Projeto de lei de reforma do Código Florestal trará perdas econômicas para a agricultura brasileira
A proposta de reforma do Código Florestal encaminhada ao Senado implica em imensas perdas econômicas para o setor agropecuário no Brasil, de acordo com avaliação do superintendente de conservação do WWF-Brasil, Carlos Alberto de Mattos Scaramuzza. De acordo com o cientista, estas perdas estão relacionadas a pelo menos três pontos: acesso a mercados, acesso a pagamentos por serviços ambientais e gestão de recursos naturais, base da agricultura. Por Warner Bento Filho, WWF-Brasil.
“A tendência dos mercados mundiais é de ampliação de espaço para produtos sustentáveis, ao mesmo tempo em que os consumidores não querem adquirir nada que signifique agressão à natureza”, diz Scaramuzza.
No cenário internacional, o Brasil tem sido visto nos últimos anos como país que protege a natureza. Esta imagem se deve aos esforços no sentido de frear o desmatamento da Amazônia e aos compromissos assumidos pelo País perante a Organização das Nações Unidas em relação à redução das emissões de carbono.
O Brasil se comprometeu junto à ONU em cortar cerca de um bilhão de toneladas de suas emissões de gases de efeito estufa até 2020. A maior parte das emissões nacionais vem do desmatamento. Estudo do Observatório do Clima demonstra que podem ser lançadas na atmosfera mais de 25 bilhões de toneladas de gases do efeito estufa com os desmatamentos que serão provocados pelas alterações propostas no projeto. O montante é mais de 13 vezes superior às emissões do Brasil em 2007.
Caso o Senado aprove o projeto de lei proposto pelo deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), a produção brasileira corre o risco de ser associada a desmatamentos e a agressões à natureza. Alguns dos mais influentes veículos de comunicação do mundo repercutiram negativamente a votação do relatório na Câmara. O britânico The Guardian anunciou que o Brasil “afrouxa restrições sobre o uso da terra na Amazônia”, mencionando a produção de alimentos das áreas de preservação permanente (APPs). O portal da BBC, de Londres, registrou que o Brasil “enfraquece regras de conservação da Floresta Amazônica”. O espanhol El País foi mais contundente: “Brasil concede impunidade aos desmatadores da Amazônia”. E a agência France Presse distribuiu notícia com referência futebolística: “Interesses agrícolas do Brasil marcam 1 a 0 contra proteção de florestas”.
Serviços ambientais
A perda de mercados é apenas uma parte dos prejuízos que a lei pode trazer. “O projeto ignora a possibilidade de remuneração para prestação de serviços ambientais, fechando a porta para uma interessante oportunidade de diversificação de renda, ao consolidar o uso agrícola em áreas de preservação permanente com baixo potencial agrícola. A restauração florestal nessas áreas, além de proteger os recursos naturais, abre a possibilidade de gerar novas receitas relacionadas a prestação de serviços ambientais para o clima e para o abastecimento de água para as cidades e para o campo”, diz Scaramuzza.
Há uma série de exemplos bem sucedidos no país de pagamento por serviços ambientais. Entre eles, o Programa Produtor de Água, gerido pela Agência Nacional de Águas (ANA). Este programa remunera os proprietários que mantém vegetação nativa além das áreas de reserva legal e de preservação permanente e que adotam boas práticas agrícolas visando reduzir erosões e o assoreamento de rios.
De acordo com informações da Embrapa, o país perde por erosão mais de 600 milhões de toneladas de solos férteis por ano. O proprietário que perde solo por erosão precisa aplicar mais adubos químicos para compensar a perda de nutrientes. Mas os prejuízos também são repassados à sociedade, porque o solo que escorre com a chuva vai parar nos leitos dos rios, contaminando as águas com venenos e adubos químicos, prejudicando o abastecimento de água potável e a produção de energia elétrica – além de contribuir para as enchentes.
Finalmente, de acordo com Scaramuzza, a proposta de reforma do Código Florestal traz outra grande perda ao comprometer a conservação do solo, a qualidade e a quantidade de água e a contribuição da biodiversidade para a agricultura – por exemplo, na polinização e no controle de insetos indesejáveis.
Por estas e outras razões, a ANA elaborou nota técnica (nº 045/2010-SIP-ANA) em que se posiciona contrariamente à redução da faixa de área de proteção às margens dos rios, que atualmente é de no mínimo 30 metros e que, pela proposta de Aldo Rebelo, deixa de ser obrigatória.
Na nota, a ANA argumenta que a manutenção desta faixa de vegetação é “fundamental para a preservação dos recursos hídricos, em especial para as condições quali-quantitativa dos mananciais de abastecimento. Assim, é possível preservar as condições futuras para o desenvolvimento do país e proteger o interesse geral da sociedade”.
Oportunidade perdida
“As perdas em questão fazem da aprovação da proposta de reforma do Código Florestal uma imensa oportunidade perdida para assegurar uma produção brasileira em bases mais sustentáveis. Esse seria um diferencial decisivo para a aceitação de nossos produtos no mercado internacional. Mas, se nossos produtos forem associados ao aumento do desmatamento e ao aquecimento global, perderemos acesso a mercados”, prevê o superintendente do WWF-Brasil.
“A Câmara dos Deputados votou olhando para o retrovisor, olhando para o passado e não para o futuro. Deveríamos olhar para o promissor mercado verde, para a economia de baixo carbono e para as imensas possibilidades que se abrem no sentido da sustentabilidade”, avalia Scaramuzza.
De acordo com o ambientalista, agora cabe à presidente Dilma Rousseff e ao governo federal convencer os parlamentares de sua base aliada no Senado a fazerem uma profunda revisão do texto. Na avaliação do técnico, é necessário eliminar todas as armadilhas para aprovar uma reforma que aponte para uma agricultura sustentável, com ganhos para agricultores, consumidores e a sociedade em geral.
EcoDebate, 15/06/2011
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