Justiça do Pará vai decidir sobre licenciamento da siderúrgica da Vale em Marabá
Irregularidades causadas por "pressa" para licenciar siderúrgica da Vale colocam em risco segurança ambiental na região. MP cobra evidências científicas de que não haverá contaminação
A Justiça paraense vai analisar pedido liminar do Ministério Público para realização de novas audiências públicas, anulação da licença prévia e suspensão do licenciamento ambiental da siderúrgica Aços Laminados do Pará (Alpa), indústria que a Vale planeja instalar em Marabá, no sudeste do estado. O Ministério Público aponta uma série de irregularidades relativas à designação e realização da única audiência pública ocorrida em Marabá, além da ausência de estudos adequados e incongruências do estudo de impactos ambientais, entre elas a falta de previsão adequada de controle dos gases poluentes gerados pela usina.
A ação civil pública contra as falhas do processo de licenciamento da Alpa foi elaborada pelo Ministério Público Federal no Pará (MPF/PA) em parceria com o MP Estadual e enviada à Justiça Federal em 17 de maio. O MPF/PA aguardava a decisão judicial sobre o pedido liminar, mas o juiz Carlos Henrique Borlido Haddad considerou ser da Justiça do Estado a competência para julgar a questão.
No texto da ação, o procurador da República Tiago Modesto Rabelo, responsável pela ação junto com a promotora de Justiça Josélia Barros Lopes, indica uma série de problemas no licenciamento ambiental do projeto que implicam a necessidade de realização de novas audiências e justificam o pedido de anulação da LP e suspensão do processo de licenciamento (veja todas as irregularidades abaixo).
Um dos principais problemas aconteceu durante a única audiência pública realizada, em que não estavam presentes os servidores responsáveis pela análise e licenciamento ambiental da obra, como expressamente determina a legislação estadual. Segundo informações da associação dos servidores da Secretaria de Estado do Meio Ambiente (Sema), no dia da audiência pública os responsáveis pelo licenciamento estavam fazendo a primeira vistoria técnica na área do projeto.
“Afinal, que esclarecimentos acerca da análise pública do relatório de impacto ambiental poderiam ter sido prestados em audiência, sendo que tais informações ainda estavam sendo colhidas?”, questionou o procurador Tiago Rabelo no texto da ação.
A associação dos servidores da Sema também informou ao MP a considerável “pressão” por parte dos ocupantes de cargos superiores, denunciou que não foram realizados estudos necessários e suficientemente aprofundados do empreendimento, dada a exiguidade do prazo de análise do empreendimento com vistas à apreciação da licença prévia, recentemente concedida. Os servidores criticaram, além da pressa, a adoção de posturas informais na Secretaria, de forma a atropelar as devidas cautelas exigidas pelos estudos.
Benzeno – Outro ponto bastante criticado pelo MP foi a falta de justificativa para a escolha da tecnologia de controle de gases poluentes. Segundo estudo técnico do Ministério Público do Pará citado na ação, atualmente existem tecnologias mais seguras e que oferecem menores riscos para os trabalhadores das siderúrgicas e das comunidades vizinhas às usinas. “O estudo considera injustificável o fato de que o projeto Alpa não possui medida de controle para o benzeno, nem para outros compostos aromáticos tão perigosos quanto este poluente”, alerta a ação. De acordo com o Ministério da Saúde, o benzeno é cancerígeno, mesmo em baixas concentrações.
O parecer de especialistas do Ministério Público diz que a quantidade de informações do estudo de impacto ambiental “não é suficiente para avaliar com segurança o que é eliminado pelas chaminés e condutos de saída dos diversos equipamentos”. “Ou seja”, diz o texto, “poluentes perigosos podem ser eliminados sem qualquer controle”.
Com a transferência do processo judicial da esfera federal para a estadual, quem passa a atuar na ação é o Ministério Público do Estado, com acompanhamento do MPF/PA.
O MP buscou a via judicial após ter recomendado novas audiências e estudos à Sema, que se recusou a acatar, mesmo havendo pedidos de comunidades, cidadãos e até da Ordem dos Advogados do Brasil (subseção Marabá) para que fossem feitas novas audiências.
Para o MPF/PA, a Justiça Estadual terá a oportunidade de corrigir as distorções. “Se não prontamente impedidas pelo Poder Judiciário (já que as tentativas extrajudiciais não lograram êxito), representam perigoso precedente”, diz o procurador Tiago Rabelo.
“Inadmissível que as coisas sejam conduzidas de qualquer forma, em atropelo aos ditames constitucionais, legais e aos preceitos e princípios que regem o procedimento de licenciamento ambiental, afrontando o devido processo legal que, no que toca à tutela ambiental, foi conquistado à duras penas, democraticamente”, complementa.
Veja todas as irregularidades apontadas pelo MP:
1 – realização de audiência pública em desconformidade com a legislação pertinente; desrespeito a prazos legais;
2 – acesso insuficiente ao EIA-Rima para análise adequada, e em prazo razoável, dos estudos de impactos ambientais;
3 – insuficiente publicidade dos estudos;
4 – consequente participação inefetiva dos interessados na audiência;
5 – ausência de estudos adequados de impactos relativos ao desvio da BR-230 e relacionado à ampliação do distrito industrial de Marabá;
6 – análise técnica do EIA, aponta várias deficiências dos estudos, que colocam em risco o meio sócio ambiental.
Veja aqui a íntegra da ação.
Informe do Ministério Público Federal no Pará, publicado pelo EcoDebate, 10/06/2010
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