Conselho Federal de Psicologia pune psicóloga que oferecia terapia para curar homossexualismo
Psicóloga carioca Rosângela Alves Justino fala sobre a punição que o Conselho Federal de Psicologia lhe aplicou por oferecer terapia para curar o homossexualismo Foto: Valter Campanato/ABr
Psicóloga punida por conselho insiste em continuar oferecendo cura para homossexualismo. Conselho diz que psicóloga terá punição agravada se insistir.
O Conselho Federal de Psicologia (CFP) decidiu ontem (31) aplicar uma censura pública à psicóloga carioca Rozângela Alves Justino, que oferecia terapia para curar o homossexualismo masculino e feminino. Ela infringiu resolução do CFP, de 22 de março de 1999, na qual a entidade afirma que a homossexualidade “não constitui doença, nem distúrbio e nem perversão”.
O CFP manteve a punição que tinha sido aplicada à psicóloga pelo Conselho Regional de Psicologia do Rio de Janeiro. O presidente do CFP, Humberto Verona, explicou que a entidade não poderia agravar a punição, aplicando uma suspensão ou cassação do registro profissional, pelo fato de a própria psicóloga ter recorrido ao conselho.
Psicóloga punida por conselho insiste em continuar oferecendo cura para homossexualismo
Após ser condenada à censura pública pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP) por oferecer terapia para curar o homossexualismo masculino e feminino, a psicóloga Rozângela Alves Justino prometeu continuar sua atividade normalmente no Rio de Janeiro.
“Com certeza, vou continuar. Vejo que as pessoas têm direito de procurar esse apoio. É a pessoa que define o quer dentro da psicoterapia. Não sinto vergonha e nunca sentirei de acolher pessoas que querem deixar voluntariamente o estado de homosseuxalidade”, afirmou Rozângela. “Estão me submetendo a uma mordaça. Mas quero dizer às pessoas que estão em estado de sofrimento psíquico e desejam deixar a homossexualidade que procurem profissionais nas suas cidades.”
De óculos escuros e máscara, a psicóloga afirmou temer sofrer represálias nas ruas por movimentos que defendem os direitos dos homossexuais. “Não quero amanhã andar em todo o Brasil e ser reconhecida porque os ativistas gays sentem muita raiva de mim. Não quero de alguma forma ser atingida por essa ira e essa raiva.”
Em contraponto à resolução na qual o CFP diz que a homossexualidade “não constitui doença, nem distúrbio e nem perversão”, a psicóloga citou uma publicação da Organização Mundial da Saúde (OMS) que traz a definição de transtorno de identidade sexual. “A homossexualidade pode ser primária ou secundária a outros transtornos”, assinalou Rozângela.
O advogado Paulo Fernando, contratado pela psicóloga, anunciou que vai recorrer na Justiça Federal contra a decisão do CFP, que manteve condenação já imposta anteriormente pelo Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro.
“[A decisão] fere a liberdade de expressão, fere a liberdade científica e principalmente ofende aquelas pessoas que voluntariamente desejam praticar determinados atos. O resultado foi de uma flagrante injustiça e vamos argui-lo”, ressaltou Fernando.
Em tom irônico, o advogado argumentou que a superexposição da cliente poderá render a ela mais demanda profissional. “Nesses 28 anos, ela não teve nenhum paciente que reclamasse do tratamento que recebeu. Devido a essa notoriedade, acredito que vai ter fila na porta do seu consultório de tanta gente querendo ser atendida.”
Conselho diz que psicóloga terá punição agravada se insistir em cura de homossexualismo
A disposição declarada pela psicóloga Rozângela Alves Justino de continuar a oferecer terapia para cura do homossexualismo masculino e feminino poderá lhe render punições mais graves do que a censura pública.
Segundo o presidente do CFP, Humberto Verona, a censura pública será exposta no Diário Oficial da União e em publicações regionais de psicologia para notificar a sociedade do comportamento indevido da profissional, que está, em tese, proibida de manter esse tipo de conduta.
“Ela [Rozângela] foi condenada por este tribunal de ética a não mais reincidir na prática. Havendo reinserção na prática, terá que arcar com todas as consequências possíveis”, disse Verona, se referindo às penalidades disciplinares de suspensão do exercício profissional por 30 dias ou de cassação do registro, mais graves do que a censura pública. Tais penalidade poderiam ser aplicadas em um novo processo ético movido por denunciantes.
“Pela lógica, se ela teve uma censura pública, que é a terceira em gravidade, num processo provavelmente a pena será mais grave do que esta”, confirmou Verona.
O CFP esclareceu que psicológos não podem sugerir modificação da orientação homoafetiva do cidadão nem oferecer tratamento para tal. Mesmo se procurados por clientes em sofrimento psíquico decorrentes de sua opção sexual, os psicólogos não podem prometer cura.
“Eles podem ouvir o sofrimento e ajudar a pessoa a superar, através de um terapia de aceitação ou de acolhimento”, assinalou Verona.
