Direitos Humanos, Direitos da Terra e Direitos da Biodiversidade, artigo de José Eustáquio Diniz Alves
[EcoDebate] A Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, é um dos documentos mais importantes da humanidade. Esta Declaração tem uma importância histórica incomensurável e se constitui em uma fonte permanente de inspiração para a conquista de novas gerações de direitos. Vejamos alguns extratos da DUDH:
Artigo 1° – Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade.
Artigo 2° – Todos os seres humanos podem invocar os direitos e as liberdades proclamados na presente Declaração, sem distinção alguma, nomeadamente de raça, de cor, de sexo, de língua, de religião, de opinião política ou outra, de origem nacional ou social, de fortuna, de nascimento ou de qualquer outra situação.
Artigo 3° – Todo indivíduo tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.
Artigo 4° – Ninguém será mantido em escravatura ou em servidão; a escravatura e o trato dos escravos, sob todas as formas, são proibidos.
Artigo 5° – Ninguém será submetido a tortura nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes.
Artigo 6° – Todos os indivíduos têm direito ao reconhecimento, em todos os lugares, da sua personalidade jurídica.
Artigo 7° – Todos são iguais perante a lei e, sem distinção, têm direito a igual protecção.
Artigo 8° – Toda a pessoa direito a recurso efectivo para as jurisdições nacionais competentes contra os actos que violem os direitos fundamentais.
Artigo 9° – Ninguém pode ser arbitrariamente preso, detido ou exilado.
Artigo 13° -Toda a pessoa tem o direito de livremente circular e escolher a sua residência no interior de um Estado.
Artigo 14° -Toda a pessoa sujeita a perseguição tem o direito de procurar e de beneficiar de asilo em outros países.
Artigo 15° -Todo o indivíduo tem direito a ter uma nacionalidade.
Artigo 16° -A partir da idade núbil, o homem e a mulher têm o direito de casar e de constituir família, sem restrição alguma de raça, nacionalidade ou religião.
Artigo 17° -Toda a pessoa, individual ou colectiva, tem direito à propriedade.
Artigo 18° – Toda a pessoa tem direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião.
Artigo 20° – Toda a pessoa tem direito à liberdade de reunião e de associação pacíficas.
Artigo 21° – Toda a pessoa tem o direito de tomar parte na direcção dos negócios, públicos do seu país.
Artigo 22° – Toda a pessoa, como membro da sociedade, tem direito à segurança social.
Artigo 23° – Toda a pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha do trabalho, a condições equitativas e satisfatórias de trabalho e à protecção contra o desemprego.
Artigo 24° – Toda a pessoa tem direito ao repouso e aos lazeres, especialmente, a uma limitação razoável da duração do trabalho e as férias periódicas pagas.
Artigo 25° – Toda a pessoa tem direito a um nível de vida suficiente para lhe assegurar e à sua família a saúde e o bem-estar, principalmente quanto à alimentação, ao vestuário, ao alojamento, à assistência médica e ainda quanto aos serviços sociais necessários, e tem direito à segurança no desemprego, na doença, na invalidez, na viuvez, ou na velhice.
Artigo 26° – Toda a pessoa tem direito à educação.
Artigo 27° – Toda a pessoa tem o direito de tomar parte livremente na vida cultural da comunidade, de fruir as artes e de participar no progresso científico.
Artigo 29° – O indivíduo tem deveres para com a comunidade, fora da qual não é possível o livre e pleno desenvolvimento da sua personalidade.
Artigo 30° – Nenhuma disposição da presente Declaração pode ser interpretada de maneira a envolver para qualquer Estado, agrupamento ou indivíduo o direito de se entregar a alguma actividade ou de praticar algum acto destinado a destruir os direitos e liberdades aqui enunciados.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos representa uma revolução copernicana na história universal ao inverter a prioridade dos deveres do súdito para a prioridade dos direitos dos cidadãos. Além dos direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais outros direitos foram reconhecidos ao longo da segunda metade do século XX, como os Direitos Sexuais e Reprodutivos, o Direito à Cidade, Direito ao Desenvolvimento, etc. Portanto, existe um amplo leque de Direitos Humanos.
