Na contramão: Brasil deve manter programa que dobra fatia da energia nuclear na geração de eletricidade
No momento em que vários países decidem rever seus programas nucleares – segunda-feira, a Alemanha anunciou que vai desativar suas usinas até 2022 -, o Brasil toma a direção contrária e decide usar benefícios fiscais para estimular a ampliação de seu programa atômico.
Depois do acidente em Fukushima, no Japão, em março último, países como Suíça, Bélgica e China cancelaram ou suspenderam novas licenças para a construção de usinas. Enquanto isso, o Brasil está construindo Angra 3 e a Câmara dos Deputados aprovou, semana passada, medida provisória que concede incentivos fiscais para compra de equipamentos a serem usados na geração nuclear. Reportagem de Danielle Nogueira, Eliane Oliveira e Mônica Tavares em O Globo.
A MP 517 ainda será votada no Senado. Além disso, o governo Dilma Rousseff deve manter a estratégia de mais quatro usinas até 2030, como previsto no Plano Nacional de Energia (PNE) 2030, hoje em revisão. Ao lado de Angra 1, 2 e 3, as novas unidades dobrariam a fatia da fonte nuclear na geração de eletricidade, para 5%.
O avanço da participação nuclear na matriz elétrica, bem como a expansão do gás natural (de 2,6% em 2009 para 8%), se daria ao custo da retração da fatia da hidreletricidade, fonte limpa e barata (de 85% para 78%). A energia vinda da biomassa e dos ventos também sofreriam uma leve redução. Juntas, elas respondiam por 5,7% em 2009 e cairão a 5% em 2030. É justamente nestas duas fontes que o Brasil deveria investir para conter o avanço nuclear, diz José Goldemberg, do Instituto de Eletrotécnica e Energia da USP.
– A energia da biomassa e dos ventos deve ser mais bem aproveitada. Além disso, programas de eficiência energética devem ser implementados. Após o acidente da usina nuclear japonesa de Fukushima, os países discutem se mantêm ou não seus programas nucleares. Não é o momento de expandi-lo.
Rejeitos ainda não têm destino final
O diretor da Coppe/UFRJ e ex-presidente da Eletronuclear, Luiz Pinguelli Rosa, engrossa o coro dos contrários à expansão do programa nuclear brasileiro. Para ele, não é apenas uma questão de segurança, mas também de preço. Nos seus cálculos, o custo da energia hidráulica está em cerca de R$ 78 o Megawatt-hora (Mw/h), considerando os projetos de Belo Monte (PA) e o complexo do Rio Madeira (RO). A tarifa da energia eólica e da gerada a partir do gás natural está em torno de R$ 150 o Mw/h e a da energia nuclear giraria em torno de R$ 250 o Mw/h, considerando o investimento em Angra 3, de R$ 9,9 bilhões.
– A energia nuclear não emite gases de efeito estufa, mas é cara no Brasil. Além disso, após Fukushima, outras diretrizes de segurança podem ser tomadas – diz Pinguelli.
A subsecretária de Economia Verde do Estado do Rio e vice-presidente do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), Suzana Kahn, lembra a incerteza quanto ao destino dos rejeitos radioativos.
– Em estudos recentes, o IPCC indica que as fontes renováveis dão conta do aumento da demanda mundial de energia até 2050. Não concordo que a nuclear seja uma opção para já. E tem uma questão que não está equacionada: o lixo radioativo.
Não há no mundo depósitos definitivos para abrigar os resíduos de alta radioatividade.
EcoDebate, 02/06/2011
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