Advogados de Rozângela Muniz vão recorrer à Justiça Federal contra a decisão do CFP, sob o argumento de que a cliente foi vítima de constrangimento, humilhação e intimidação.
Reportagem de Marco Antônio Soalheiro, da Agência Brasil, publicada pelo EcoDebate, 01/08/2009
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Carta a Jean Wyllys, em referência à escrita para a psicóloga Rozângela Justino
Prezado Jean,
não o conheço pessoalmente, mas lhe enxergo (como se diz na gíria aqui no Pará em relação à pessoa com a qual não se tem contato mais próximo, apenas visual): vi sua imagem em alguns “flash” e notícias sobre o BBB-5. Antes de tudo, quero lhe dizer que não pretendo adotar uma postura beligerante em relação à sua carta aberta à psicóloga Rozângela Justino (aliás, também não a conheço pessoalmente, apenas acompanho seu “caso” com vivo interesse, muito mais por razões acadêmicas do que de outras naturezas – como você, sou professor, ministro disciplinas ligadas à área da metodologia de pesquisa e análises de dados para alunos do curso de psicologia da UFPA). Entretanto, de acordo com meu entendimento, como você faz ataques públicos a alguém que pertence ao coletivo perante o qual tenho responsabilidade social como formador de futuros profissionais psicólogos, sinto-me compelido a aproveitar o ensejo para tecer alguns comentários, muito mais dirigidos ao meu “público cativo” (que meus alunos me desculpem pelo uso do termo cativo). Começo pela comparação que você fez entre os objetivos de uma terapia psicológica e a cura no sentido de restabelecimento do estado anterior a uma doença.
Sua observação carece de sustentação no que diz respeito aos objetivos de uma terapia psicológica. Estes, se não forem definidos em termos de mudanças que resultem em comportamentos efetivos (quer ao nível cognitivo, atitudinal ou comportamental mesmo), terá sido em vão a “terapia”, terá o cliente perdido precioso tempo de sua vida e dinheiro. Não devemos confundir terapia psicológica com conversa fiada ou papo-cabeça; se a psicologia se diz científica, há de ter bem definidos seus objetivos de trabalho e alcance de suas propostas terapêuticas. Note-se bem (aqui falo também para meus alunos e demais alunos psi), esta é uma questão delicada para competentes psicólogos e psicólogas das mais diferentes áreas de atuação da Psicologia. Entrementes, tirante sua assertiva a respeito da ética e competência da senhora Rozângela Justino, a quem já manifestei solidariedade por achar que está sendo transformada em bode expiatório dos pecados (contradições) da própria Psicologia clínica, concordo plenamente com você quando diz: “A cura no sentido de restabelecimento do estado anterior a uma doença é um privilégio da medicina e só existe para patologias provocadas por vírus, bactérias ou fungos ou por disfunções orgânicas e hormonais ou, ainda, para certos tipos de câncer. Homossexualidade não é doença, logo, não precisa de cura.”
A psicologia clínica adotou o modelo médico de doença/cura. Fala-se de “dor psíquica”, “sofrimento psicológico”, sem sequer mencionar tratar-se de pura metáfora. Talvez aqui grande parte da confusão gerada por algumas declarações da psicóloga Rozângela.
Se a homossexualidade é uma orientação da sexualidade, como asseverou o presidente do CFP ao SBT, por outro lado temos, nós, os profissionais da área da saúde, onde a Psicologia se inscreve, a Classificação Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde em que aparecem várias manifestações comportamentais relacionadas à sexualidade (CID-10 – F60-F69 Transtornos da personalidade e do comportamento do adulto). Os transtornos específicos da personalidade (F60.-), os transtornos mistos e outros transtornos da personalidade (F61.-), e as modificações duradouras da personalidade (F62.-), representam modalidades de comportamento profundamente enraizadas e duradouras, que se manifestam sob a forma de reações inflexíveis a situações pessoais e sociais de natureza muito variada. Eles representam desvios extremos ou significativos das percepções, dos pensamentos, das sensações e particularmente das relações com os outros em relação àquelas de um indivíduo médio de uma dada cultura. Tais tipos de comportamento são geralmente estáveis e englobam múltiplos domínios do comportamento e do funcionamento psicológico. Freqüentemente estão associados a sofrimento subjetivo e a comprometimento de intensidade variável do desempenho social.
Ora, deve ser fora de dúvida que a Psicologia não é a “medicina da alma”, e se concordarmos com o senhor Humberto Verona (presidente do CFP), destarte nada lhe cabe fazer/dizer sobre a agressividade (orientação do temperamento), a pedofilia (orientação da luxúria às crianças), o assassinato (orientação do caráter irado a outrem), e por ai vai … Essas “coisas” deveriam ser encaradas como “normais/naturais” – como em verdade o são! -, mas isso não significa que não possam ser alteradas ou mudadas, como de resto qualquer comportamento, inclusive o comportamento (orientação) homossexual.
