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Para que mais uma morte de pobre não vire estatística ou vaia de ruralista, por Eliane Brum

[Época Online] A semana passada foi uma vergonha para este país. No mesmo dia em que a Câmara dos Deputados aprovou um Código Florestal que beneficia quem vem acabando com o meio ambiente e comprometendo o futuro de todos os brasileiros – e também do planeta –, foram assassinados dois líderes extrativistas que defendiam o manejo sustentável da floresta. José Cláudio Ribeiro da Silva e Maria do Espírito Santo Silva foram mortos a tiros na terça-feira, 24/5, em Nova Ipixuna, no sudeste do Pará. Depois, José Cláudio teve parte da orelha decepada. Quando foi anunciado na Câmara o duplo assassinato, o que fez a bancada ruralista? Vaiou. Dois brasileiros foram executados – e alguns de nossos representantes vaiaram.

Como Chico Mendes e Dorothy Stang, o casal também avisava há muito, como mostra este vídeo, que estava “com uma bala na cabeça”. E, como parece sempre acontecer nesse país, a profecia se realizou. Mas, diferente de Chico Mendes e de Dorothy Stang, o espaço dado à sua morte na imprensa foi bem menor. Possivelmente porque a luta de Chico Mendes foi noticiada primeiro pelo New York Times – e Dorothy Stang tinha família americana. Assim como os outros 18 executados no ano passado no Pará por conflitos agrários, como mostra a matéria Eles morreram pela floresta, José Cláudio e Maria eram brasileiros pobres que lutavam pelo que nós todos deveríamos estar lutando. E morreram porque não foram escutados. Também por nós.

Foi uma semana feliz para os assassinos do Brasil – os assassinos de gente, e os de futuro que circulam pelo Congresso. Prestem atenção na votação do novo Código Florestal no Senado, anotem o nome de quem faz o que, porque é uma ideia de país que está em jogo. Não custa lembrar que todos aqueles homens e mulheres que estão decidindo o nosso futuro – boa parte deles mais preocupado com o próprio presente – foram escolhidos e legitimados pelo nosso voto, o que nos coloca na condição de cúmplices da ruína ética a que assistimos no Congresso mandato após mandato. Na sexta-feira, 27/5, Adelino Ramos, outra liderança que combatia o desmatamento da floresta, foi assassinado quando vendia verduras. Desta vez, em Rondônia. Coincidência?

Não é com parlamentares como estes – capazes de queimar a Amazônia em benefício próprio e vaiar quando é anunciado o assassinato de brasileiros que defendiam a floresta – que vamos a algum lugar. Nem com cidadãos que testemunham a indignidade e seguem calados. Essa classe de políticos só tem a ousadia de ser tão vil em suas barganhas e em seus atos porque sabe que sempre pode contar com a nossa omissão.

Não há nenhuma discussão, hoje, no país, mais importante que a do Código Florestal. Seu desfecho determinará muito do que seremos – ou não seremos. Quem sabe ainda dê tempo para mais gente estranhar um Código Florestal que anistia desmatadores ser aprovado pela Câmara em pleno ano de 2011, quando o desafio urgente é – ou deveria ser – o desenvolvimento sustentável do país. E mais gente comece a desconfiar que assassinatos de defensores da Amazônia não combinam com as pretensões do Brasil de ocupar um lugar de destaque no cenário mundial.

Jornalista, escritora e documentarista. Ganhou mais de 40 prêmios nacionais e internacionais de reportagem. É autora de Coluna Prestes – O Avesso da Lenda (Artes e Ofícios), A Vida Que Ninguém Vê (Arquipélago Editorial, Prêmio Jabuti 2007) e O Olho da Rua (Globo).
E-mail: elianebrum@uol.com.br
Twitter: @brumelianebrum

Artigo originalmente publicado na coluna de Eliane Brun, na revista Época Online

EcoDebate, 01/06/2011

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One thought on “Para que mais uma morte de pobre não vire estatística ou vaia de ruralista, por Eliane Brum

  • ARTHUR DE PAULA

    Este é o Brasil e esta é uma herança maldita desde a libertação dos escravos e José Bonifacio.Até hoje se discute e não se raliza a reforma agrária tão necessaria ao Brasil e aos brasileiros.
    Nelson Ribeiro,quando Ministro da Reforma |Agraria no Governo Sarney ,em pouco tempo montou e divulgou um longo dossiê relacionando todos os assassinatos,suas vitimas e seus autores até aquela data.Um compendio grosso.Nenhum pistoleiro identificado,mandante foi preso,processado e ou punido.
    São ativistas,sindicalistas,padres,freiras Bispos,advogados que se ainda não foram abatidos pelo braço selvagem e bandido da grilagem e do latifundio, ficuraram e figuram abertamente em listas de morte anunciada e até com os preços,valores a serem pagos pelas suas execussões.
    Ainda recentemente no Pará circulou pela internete a “noticia” do “assassinato” em um bar e em companhia da esposa e da filha, do advogado e poeta PAULO FONTELLES FILHO, cujo pai PAULO FONTELLES, advogado dos posseiros,ex-deputado estadual no Pará e suplente à Constituinte foi selvagemente assassinado a tiros de pistoleiros num pôsto na saída de Belem quando abastecia seu veículo.Esta poderá ser mais uma morte ANUNCIADA e a ficar impune.
    Ontem a Ministra dos Direitos Humanos,foi categórica em assegurar ser impossivel o Estado Brasileiro proteger tantas vidas ameaçadas.Então se é assim,é porque o Estado brasileiro está falido e portanto deve sersepeultado e no seu lugar o povo fazer a implantação de um novo modelo de Estado, que faça a reforma agrária,demarque e proteja as terras indigenas,depreservação,assentamentos,reflorestamentos etc e ponha forças militares e policiais no encalso dos grileiros,”gatos”,pistoleiros,gente da UDR etc.
    Enquanto este novo e radioso estado não vem, que todo apoio logistico,politico,ideologico etc seja dado à autodefesa dos que vivem no campo,nas florestas etc.
    Só assim estagnaremos as estatisticas de mortesde homens,mulheres,crianças,de qualquer credo e ou confissão religiosa,de qualquer movimento que luta pela reforma agraria antilatifundiaria tão necessária ao Brasil.

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