ONGs lançam manifesto contra ferrovia e terminal portuário da Bamin na Bahia
Abraço simbólico na Lagoa Encantada, um dos principais pontos turísticos de Ilhéus, em manifestação contra ferrovia e porto na Bahia. Foto © Mary Berbert/WWF
Diversas organizações não governamentais ambientalistas lançaram, no dia 25/04, às margens da Lagoa Encantada, em Ilhéus (BA), um manifesto contra a implantação do Terminal Portuário da Bamin, do Porto Sul e do traçado final da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol), previstos para serem localizados na Área de Proteção Ambiental (APA) da Lagoa Encantada.
O grupo argumenta que as obras estão sendo planejadas em áreas de extrema importância socioambiental – inclusive Área de Proteção Permanente, como o entorno da própria Lagoa Encantada – cuja biodiversidade, que inclui 1.500 espécies de plantas endêmicas (ou seja: que só crescem na região), já se encontra sob severa ameaça.
O manifesto pleiteia a imediata suspensão dos processos de licenciamento do Porto da Ponta da Tulha, do Porto Sul e da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol).
As organizações pedem, ainda, ao Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) que não analise solicitações de empréstimos para este empreendimento e que o governador Jaques Wagner, da Bahia, não aplique, ali, recursos do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC).
A meta assumida pelo Brasil na Convenção da Diversidade Biológica da Organização das Nações Unidas é de proteção de 10% da área original da Mata Atlântica até 2010. Hoje temos somente 7,9% da vegetação original. Por isso, é imprescindível preservar.
Leia o manifesto que será enviado ao governador da Bahia, Jaques Wagner (PT), e ao Ministério do Meio Ambiente. Comente e ajude a divulgar!
Manifesto em defesa da Lagoa Encantada (sul da Bahia)
1. Considerando que o Brasil é signatário da Convenção sobre a Diversidade Biológica da Organização das Nações Unidas (ONU) e da ICRI (International Coral Reef Initiative) – Iniciativa Internacional dos Recifes de Coral, tendo firmado compromissos no âmbito internacional para a proteção e conservação da biodiversidade e que, além disso, a ONU declarou o ano de 2010 como o Ano Internacional da Biodiversidade, ano em que o Brasil se comprometeu oficialmente em eliminar o desmatamento na Mata Atlântica;
2. Considerando que a Mata Atlântica é reconhecidamente um bioma de importância global e sob ameaça de alto grau, ou seja, um hotspot, contendo mais de 1.500 espécies de plantas vasculares endêmicas (> 0,5% do total mundial), cujos ecossistemas prestam inestimáveis serviços a sociedade, incluindo manutenção de água de qualidade para as cidades, equilíbrio climático, uma das paisagens mais belas do mundo, viabilizando enorme indústria turística etc., mas infelizmente já tendo perdido, pelo menos, 93% de seu habitat original;
3. Considerando que a área onde se pretende instalar o Terminal Portuário da Bamin está inteiramente incluída na Reserva da Biosfera da Mata Atlântica reconhecida pela Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura), evidenciando o compromisso do Governo Brasileiro com a conservação e desenvolvimento sustentável da área;
4. Considerando que o Sul da Bahia foi objeto de narrativas de importantes naturalistas, que estiveram presentes na região e relataram suas experiências, constituindo importantes referências históricas para o Brasil e o mundo;
5. Considerando que a biodiversidade marinha do Sul da Bahia, em especial os recifes de coral, é considerada como de alta importância biológica, é conferida à região uma enorme responsabilidade de proteção e uso sustentável desses ambientes, devido à variedade de bens e serviços que promovem, tais como (i) proteção do litoral contra a ação das ondas, (ii) berçários para as espécies marinhas, (iii) uso recreativo e turístico e (iv) fontes de compostos medicinais, além do Sul da Bahia ser um importante depositário de espécies endêmicas;
6. Considerando que o Sul da Bahia é caracterizado por sua extrema riqueza natural, histórica e cultural, abrigando um enorme patrimônio ecológico e socioambiental do Brasil, e também do mundo, traduzido por paisagens de valor histórico e espécies animais e vegetais endêmicas e ameaçadas de extinção, ou seja, espécies que poderão ser exterminadas da face da Terra se não forem preservadas;
7. Considerando que o patrimônio cultural e natural do Sul da Bahia é resultado de relações históricas seculares de comunidades locais e centenas de milhares de produtores e trabalhadores rurais, pescadores, comunidades quilombolas e remanescentes indígenas, cuja economia tem sido marginalizada ao longo de décadas, mas bem aproveitada poderia ser a base de uma nova economia regional movida pela produção de cacau e chocolate, frutas, fibras naturais, indústria de base local e de micro e pequena escala, turismo e cultura regional, e que estas mesmas populações poderão ser as maiores vítimas de projetos corporativos como os da Bahia Mineração;
8. Considerando que o turismo é uma das principais atividades da região, tendo um papel fundamental no combate à pobreza e sendo uma ferramenta crucial para o desenvolvimento sustentável; neste quesito, é relevante o fato de que as principais motivações turísticas da Bahia são (i) a NATUREZA e (ii) o PATRIMÔNIO HISTÓRICO, e que o Prodetur (Programa de Desenvolvimento do Turismo – Nordeste), financiado por recursos do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) para promover a expansão e melhoria da qualidade da atividade turística na Região Nordeste e para melhorar a qualidade de vida das populações residentes nas áreas beneficiadas, pode ter sua credibilidade institucional ameaçada com a implantação do Complexo Porto Sul;
