Eventos climáticos extremos: Cancún resume riscos do aquecimento
Balneário mexicano é destruído e reconstruído todo ano por eventos climáticos extremos -no caso, furacões
Crescimento imobiliário desenfreado acaba com manguezais e restingas que protegiam litoral da região do avanço do mar
A primeira impressão de um cínico que chega ao balneário de Cancún, no México, é que a cidade foi toda inflada automaticamente poucos minutos antes de seu avião pousar ali.
Dos hotéis às praias, tudo parece artificial. E, de certa forma, é mesmo.
“Tudo isso que o senhor está vendo é novo. Até o asfalto e as palmeiras”, diz o motorista de táxi apontando para o bulevar Kukulcán. Antes uma restinga que separava a laguna de Nichupté do mar do Caribe, o bulevar é hoje um dos maiores conjuntos de resorts do mundo. Reportagem de Claudio Angelo, Editor de Ciências, Folha de S.Paulo.
Tudo ali é novo porque, há apenas cinco anos, a sede da conferência do clima da ONU foi, ela mesma, vitimada por um evento climático extremo: o furacão Wilma, o mais intenso já registrado no Atlântico tropical.
O Wilma foi a quarta tempestade de categoria 5 que integrou a temporada de furacões de 2005, a mais intensa já registrada e que produziu os desastres Katrina e Rita. Menos ilustre, Wilma matou oito pessoas na península do Yucatán e causou prejuízos de US$ 29 bilhões.
As famosas praias de Cancún e da chamada Riviera Maia desapareceram, engolidas pelo mar, e precisaram ser refeitas com areia trazida do fundo do oceano. Desde então, elas têm de ser reconstruídas todo ano. A última operação terminou em janeiro e custou US$ 80 milhões.
Curiosamente, o que torna a cidade mais vulnerável a esse tipo de impacto é justamente a maneira como o setor do turismo ocupou o litoral de Cancún e de outras cidades do Estado de Quintana Roo: hotéis gigantescos foram construídos sobre as dunas, facilitando a erosão marinha. Os manguezais da região, que funcionam como uma barreira contra os furacões, foram desmatados.
Desde os anos 1980, propriedades de milhões de dólares vêm sendo erguidas em plena restinga, quase ao nível do mar e exatamente no local onde o impacto dos furacões -que sempre existiram- é maior ainda.
“Este é o lugar que menos poderia abrigar uma conferência do clima”, diz a advogada Alejandra Serrano, do Centro Mexicano de Direito Ambiental em Cancún.
A organização já impetrou cem ações judiciais contra licenciamentos ambientais de hotéis que atropelam as leis municipais. Só ganhou 12.
A expansão desordenada dos resorts sobre a praia e o mangue é o principal fator a aumentar a vulnerabilidade de Cancún. Serrano conta que o plano diretor da cidade permite a construção de 30 mil quartos de hotel. Mas, hoje, já existem 35.700.
Uma das ações foi contra um empreendedor espanhol que teve autorização para construir um hotel de 37 quartos -e construiu um de 937. “A multa já faz parte do plano de investimento, sai mais barato do que deixar de construir”, diz a advogada.
Alejandro Olivera, do Greenpeace México, afirma que o próprio plano de desenvolvimento da cidade vem sendo flexibilizado ano após ano. “O primeiro plano previa 3.000 quartos.”
A distância de apenas 20 metros entre os hotéis e a praia determinada pela lei agrava a erosão marinha.
AMORTECIMENTO
Outro fator de vulnerabilidade é a perda dos mangues. Em Quintana Roo, 2,5% deles desaparecem por ano.
Acontece que a vegetação também é essencial para conter as águas.
Como o sul do Estado é uma das cinco zonas mais sensíveis do México à elevação do nível do mar, tempestades fortes tendem a levar ondas cada vez maiores mais para dentro do continente -com prejuízos previsíveis.
frases
“Este é o lugar que menos poderia abrigar uma conferência do clima”
“A multa [por construir um hotel maior do que o permitido] já faz parte do plano de investimento. Sai mais barato do que deixar de construir”. ALEJANDRA SERRANO, Advogada do Centro Mexicano de Direito Ambiental em Cancún
“A distância de 20 metros entre hotéis agrava a erosão. Na Espanha são cem metros”. ALEJANDRO OLIVERA, Greenpeace do México
EcoDebate, 06/12/2010
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