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O automóvel elétrico quer mudar sua vida

Carro elétrico sendo 'abastecido'. Foto Jon Mauney/HowStuffWorks
Carro elétrico sendo ‘abastecido’. Foto Jon Mauney/HowStuffWorks

O veículo se comunicará com o motorista para ajudá-lo a dirigir. Não será mais preciso comprá-lo e ele poderá armazenar e revender energia.

A chegada do carro elétrico obrigará a mudar a forma de dirigir e de circular nas cidades, mas afetará também outros aspectos da vida cotidiana. A princípio, sua autonomia limitada trará inconvenientes, mas ensinará a aproveitar a energia de forma mais eficiente. O automóvel dará todo tipo de informação ao motorista, desde o melhor trajeto até os postos de recarga livres ou a autonomia, e chamará o guincho ou a ambulância de forma automática em caso de acidente.

A gestão inteligente da eletricidade das baterias também trará benefícios econômicos no futuro. E haverá novas alternativas para usar o automóvel sem comprá-lo. O usuário de um carro elétrico deverá fazer mudanças em sua rotina diária. Assim, provavelmente muito antes de 2015, ao levantar pela manhã e ligar o carro, receberá uma mensagem como esta: “As baterias de seu automóvel estão carregadas. Se deseja ligar o ar condicionado, escolha a temperatura”. Enquanto toma um banho, o carro ligará a calefação, usando a eletricidade da casa ou do poste de energia da rua para não gastar bateria ao preparar o interior do veículo. Reportagem de Manuel Gómez Blanco, El País.

Utilizar um carro elétrico terá inconvenientes, ainda que transponíveis. Sua autonomia limitada exigirá dirigir com mais suavidade, aproveitar a inércia e evitar acelerações e freadas bruscas. Será necessário também escolher os trajetos mais curtos, e principalmente não abusar de acessórios como o ar condicionado: ele pode reduzir em 10% a autonomia em dias quentes. Para se ter uma ideia, dirigir um carro elétrico será a princípio como se hoje saíssemos de casa todos os dias com a luz da reserva acesa, ou com um quarto do tanque, e isso tivesse que durar o dia todo. Como as recargas serão muito mais lentas do que nos postos de gasolina atuais, será necessário prevê-las, porque elas levarão mais tempo.

A princípio, parece um inconveniente, mas a realidade é que, segundo vários estudos de mobilidade, cerca de 60% dos espanhóis percorrem menos de 36 quilômetros por dia, e 80% a 90% dos motoristas das grandes cidades europeias não chegam a percorrer 25 quilômetros por dia. Se as previsões dos frabricantes forem cumpridas e os primeiros carros elétricos à venda oferecerem de 130 a 180 quilômetros de autonomia, poderão suprir essas necessidades com folga, exceto em situações excepcionais.

A comunicação entre o carro elétrico e o motorista também será algo habitual, e acontecerá através do telefone celular ou do navegador. Por exemplo, se a distância prevista para o dia superar a autonomia disponível, bastará programar um destino intermediário no GPS e ele mostrará os postos de recarga livres mais próximos, reservando o que interesse. Assim, ao estacionar, o posto reconhecerá a reserva e só então iniciará a recarga. O valor poderá ser pago de várias formas: cartão de crédito, pela conta de luz ou por telefone, ou com cartões pré-pagos dos fabricantes e outras companhias. E a concorrência permitirá mais descontos, tarifas especiais de acordo com o horário e programas de fidelização, como nas companhias aéreas.

Os sistemas eletrônicos dos carros elétricos também se comunicarão entre si (Car to Car) e avisarão sobre qualquer incidente, como acidentes ou engarrafamentos, propondo itinerários alternativos. E também chamarão automaticamente o guincho ou a ambulância se houver um acidente: a chamada será ativada assim que o airbag se abrir. Essas funções já estão disponíveis em alguns modelos e países, mas a tecnologia dos elétricos permitirá incorporá-las antes que os demais carros.

A autonomia limitada dos veículos com baterias ajudará a mudar alguns hábitos na hora de comprar o automóvel ou pagar pelo seu uso. Nos primeiros anos, até 2013 a 2015, os fabricantes oferecerão os carros elétricos principalmente através de aluguel ou leasing, com quotas mensais que incluirão a manutenção e a substituição das baterias se for necessário. Mas algumas marcas lançarão novos serviços acessíveis para que o usuário dos elétricos possa dispor de carros mais apropriados para viajar nas férias e fins de semana se precisar. Assim, não será necessário adquirir um carro familiar grande se ele só será usado alguns dias por ano.