9. Considerando que, em 1991, a região prevista para o Terminal Portuário da Bamin ser implantado – área às margens do Rio Almada e área da Lagoa Encantada – foi tombada pelo Município de Ilhéus e, em 1993, foi alvo da criação da Área de Proteção Ambiental (APA) da Lagoa Encantada, que inclusive foi ampliada, em 2003, com o objetivo de conservar os valiosos ecossistemas remanescentes da Mata Atlântica na bacia do Rio Almada, sua nascente, os manguezais e áreas úmidas associadas a seu estuário, a riqueza que as áreas indicadas possuem como abrigo de espécies raras da fauna e flora locais, a grande beleza cênica que compõe o referido ecossistema, com imenso potencial de desenvolvimento de ecoturismo;
10. Considerando que a implantação do Complexo Intermodal Porto Sul afetará áreas de preservação permanente, assim definidas pelo artigo 215 da Constituição do Estado da Bahia e pelo Código Florestal, como, por exemplo, recifes de coral, manguezais, dunas e restingas;
11. Considerando que, ao contrário do que a Bamin tem afirmado em relação à geração de “milhares” de empregos, com a implantação do Terminal Portuário, serão gerados apenas 460 postos de emprego definitivos – com mão-de-obra especializada, ou seja, não inserindo a população local – e que a exploração da mina em Caetité (BA) se dará pelo período de 25 anos, limitando a geração de empregos na região;
12. Considerando que o total do recurso alocado para a construção da Ferrovia EF-334 é da ordem de 6 bilhões de reais, o que representa cerca de 1/3 do orçamento anual do Estado da Bahia e que o traçado final da Ferrovia EF-334 está previsto para desembocar na Ponta da Tulha, em Ilhéus, em desconformidade com a legislação ambiental, bem como com o Plano Diretor do Município de Ilhéus;
13. Considerando que, ao lado de Caetité (BA) já existe uma ferrovia – a Ferrovia Centro-Atlântica (FCA), que segue para o Porto de Aratu – que poderia ser utilizada para escoar o minério de ferro e exportar através do referido porto, afastando a necessidade de se construir uma nova ferrovia que interligue Caetité (BA) e Ilhéus (BA) e um novo porto na região da Ponta da Tulha, sendo uma opção extremamente menos impactante dos pontos de vista econômico e socioambiental;
As entidades subscritoras deste MANIFESTO são contra a implantação do Terminal Portuário da Bamin, do Porto Sul e do traçado final da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol), previstos para serem localizados na APA da Lagoa Encantada, pelos motivos expostos acima, e solicitam:
À Sra. Ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, a imediata suspensão dos processos de licenciamento do Porto da Ponta da Tulha, do Porto Sul e da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol), esta última com a revisão do traçado e posterior conexão com a Ferrovia Centro Atlântica;
Ao Sr. Presidente do Tribunal de Contas da União (TCU), Ubiratan Diniz de Aguiar, a imediata suspensão da abertura dos Editais de Concorrência da Valec 005/10 e 008/10 para execução das obras da EF-334, previstos para 04/05/2010 e 07/05/2010, respectivamente, no que tange ao traçado final da ferrovia em Ilhéus (BA);
Ao Sr. Presidente do Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES), Luciano Coutinho, a não apreciação de pedidos de financiamento relacionados ao Complexo Intermodal Porto Sul, em razão dos danos irreversíveis que o empreendimento irá gerar;
Ao Sr. Governador do Estado da Bahia Jaques Wagner, que utilize a verba destinada pelo PAC – Plano de Aceleração do Crescimento, em iniciativas que promovam o desenvolvimento sustentável na Bahia, que beneficiam a sociedade com melhor qualidade de vida – como tem sido demonstrado, por exemplo, com o modelo de desenvolvimento da Costa Rica–, gerando renda e postos de trabalho para seus habitantes mediante o uso sustentável de seu patrimônio ambiental, notadamente de suas unidades de conservação, inserindo a Bahia definitivamente em um modelo de desenvolvimento do século XXI, levando em conta as futuras gerações, uma economia mais justa e sustentável e o respeito à natureza e às reais vocações da região
Aos Srs. Presidente da Comissão de Meio Ambiente da Câmara dos Deputados, Jorge Khoury, Presidente da Comissão Permanente de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle do Senado Federal, Senador Renato Casagrande, e Presidente da Comissão de Meio Ambiente, Seca e Recursos Hídricos da Assembléia Legislativa do Estado da Bahia, Deputado Gaban, que tomem ciência dos riscos envolvidos no projeto e dos danos irreversíveis que ele poderá causar.
Ilhéus, 25 de abril de 2010
Instituições e redes:
Instituto Floresta Viva
Rede Sul da Bahia Justo e Sustentável
Associação para Proteção da Mata Atlântica do Nordeste (Amane)
Associação Mico-Leão-Dourado
Ipê – Instituto de Pesquisas Ecológicas
Gambá – Grupo Ambientalista da Bahia
Conselho Nacional da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica
SOS Mata Atlântica
WWF-Brasil
* Nota da WWF-Brasil, publicada pelo EcoDebate, 28/04/2010
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