação Experimental da Embrapa local

A Estação Experimental da Embrapa em Machadinho d’Oeste é um dos poucos Campos de Pesquisa da Embrapa que tem trabalhos sobre consórcios agroflorestais, tecnologias adaptadas aos ecossistemas das florestas tropicais e que serve de base de apoio para uma importante pesquisa sobre a sustentabilidade agrícola familiar no bioma Amazônia. De um modo geral, outros trabalhos desenvolvidos nos Campos de Pesquisas na Amazônia estão atrelados ao modelo da simplificação dos sistemas de produção, reproduzidos em outros locais do país. A simplificação na agricultura amazônica (desmatada, mecanizada, e com forte uso de insumos externos, ou seja, uma agricultura de alto carbono) vai de encontro ao paradigma atual da promoção da Agricultura de Baixo Carbono – ABC e da Integração Lavoura Pecuária e Floresta (ILPF), preconizadas pelo próprio Ministério da Agricultura e da Embrapa. Diferentemente da agricultura simplificada, já vem ocorrendo em Machadinho d’Oeste um tipo de agricultura de baixo carbono, ou seja, com baixo uso de insumos, com plantio de café e criação de animais no entorno das reservas em blocos, além de cacau, guaraná, pupunha, entre outros em sistemas agroflorestais.

A estratégia científico-agronômica que sustenta o atual modelo de produção agropecuária simplificada parte da premissa de que as terras devem estar “nuas” de vegetação natural antes de iniciar o plantio dos cultivos econômicos ou a introdução das pastagens e da pecuária. A simplificação dos agroecossistemas faz parte da lógica dos sistemas de produção agrícola convencionais, onde a aplicação deste modelo leva, obviamente, a uma brutal redução da biodiversidade, o que tem resultado na perda de espécies nativas, eliminação de fauna e flora microbiana, além do risco de extinção de muitas plantas e de animais silvestres. Cabe salientar que a aposta num modelo de monocultivos tem sido responsável pela perda de biodiversidade em praticamente todos os biomas que sofreram ação antrópica.

O futuro da agricultura em Machadinho e da Estação Experimental dependerá de estratégias econômicas, consolidação legislativa e políticas públicas capazes de dar um rumo novo ao alterado processo de coevolução do homem com o meio ambiente. Um rumo diferente daquele que é a resultante do modelo agrícola convencional e suas “verdades monoculturais”, à medida que seja transformado o atual modelo da agricultura com a utilização de estratégias de desenvolvimento rural sustentável, a partir do processo de transição que permita a adoção dos princípios de Agroecologia coadunado a modalidades de comercialização certificada. Essa seria uma maneira de materializar o ideal de sustentabilidade presente nos discursos institucionais e políticos na consecução das estratégias e das políticas desenvolvimentistas em práticas ambientalmente amigáveis, economicamente viáveis e socialmente justas.

Situação atual do trabalho de pesquisa em Machadinho d’Oeste

Atualmente o trabalho pode ser dividido em dois momentos. O primeiro é o de articulação, fortalecimento e institucionalização de uma rede de parceiros entre instituições governamentais e não governamentais associações e cooperativas de produtores locais, a fim de dar continuidade à pesquisa espaço-temporal de longo prazo sobre a sustentabilidade dos agroecossistemas locais. É preciso fortalecer a parceria da Embrapa Monitoramento por Satélite com a Embrapa Rondônia, principalmente com a Estação Experimental da Embrapa em Machadinho d’Oeste-RO, além de consolidar uma parceria com a Unicamp, por intermédio do Instituto de Economia. Existem também contatos com o Grupo de Agroecologia da Unicamp, com a Faculdade de Engenharia Agrícola da Unicamp e com a Cooperativa Agroindustrial de Machadinho d’Oeste (Comamo). Outras parcerias incluem as Associações de Produtores da Agricultura Familiar de Machadinho d’Oeste, a Emater local, a Agência de Defesa Agrosilvopastoril do Estado de Rondônia – Idaron, a Ceplac local, o Instituto de Pesquisas Ecológicas – Ipê que tem experiência em trabalhos parecidos com os desenvolvidos em Machadinho d’Oeste.

O segundo momento relaciona-se com a elaboração, em futuro próximo, de um novo projeto para ser submetido a vários editais ainda este ano, com o objetivo de dar continuidade a esse estudo de longo prazo.

O que é esperado pelo modelo de agricultura implantado em Machadinho d’Oeste e pesquisado pela Estação Experimental da Embrapa local

