Sistemas Agroflorestais: Florestas e êxodo rural, artigo de Orlando Monteiro Sbrocco
Imagem: Sistemas Agroflorestais. Fonte: CTeMe
[EcoDebate] Antigamente os filhos de famílias ilustres, chamadas de quatrocentão – eu, por conhecê-las bem, troco o “ cen ” por outras três letras, com bem outro sentido, se me entendem – navegavam sobranceiros pela vida, eis que não havia habitual incompetência e estroinice que os privassem de emprego, lastreados que estavam no sobrenome de peso.
Assim, fracassassem como escolhessem, sempre havia uma colocação, como se dizia, ao seu dispor. Era a força da tradição.
Daí eu dizer que a tradição é tudo o que resta depois que se atingiu o píncaro do fracasso.
Penso que o raciocínio é válido para a vida no seu todo.
O progresso, o porvir, é feito de mudanças, não de estagnação, havendo sempre de nos guiarmos pela parêmia de Ulisses Guimarães : “ caminhemos para o sol, que é luz, e não para a noite, que são trevas ”.
Neste sentido, a crise ambiental nas suas múltiplas facetas reclama soluções novas, audaciosas e nem por isto cercadas de sombra.
Tal o caso dos SAFs, Sistemas Agroflorestais, para mitigar a questão do êxodo rural, de graves conseqüências sociais, econômicas e ambientais, e que tanto atormenta a administração pública, mormente a municipal.
Desestimulados das políticas públicas para a agricultura; órfãos de sistemas de produção, financiamento e distribuição, que privilegiam os grandes latifúndios, milhares de agricultores abandonam suas propriedades, compondo um quadro a um só tempo de desertos e legiões de homens, duplamente sinistro, no município banido e no centro urbano abraçado, respectivamente.
Contudo, as condições peculiares do Brasil – clima tropical, água em abundância, terras relativamente baratas e, sobretudo, décadas de desenvolvimento de tecnologia no setor – o colocam em posição de destaque no segmento florestal.
O potencial do país é imenso, o que permite antever um futuro de liderança na área.
O negócio florestal tem o condão de ser de médio/longo prazo, traduzindo-se em atividade de efetiva geração de trabalho e renda e, talvez o mais importante, de longa cadeia produtiva.
Não precisamos ir longe : basta imaginar que quase tudo o que se produz é embalado em papelão, oriundo do pinus e eucalipto.
Decorre daí outro ponto : se tudo o que se plantar for direcionado a embalagem, onde a madeira para móveis? onde para a construção civil?
Mercado, portanto, imenso, sobretudo considerando a emergência de economias como as da China e Índia.
Acresce que ainda temos milhões de hectares aptos ao plantio e então se descortina o grande leque de oportunidades do segmento.
Os SAFs, neste contexto, se colocam como alternativa para sedimentar a posição de destaque do país, ampliá-la e, de resto, combater o êxodo rural.
Com efeito, o cultivo de floresta, sobretudo voltado para madeiras nobres, de alto valor, é extremamente estimulante para o pequeno proprietário, vez que acena com a perspectiva de uma renda apta a garantir-lhe o futuro, bem assim o de sua prole.
A criação de pólos moveleiros de pequeno e/ou médio porte se prestaria de impulso adicional, com geração somada de trabalho e renda, focando no atendimento de necessidades regionais e até mesmo de exportação.
Espécies avaliadas em US$ 1,5 mil, US$ 2 mil por m3 e com ciclo de 15 anos são altamente motivadoras para cultivo.
Por outro turno, remanesce a questão da sobrevivência, do tempo demandado para desenvolvimento da cultura.
Aí, sim, entra o plantio consorciado com culturas de ciclo rápido, anuais, que fornecem ao agricultor a renda de sua subsistência.
Estas, devidamente adequadas ao clima, situação mercadológica da região, etc., servem de alicerce a atividade silvícola.
O homem varia de região, mas não de conteúdo.
Que homem não prescreve para seus filhos um futuro melhor, uma lida menos doída, uma vida mais tranqüila?
Conquanto muitos agricultores venham cultivando florestas em paralelo a atividade agrícola, principal, com vistas a um futuro melhor, inda são poucos no universo do país.
A atividade deveria ser mais divulgada, estimulada, apoiada por instituições de fomento e capacitação, como Embrapa, Sebrae e congêneres.
A fixação do homem no campo por este instrumento tem a feliz combinação dos dois pés no chão, fixados na cultura de giro rápido, que lhe sustém, e dos olhos postos no porvir de tempos melhores, justo merecimento de quem tanto serve o país.
Ademais, tudo fundamentado no trabalho, porque quatrob…ops, quatrocentões não somos, vivendo de nosso trabalho, não é mesmo?
Orlando Monteiro Sbrocco é historiador e advogado, empresário na área ambiental, tendo um projeto para o plantio de 1 milhão de árvores.
EcoDebate, 19/05/2011
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O grande problema, meu caro articulista, é que a floresta no Brasil virou motivo de amor e ódio. Amor dos ambientalistas que gostariam de ver o país todo coberto de florestas; ódio dos produtores rurais, e é engano pensar que só dos latifundiários, mas muito mais dos pequenos, que se sentem pressionados a comprar moirões de eucalipto para fazer cerca, mesmo tendo possibilidades de exploração racional de recursos florestais de suas propriedades. A mata nativa virou um santuário, que deve ser guardada para possíveis usos extrativistas, mas a vida do produtor depende de ações no dia a dia. Sou engenheiro florestal e aprendi, com professores europeus, que a mata nativa pode ser manejada para extração sustentável de madeira. Tal conceito foi sendo abandonado, no Brasil, com a criação das APPs, sob o princípio da intocabilidade. Plantar floresta no Brasil, só com eucalipto. Plantar espécie nativa, para o pequeno produtor rural, nem pensar, pois vai ser dor de cabeça, na certa.