Mas o ser humano não vive no espaço. A vida humana só pode existir porque foi premiada com um lar muito especial que é o Planeta Terra e sua rica biodiversidade.
Os Direitos Humanos não podem estar em contradição e conflito com os direitos da Terra e os direitos da biodiversidade. Sem a vida da Terra não existiria vida humana. A humanidade não tem como viver em uma terra arrasada. Portanto, não é justo e nem viável o ser humano pensar em termos egoísticos e ignorar que a vida na Terra é uma aventura coletiva que envolve a diversidade da flora, da faúna e da geologia do planeta. Como afirma a Carta da Terra:
“A humanidade é parte de um vasto universo em evolução. A Terra, nosso lar, é viva como uma comunidade de vida incomparável. As forças da natureza fazem da existência uma aventura exigente e incerta, mas a Terra providenciou as condições essenciais para a evolução da vida. A capacidade de recuperação da comunidade de vida e o bem-estar da humanidade dependem da preservação de uma biosfera saudável com todos seus sistemas ecológicos, uma rica variedade de plantas e animais, solos férteis, águas puras e ar limpo. O meio ambiente global com seus recursos finitos é uma preocupação comum de todos os povos. A proteção da vitalidade, diversidade e beleza da Terra é um dever sagrado”.
Portanto, a dignidade e os direitos não são exclusividades dos seres humanos. É preciso romper com a ideologia antropocêntrica que considera os humanos donos da Terra e do sistema solar. Como mostrou o escritor Leonardo Boff:
“A Terra é um superorganismo vivo, Gaia, que se auto-regula para ser sempre apta para manter a vida no planeta. A própria biosfera é um produto biológico, pois se origina da sinergia dos organismos vivos com todos os demais elementos da Terra e do cosmos. Criaram o habitat adequado para a vida, a biosfera. Portanto, não há apenas vida sobre a Terra. A Terra mesma é viva e como tal possui um valor intrínseco e deve ser respeitada e cuidada como todo ser vivo. Este é um dos títulos de sua dignidade e a base real de seu direito de existir e de ser respeitada como os demais seres”.
Em síntese: a biosfera (seres vivos) e os componentes físicos da Terra – atmosfera (ar), criosfera (gelo), hidrosfera (água) e litosfera (solo) – formam um complexo sistema integrado que mantém o clima do planeta e as condições materiais de equilíbrio, mesmo que instável e sujeito a um processo de evolução permanente. As condições para a existência de vida no planeta dependem de uma complexa articulação entre os componentes físicos e a biodiversidade.
Nas palavras de Leonardo Boff: “Se os seres humanos possuem dignidade e direitos, como é consenso dos povos, e se Terra e seres humanos constituem uma unidade indivisível, então podemos dizer que a Terra participa da dignidade e dos direitos dos seres humanos. Por isso não pode sofrer sistemática agressão, exploração e depredação por um projeto de civilização que apenas a vê como algo sem inteligência e por isso a trata sem qualquer respeito, negando-lhe valor autônomo e intrínseco em função da acumulação de bens materiais (…) Agora começa o tempo de uma biocivilização, na qual Terra e Humanidade, dignas e com direitos, reconhecem a recíproca pertença, a origem e o destino comuns”.
Os Direitos humanos só serão efetivos quando se respeitar aqueles da nossa casa (Direitos da Terra) e dos nossos vizinhos (Direitos da biodiversidade). Como animais racionais e inteligentes, os seres humanos precisam reconhecer os danos que tem provocado à vida terrestre. Portanto, é preciso garantir os direitos humanos sem desrespeitar os direitos da Terra e da rica vida da biosfera.
Referências:
Declaração Universal dos Direitos Humanos. Disponível em:
http://portal.mj.gov.br/sedh/ct/legis_intern/ddh_bib_inter_universal.htm
Carta da Terra. Disponível em: http://www.cartadaterrabrasil.org/prt/text.html
Leonardo Boff. A Terra sujeito de dignidade e de direitos. 22/04/2010. Disponível em:
José Eustáquio Diniz Alves, colunista do EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; expressa seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br
EcoDebate, 12/01/2011
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