Para saber se é vantajosa a integração da agricultura com florestas plantadas em harmonia com florestas nativas é preciso valorar os sistemas de produção. Neste caso, a valoração do ponto de vista econômico requer uma métrica relativamente fácil, basta monetizar as rendas oriundas dos sistemas de cultivos e criações, tanto para venda como para o consumo familiar, e dos animais de criação ao longo do tempo. Do ponto de vista ecológico, no entanto, a métrica monetizada é bem mais complexa. São necessários estudos de longo prazo e monitoramento local, junto aos produtores rurais e estações experimentais controladas, por intermédio de estudos que usem geotecnologias, como, por exemplo, monitoramento por sensoriamento remoto de indicadores e variáveis chaves na análise da sustentabilidade ou manutenção dos sistemas de produção e sua forma de capitalização ao longo tempo. Ou seja, a métrica é a importância relativa da manutenção do agroecossistema em longo prazo, estudando suas complexidades, funções ecossistêmicas e resiliência, por intermédio da geometria da paisagem (como no caso de Machadinho, com as reservas florestais em blocos). O mais importante é a manutenção da agrobiodiversidade em harmonia com a floresta e fauna local. Espera-se a existência de uma paisagem com uma floresta resiliente, a qual precisa estar associada a uma agricultura também resiliente. Espera-se uma agricultura que adote práticas correspondentes, ou seja, uma agricultura que não agrida a floresta, uma agricultura de baixo carbono, com baixo uso de insumos. Esta será a agricultura do futuro, que deverá estar em estado de homeostase ambiental.

Uma nova etapa de pesquisa, depois de 22 anos de estudos em Machadinho d’Oeste, tem que ser preconizada que é a pesquisa-ação, uma abordagem que propõe não só a pesquisa, mas a realização de mudanças favoráveis ao contexto estudado, assim como visa ao envolvimento, à participação e à colaboração das pessoas que fazem parte dele. Se o pesquisador decidir trabalhar com pesquisa-ação, certamente deverá unir pesquisa e ação em busca de uma transformação prática.

Nesta nova etapa da pesquisa a Estação Experimental da Embrapa em Machadinho d’Oeste será de fundamental importância. A pesquisa focará com mais detalhe a melhoria do monitoramento, via sensoriamento remoto, de alguns indicadores a respeito da qualidade da água, solo e vegetação, bem como a identificação e valoração dos principais serviços ecossistêmicos que possam estar beneficiando não somente o café, principalmente aquele plantado em sistemas agroflorestais, mas também outros sistemas de cultivos. Dentre eles destacam-se o cacau, os sistemas silvipastoris de um modo geral e os consórcios de vários cultivos anuais e semiperenes, como é o caso dos plantios tradicionais em Machadinho d’Oeste – RO.

Mas, para que isto possa ser realizado, será necessária a instalação de sensores no campo da Estação Experimental de Machadinho d’Oeste, que farão as medições das variáveis associadas ao desenvolvimento dos diversos sistemas de produção pesquisados. Em seguida, através da rede sem fio, os dados serão enviados, com freqüência ainda a ser determinada, para uma pequena estação intermediária, instalada na própria Estação Experimental ou nas proximidades. Esta, por sua vez, transmitirá os dados para um banco instalado em local a ser determinado, que se encarregará, com o suporte das ferramentas computacionais, de promover o cruzamento, integração e interpretação das informações, que serão posteriormente repassadas aos pesquisadores envolvidos, técnicos locais e produtores.

Este tipo de ação facilitará a coleta e disponibilização das informações em campo, tanto na Estação Experimental em Machadinho d’Oeste como em algumas propriedades previamente escolhidas como produtores de referência para pesquisa. Ou seja, é prevista a interligação entre as propriedades rurais e destas à Estação Experimental. Atualmente esse contato é bastante complicado, em razão das dificuldades técnicas e do alto custo para a implantação de redes de comunicação em áreas rurais brasileiras. Esta solução proposta prevê o acesso à internet, outra necessidade dos agricultores. O uso dessa ferramenta deverá beneficiar outros grupos além dos produtores e pesquisadores. Em parcerias com a prefeitura, a Emater Local e outras instituições locais, pode-se implementar ou reforçar a inclusão digital, principalmente para grupos de jovens locais.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

BULHÕES, I. da S. Projeto Café Floresta. Trabalho sobre Responsabilidade Socioambiental e Desenvolvimento Sustentável apresentado à UNOPAR – Universidade Norte do Paraná, como atividade disciplinar Curso Superiorde Tecnologia em Gestão Ambiental. 2008.

GAMA, M. de M. B.: Análise técnica e econômica de sistemas agroflorestais em Machadinho d’Oeste, Rondônia. Tese de doutorado, Universidade Federal de Viçosa, novembro de 2003, 112p.

MANGABEIRA, J. A. de C. GREGO, C. R.; MIRANDA, E. E. de; ROMEIRO, A. R.; BENTO, M. F. L.: Análise comparativa entre café produzido a pleno sol e no sistema agroflorestal em Machadinho d’Oeste-RO. Anais VII Congresso Brasileiro de Sistemas Agroflorestais, Brasília, 2009.

MANGABEIRA, J. A. de C. Serviços ecossistêmicos e trajetória de capitalização agrícola: o caso de Machadinho d’Oeste – RO. Tese doutorado. Instituto de Economia/Unicamp, Campinas, 2010, 162p., il.

SULEIMAN K. Embrapa Rondônia mostra vantagens do café arborizado em Machadinho d’Oeste. http://www.embrapa.br/imprensa/noticias/2011/maio/4a-semana/dia-de-campo-mostra-vantagens-do-cafe-arborizado – 2011).

1 Doutor em Desenvolvimento Econômico, Espaço e Meio Ambiente e Pesquisador A da Embrapa Monitoramento por Satélite.

EcoDebate, 29/06/2011

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