A primeira revolução ambiental, artigo de Maurício Gomide Martins
[EcoDebate] Nenhum ambientalista que se diga tal pode desconhecer a história recente da ilha de Bougainville, cujo resumo registramos abaixo.
Bougainville é uma ilha no oeste do Oceano Pacífico, com população autóctone de 180.000 habitantes, vinculada outrora ao país Papua-Nova Guiné como província, hoje politicamente autônoma.
Nas décadas de l970 e l980, a maior mineradora do mundo, de capital inglês, chamada Rio Tinto, explorou desbragadamente uma mina de cobre na ilha e que recebeu o nome de Panguna. Entre os problemas ambientais que a mineração normalmente ocasiona, destaca-se o desmatamento, poluição dos rios com os rejeitos e produtos químicos tóxicos produzidos no processamento, além de infectarem os córregos e lençóis freáticos.
Todos os interessados na mina se beneficiavam, inclusive o governo de Papua-Nova Guiné, menos os habitantes da ilha que viam apenas a destruição de seus bens essenciais à vida, pois esse povo mantinha uma existência simples, harmonizada com os recursos naturais, sem se sentirem atraídos pela materialidade do progresso.
Os ilhéus se organizaram e pediram à diretoria que encerrassem a atividade e os indenizassem pelas destruições causadas. Ante tamanha ingenuidade, a mineradora deu de ombros, sabendo que os habitantes eram pobres, desaparelhados e sem poder de força. Além disso, contava a empresa com a cobertura dos governantes a quem pagavam regiamente. O povo, sentindo-se consciente da origem da destruição de seu ambiente, organizou-se e reagiu com ações sabotadoras dos interesses mineiros. Destruíram as redes elétricas, paióis de explosivos, máquinas, veículos e tudo o mais que representasse a mina.
A reação foi violenta. O governo de Papu-Nova Guiné mobilizou seu exército contra a população, incendiando aldeias e assassinando os moradores, o que deu origem a uma revolução ampliada, estruturada, vindicatória, na qual as armas dos ilhéus foram a astúcia, heroísmo e finalmente a guerrilha.
Percebendo o governo que não tinha condições de vencer a luta, lançou mão, com ajuda dos governos da Inglaterra e Austrália, de um rigoroso bloqueio de toda a ilha, impedindo a entrada de alimentos e remédios. Esse recurso causou muitas mortes, mas fortaleceu ainda mais os ideais de luta. Nessa situação, os líderes locais se conscientizaram que havia apenas uma saída: uma vivência de interação do homem com o meio ambiente, tornando-se auto-suficientes, com a obtenção na Natureza do mínimo e básico à sobrevivência.
Essa luta sacrificante e gloriosa durou 10 anos, de 1989 a 1997. Com a obtenção da autonomia da ilha de Bougainville, mostrou-se ao mundo que não é suave a prevalência dos atos de viver à ganância materialista do poderoso sistema econômico, ao qual os chamados “governantes” lhe emprestam os ares de legitimidade e dignidade, termos absolutamente abstratos frente à realidade dos fatos.
Essa epopéia, única na história mundial recente, dá o exemplo a ser seguido pelo povo do mundo para evitar a desconstrução da Natureza e o conseqüente suicídio coletivo.
Registramos aqui que a multinacional Rio Tinto tem permissão para explorar a mineração na Amazônia brasileira, o que indica claramente a quem os governos representam.
Destacamos que tais fatos, relativamente recentes, não tiveram por parte da mídia a necessária e suficiente divulgação. Ocultar notícias é uma forma de mentir. Que fique o exemplo da “liberdade de imprensa” para quem ainda acredita piamente na candura do diabo travestido de publicidade.
O que relatamos é História real. Fato importantíssimo, havendo desconhecimento geral. Entendemos que a luta dos nativos da ilha de Bougainville deve ser divulgada ao máximo entre os ambientalistas, pois ela configura perfeitamente o que nos aguarda no futuro se não houver uma potente e rápida reação.
Maurício Gomide Martins, 82 anos, ambientalista, colaborador e articulista do EcoDebate, residente em Belo Horizonte(MG), depois de aposentado como auditor do Banco do Brasil, já escreveu três livros. Um de crônicas chamado “Crônicas Ezkizitaz”, onde perfila questões diversas sob uma óptica filosófica. O outro, intitulado “Nas Pegadas da Vida”, é um ensaio que constrói uma conjectura sobre a identidade da Vida. E o último, chamado “Agora ou Nunca Mais”, sob o gênero “romance de tese”, onde aborda a questão ambiental sob uma visão extremamente real e indica o único caminho a seguir para a salvação da humanidade.
EcoDebate, 09/03/2010
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