Tecnologias de baixo impacto ambiental para produção de calçados, artigo de Roberto Naime
[EcoDebate] A indústria coureiro-calçadista sempre foi muito acusada pela geração de elevados impactos ambientais na sua cadeia produtiva. E esta constatação inconveniente e verdadeira tem sido um indutor da procura pelo desenvolvimento de metodologias e materiais de baixo impacto ambiental.
Atualmente são utilizados couros processados com curtentes livres de metais. Couros curtidos com taninos vegetais e sintéticos, além de outros curtentes, como o glutaraldeído, são opções já em vigor para a produção de calçados masculinos, femininos e infantis, além da fabricação de calçados esportivos.
Estes processos, com menor impacto ambiental, também colaboram com a produção de produtos com menor tempo de decomposição quando armazenados em aterros adequados e com menor contaminação dos solos.
Também são utilizados tecidos fabricados com fibras naturais, que apesar do preço superior, tem diversas vantagens em relação aos tecidos fabricados com fibras artificiais e sintéticas. Fibras naturais tem melhores propriedades microbiológicas e o seu aspecto é mais agradável que outras fibras têxteis. Evoluções introduzidas na cultura do algodão, que acima de tudo é de fonte renovável, também tem contribuído para a produção de fibras têxteis com menor impacto ambiental. Exemplo disto é o algodão orgânico (sem a utilização de agrotóxicos e fertizantes químicas) e do algodão colorido, que dispensa as operações de tingimento e alvejamento, responsáveis por grande geração de efluentes líquidos.
Solados de Borracha Natural (NR) tiveram seu ciclo renovado com constantes investimentos por diversas empresas. A matéria-prima em si permite a fabricação de solados mais aderantes, mais duráveis (com menor desgaste) e portanto com menor utilização de matérias-primas para a sua fabricação. A sua decomposição também é mais rápida e com menor agressão ao meio ambiente após o seu descarte.
Solados de couro bovino, curtidos e recurtidos ao tanino vegetal, ainda representam status nos calçados em que estão inseridos, tanto masculinos como femininos. O seu curtimento, livre de cromo e outros metais, permitem a produção de solados (além de saltos, tacões, soletas, viras, fachetes, entre outros) com um acabamento diferenciado, embora utilizem maior mão-de-obra nas diversas fases do acabamento e produção. O seu descarte também gera menor impacto ao meio ambiente.
Também são utilizados couros reconstituído (recuperado de couro) para a fabricação de solas apresenta diversos altos e baixos na indústria calçadista.
O consumo de “colas” e adesivos na indústria de calçados continua em alta, apesar dos avanços tecnológicos nos equipamentos de produção de calçados. Tem ocorrido maciça troca dos adesivos em meio solvente (as chamadas colas sintéticas) por adesivos em meio aquoso (base d`água).
Os adesivos em meio aquoso estão sendo cada vez mais utilizados na fabricação de calçados, principalmente os calçados para exportação e os esportivos, muito em função dos importadores, principalmente europeus, que estão cada vez mais preocupados com os danos causados ao meio ambiente pelos calçados descartados. Inicialmente os maiores empecilhos para a utilização destes adesivos eram o preço, a aplicação, o tempo de secagem e a instabilidade em baixas temperaturas, o que dificultava o seu uso e mexia nas linhas de produção, aumentando-as consideravelmente. Porém, com grande investimentos em tecnologias nos equipamentos e nos adesivos, hoje este problema está superado. As colagens estão cada vez mais seguras e as linhas de produção ocupam os mesmos espaços e os mesmos equipamentos que os adesivos em meio solvente, que estão perdendo o seu espaço.
Viras e fachetes já utilizam a bastante tempo componentes com matérias-primas de couro reconstituído. Além de terem preços mais acessíveis apresentam uma maior homogeneidade no acabamento. Quando utilizados em viras apresentam como limitação a utilização em calçados com bicos muito finos, pois além de dificultarem a fixação, racham com facilidade. Já para fachetes é necessário a colocação de outro material, o não-tecido, para destacar os frisos característicos dos mesmos.
Espumas são utilizadas em diversas partes dos calçados. Em palmilhas internas, além de proporcionarem uma sensação de maciez e conforto, também tem a função de absorver o impacto no caminhar. Importantíssimo em calçados femininos.
Couraças e contrafortes já há bastante tempo utilizam materiais com menor agressão ao meio ambiente para a sua composição. São adesivos do tipo “hot melt” (cola quente) sem solvente e atualmente também sem suporte, o que dificultava a sua reciclagem. Também a substituição das matérias-primas tradicionais por materiais de fonte renovável vieram trazer um novo alento a estes materiais.
Nada se compara com os processos de produção fechados, onde o fornecedor, além de utilizar as tecnologias descritas acima, se responsabiliza por todo o processo de produção e preparação destes componentes. Desta forma, a geração de resíduos praticamente não existe, pois possibilita todo o reaproveitamento dos mesmos.
Cadarços, gorgurões e atacadores, tradiconalmente fabricados com fibras sintéticas e naturais também podem ser fabricados com matérias-primas com menor impacto ambiental, desde que os mesmos respeitem as mesmas condições utilizadas nos tecidos. Utilizar algodão orgânico, rami, juta, cânhamo, entre outras fibras naturais, complementam bem o conceito de produção destes artigos.
As palmilhas de montagem também podem ser fabricados com matérias-primas de fontes renováveis e de baixo impacto ambiental. As mesmas, tão essenciais na construção dos calçados, ficam escondidas no meio dos calçados. Porém as mesmas são tão essenciais quanto os demais componentes dos calçados. As matérias-primas mais utilizadas são a celulose, o recuperado de couro e também os não-tecidos com fibras naturais (mais recomendadas para atender a estes conceitos).
Fivelas, ilhoses, rebites e outros enfeites são encontrados normalmente em metais e ligas metálicas diversas além de diferentes materiais plásticos. Estes materiais, quando em metais ou ligas metálicas, recebem uma grande quantidade de acabamentos de proteção e visuais, o que pode causar sérios problemas no seu descarte. Algumas empresas optam por utilizarem materiais que não necessitam de acabamentos adicionais ou ainda livres de alguns acabamentos, como o niquelado, tão proibido em calçados para exportação, principalmente para a Europa. Outra possibilidade é a utilização de enfeites produzidos com materiais de fonte renovável, como sementes e madeiras obtidas em florestas com manejo correto. Nestes casos os acabamentos também podem ser em meio aquoso, sem a utilização de solventes, o que facilita a sua biodegradabilidade sem afetar o meio ambiente.
Papéis reciclados, fora para as tradicionais “buchas” de enchimento, ainda são pouco utilizados para o empacotamento de calçados, embora não causem danos aos mesmos. Alguns poucos fabricantes até utilizam este recurso para diminuir o consumo de matérias-primas novas. O que mais preocupa é a quantidade de papeis e plásticos utilizados para embalar um par de calçados que pode ser um desperdício exagerado.
As caixas de embalagem já utilizam matérias-primas recicladas há bastante tempo. O que mais preocupa é a quantidade de papéis que são fixados em suas superfícies, além das estampas, grampos, fitas de arquear e fitas plásticas coloridas, entre outros.
Dr. Roberto Naime, colunista do Ecodebate, é Doutor em Geologia Ambiental. Integrante do corpo Docente do Mestrado e Doutorado em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale.
EcoDebate, 20/06/2011
Sobre o mesmo tema sugerimos que leiam, ainda, o artigo Sapatos biodegradáveis, artigo de Roberto Naime
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