Entretanto, a grande mudança chegará por volta de 2020, quando as redes elétricas inteligentes se generalizarem. Então o carro elétrico poderá funcionar também como um armazém de energia: poderá ser carregado nas horas de menor consumo com tarifas mais econômicas (quase sempre à noite) e dar lugar à casa (luz, calefação, eletrodomésticos) na horas de pico, quando não será usado, para reduzir a fatura mensal. Ele poderá até mesmo ser carregado de dia com uma placa solar no teto e revender a energia às companhias elétricas para que cubram seus picos de demanda. Segundo uma palestra apresentada no Colégio de Engenharia Industrial de Madri por Fernando Soto, chefe de Planejamento de Rede Elétrica: “Se a maioria das recargas forem feitas nas horas menos concorridas, o aumento da demanda do carro elétrico não exigiria ampliar a capacidade de geração instalada na Espanha. Poderíamos até aproveitar melhor a atual e integrar melhor as energias renováveis (solar, eólica…)”.

A capacidade e tecnologia das baterias de ion-lítio abre a possibilidade para inúmeros novos negócios, inclusive no final de seu ciclo de vida. Depois de cinco ou sete anos de uso, elas perderão cerca de 20% de sua capacidade de carga e autonomia, mas servirão para armazenar eletricidade em casa ou formando painéis em centrais elétricas ou parques eólicos, para utilizar sua energia nas horas de mais demanda. A Nissan tem um acordo com a Sumitomo para desenvolver um negócio com baterias usadas no Japão. A implantação do carro elétrico será progressiva e conviverá com os carros atuais por pelo menos dez ou 15 anos, na melhor das hipóteses.

Segundo as previsões dos fabricantes, eles responderão por 10% do mercado mundial em 2020, cerca de seis milhões por ano. Mas a rapidez do processo dependerá das baterias. Enquanto não superarem os 300 quilômetros de autonomia ou não existam postos para recarregá-las em cinco minutos sem reduzir sua vida útil, os elétricos serão carros para a cidade. As baterias atuais de ion-lítio dificilmente alcançarão esse número de quilômetros sem aumentar o peso do carro e reduzir o conforto, mas já estão sendo pesquisadas reações químicas mais eficientes.

Segundo Jose Manuel Amarilla, do Centro Superior de Pesquisas Científicas (CSIC): “As próximas baterias de lítio-fosfato de ferro, e lítio-manganês reduzirão os custos, mas a grande esperança são as de lítio-ar, que poderiam quadruplicar o rendimento atual, ainda que ainda existam grandes desafios por resolver.” Com essas melhorias, os elétricos poderiam chegar a 500 quilômetros de autonomia e aproximar sua capacidade à dos carros atuais nas viagens longas. E o processo de substituição seria acelerado enormemente. Entretanto, as marcas lançarão vários tipos de elétricos, uns para a cidade e outros com baterias que poderão ser trocadas em cinco minutos num posto.

Ainda que agora existam modelos semiartesanais, como o Think, o tiro de largada na Espanha acontecerá no final do ano com a chegada dos Mitsubishi Mi-EV, Peugeot Ion e Citroën C-Zero, um mesmo utilitário de 3,4 metros (chassis, baterias e motores iguais) com a imagem de cada marca. Eles têm quatro lugares, 130 quilômetros de autonomia. Sairão por 20 mil euros, mais o aluguel de suas baterias de tirar e por, que será amortizado pelo baixo consumo com um uso intensivo: a recarga para percorrer 100 quilômetros com um carro elétrico custará entre 1 e 1,50 euro, em comparação a 5 euros dos melhores motores diesel.

Em 2012 será lançado o Nissan Leaf, um compacto tipo Golf, com 150 quilômetros de autonomia e preços entre 15 mil e 20 mil euros, mais o valor das baterias. Ao mesmo tempo chegarão novos híbridos – com motor térmico e um ou vários elétricos – com tecnologias muito variadas para ampliar a autonomia no modo elétrico. Em alguns casos o motor de combustão só funcionará como gerador para carregar as baterias em marcha quando elas se esgotarem: Chevrolet Volt e Opel Ampera (2011). Em outros ele será ligado a certa velocidade ou ao esgotar a bateria (Toyota Prius Plug-in). Mas todos gastarão menos de três litros, como os híbridos diesel que a Peugeot e a WV estão construindo.

Entretanto, pelo menos até 2012, a oferta de carros elétricos será absorvida quase totalmente por instituições e empresas, sobretudo de frotas de entregas: o uso intensivo permitirá amortizá-los melhor e fará que seja rentável para os fabricantes montarem postos de recarga em suas bases e sedes.

Tradução: Eloise De Vylder

Reportagem [Este coche quiere cambiar su vida] de El País, no UOL Notícias.

EcoDebate, 13/04/2010

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