Mudanças climáticas e uma nova perspectiva de viver, entrevista com Larissa Rosa de Oliveira
Cada vez mais, o aquecimento global desloca as atenções para suas consequências e ajuda a elencar questionamentos sobre como a população pode proceder para salvar o futuro da vida.
A crise ecológica pode significar o fracasso da civilização assentada sobre a ideia do progresso infinito e linear, na concepção dominadora de poder, e sobre a crença do não esgotamento dos recursos naturais limitados e não renováveis.
Para debater questões importantes sobre a preservação do ambiente, a bióloga Larissa Rosa de Oliveira acredita na necessidade de uma mobilização concentrada, na qual cada indivíduo se sente responsável por alguma atitude e consegue conter seus atos de consumo.
“Somos incentivados hoje pela mídia a consumir mais”, afirma a pesquisadora. Na visão dela, as variações no clima contribuem também para o acréscimo de refugiados climáticos no país. “Hoje eles estão buscando outras fontes de renda, porque estão à mercê de mudanças climáticas mais intensas. Há grandes transformações nas atividades econômicas e êxodo da zona rural porque os trabalhadores não podem contar com a estabilidade climática”.
Professora da Unisinos, a bióloga Larissa Rosa de Oliveira tem mestrado em Biociências (Zoologia) pela PUCRS, doutorado em Ciências Biológicas pela USP e dois pós-doutorados. Ela irá participar do Ciclo de Filmes e Debates – Sociedade Sustentável no Cinema, através de um debate transdisciplinar e sistêmico.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Quais são as principais evidências de que as mudanças de clima já estão mudando a vida das pessoas?
Larissa Rosa de Oliveira – Se observarmos as catástrofes naturais, perceberemos a intensidade de chuvas e secas. É possível ver como o clima mudou. Até por meio do trabalho dos agricultores e da produção constatamos que há 30 anos não tínhamos tantas enchentes e períodos longos de seca. Há alguns anos os pesquisadores do Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos – CPTEC/Inpe monitoram as mudanças climáticas e as influências do El Niño. As evidências e as variações climáticas afetam localmente o Rio Grande do Sul, trazendo muitas consequências.
IHU On-Line – Qual é a relação da destruição da Amazônia com o aquecimento global?
Larissa Rosa de Oliveira – A Amazônia funciona também para resfriar a região onde está localizada, produzindo umidade, que também é deslocada para outros Estados, como o Rio Grande do Sul. Com o desmatamento, essa fonte natural de resfriamento, feita por meio da regulação da floresta, traz consequências. A seca é ampliada, e a chuva reduz, porque a Amazônia é nosso centro de circulação, gera umidade importante que é deslocada tamém para o sul do país.
IHU On-Line – Além disso, qual é a contribuição das queimadas e da pecuária nesse fenômeno?
Larissa Rosa de Oliveira – Para gerar zonas de pecuária são feitas as queimadas para retirar a mata. Essa atitude amplia o desmatamento, assim como há mudanças no sistema, porque as plantas e as árvores que geram a umidade necessária são retiradas de lá. Quando alguém retira árvores de uma zona de mata, retiram uma parcela importante de árvores que gerariam a transpiração e a umidade, que também seria deslocada para cá. Retirando o verde diminuímos a respiração das plantas e a umidade no Rio Grande do Sul e na Amazônia.
IHU On-Line – Os refugiados do clima já são uma realidade em nosso país?
Larissa Rosa de Oliveira – Sim, já é uma realidade do Brasil. Basta olharmos para as pessoas que deixam de fazer atividades tradicionais, relacionadas à agricultura. Hoje eles estão buscando outras fontes de renda, porque estão à mercê de mudanças climáticas mais intensas. Há grandes transformações nas atividades econômicas e enorme êxodo da zona rural porque os trabalhadores não podem contar com a estabilidade climática. Com as novas secas no Rio Grande do Sul, novas gerações saem do campo para buscar novas formas de renda na cidade.
IHU On-Line – Podem ser estabelecidas relações entre a mudança climática e o padrão de consumo incentivado e praticado em nossa sociedade?
Larissa Rosa de Oliveira – Com certeza, percebemos que quanto maior é a demanda e o consumo, maior é o extrativismo, e o debate sobre a questão de combustíveis fósseis. Somos incentivados hoje pela mídia a consumir mais. Mas será que precisamos trocar o celular, o carro e comprar bens menos duráveis? Essas estratégias de consumo obviamente tocam fundo no bolso e no ambiente, porque a maior parte das coisas é feitas de plástico, que é feito com derivados de combustíveis fósseis. Não percebemos que gastamos mais e exploramos mais.
IHU On-Line – Qual é a responsabilidade dos governos e da sociedade civil a respeito dessas alterações do clima?
Larissa Rosa de Oliveira – Na verdade, pensando em várias escalas, temos principalmente a questão da emissão do dióxido de carbono – CO2. Temos cada vez mais indústrias, e o governo precisa taxar esta emissão, mas a magnitude do problema é ampla. Precisamos começar a tomar atitudes em casa, mudar hábitos de consumo, usar racionalmente os bens não sustentáveis, como água e energia elétrica. Tudo depende da geração de energia elétrica e, infelizmente, ainda não temos energias mais limpas em grande escala de desenvolvimento, como a eólica ou a solar.
Além disso, a sociedade tem grande responsabilidade de mudar comportamentos, não é uma questão apenas do governo. Se todo mundo fizer um pouco, aumentaríamos o tempo desses recursos. É uma questão de mudança de paradigmas repensar valores e deixar de comprar bens descartáveis. Outros países já estão dando alguns exemplos, como o México, que está fazendo exigências à China. Os mexicanos querem importar mais bens mais duráveis, para evitar os bens frágeis.
(Ecodebate, 07/04/2011) Entrevista realizada por Anelise Zanoni e Greyce Vargas e publicada pelo IHU On-line, parceiro estratégico do EcoDebate na socialização da informação.
[IHU On-line é publicado pelo Instituto Humanitas Unisinos – IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.]
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