Gay não é nem deveria ser sinônimo de felicidade (não se confunda alegria com folia). A felicidade, no plano do puramente imediato, é a busca incessante por evitar a infelicidade. A felicidade está para a vida em uma relação de equilíbrio instável, assim como a saúde, a alegria etc..
Se houve tempo em que o “padrão hetero” era considerado o normal, o “desejável” etc., agora, parece que o “politicamente correto” é o “padrão homo”… Preconceitos sempre haverá, e sempre os teremos conosco, portanto, politicamente correto, do ponto de vista pós-moderno, deveria ser o respeito à diversidade: minha verdade não é real, é apenas a minha verdade…
O que devemos combater, no âmbito da ciência, são as pseudo-verdades, mesmo aquelas que se revestem de dogma fundamentalista; aliás, estas são as que mais deveriam ser relativizadas.
Enfim, não me causa surpresa esse imbróglio todo em que se meteu o CFP: o que deveria ser dito é que a psicologia clínica é uma técnica, ou melhor, conjunto de técnicas (strictu sensu não é ciência); é uma atividade que não consegue separar/controlar em suas práticas ditas “curativas” aquelas variáveis intervenientes que competem, juntamente com a remissão espontânea e a auto-sugestão, para a melhoria da queixa do cliente.
A Psicologia como um todo, e em particular a psicologia clínica, deveria adotar um sistema de referência baseado na educação, não no modelo médico, um modelo de intervenção baseado na possibilidade sempre presente do ser humano modificar seu comportamento, “ajustando-o” a seus próprios imperativos e àqueles que julgar oportunos e desejáveis; a Psicologia deveria, antes de mais nada, ser um atividade da área da Educação.
Adição (dependência, vício) a drogas é considerada doença e grande parte das pessoas a encara como algo curável. Entrementes, quando se considera alguém em vias de se viciar, penso que deveríamos encará-la como um problema de educação, portanto, passível de ser revertido ou modificado. Ressalte-se: as drogas, segundo aqueles que delas fazem uso frequente e delas dependem, trazem grande prazer e parecem ser algo para o qual se sentem compelidos, chamados, “orientados”.
A “cura da homossexualidade” não se dá no plano do desejo, do querer, ou no plano da “orientação” ou do mental como causa do comportamento, senão, no plano do próprio comportamento, não como “cura”, é óbvio, mas como aquisição de novos comportamentos e extinção daqueles que nos trazem infelicidade (veja bem: não estou falando de sofrimento ou desprazer, posto que isso sempre teremos, quer sejamos hetero, homo, bi ou “a”ssexuais…).
A verdade está nas pessoas, em todas as pessoas; as pessoas são a verdade. Isto posto, devemos cuidar e relativizar nossas crenças e verdades. Há, sim, hoje, certos aspectos da militância de certos setores gay que se assemelham às técnicas nazi (vide o filme, recém lançado, “A Onda”) utilizadas para, sub-repticiamente, “implantar” o padrão “homo” como o correto/adequado/’desejável’. Não se trata, evidentemente, da guerra deflagrada pelo III Reich, nem do tratamento dado a não-arianos, negros, ciganos e, como você lembrou, aos homossexuais (os quais eram vistos como espécimes que degeneresciam a espécie humana, não somente a raça ariana – efetivamente, “a militância gay não é Nazismo …”). E veja bem, meu caro Jean, aqui não se trata de cinismo, posto que a homossexualidade pura e simples, ou seja, do ponto de vista de práticas sexuais que impliquem (mais uma vez, note bem, não estou dizendo que implicam – referi-me ao tempo presente do subjuntivo com uma conotação condicional futura, não ao presente do indicativo) em ausência de reprodução biológica, é, sim, antinatural, não anormal. Enfatize-se: antinatural do ponto de vista da reprodução sexuada exceção feita à bissexualidade, a qual, por convenção discursiva/ideológica, não se trata de homorientação, nem implica em ausência de reprodução , como também o é o voto de castidade auto-imposto ou aceito como condição para pertencer a determinados segmentos religiosos.
Jean, seus comentários e tratamento depreciativo em relação à psicóloga Rozângela Justino desnudam seu moralismo (concepção acerca dos modos de-vir-a-ser e se comportar em sociedade expresso em regras) em relação a quem pensa diferente de você e se opõe ao seu presumido purismo de pensamento e idéias. Alguns dizem (por exemplo, Arnaldo Jabor) que os gays odeiam as mulheres por quererem ser como elas sem o poder: será que não é o caso?! O que falta para seu discurso ser absorvido como a nova ordem moral e social? Para ser constituído como os novos cânones dos novos tempos, da novíssima religião, e da “moderna” família?
Lembremo-nos: dialeticamente falando, amanhã, suas (e nossas) crenças estarão sendo questionadas por novas crenças; portanto, conceitos como “conservador”, “tradicional” etc. são relativos a um dado tempo e lugar social.
Sim, internalização ideológica é isso que você diz: “É possível que os oprimidos se identifiquem com a ideologia de seus opressores mesmo sem terem consciência disso …”. A questão maior é identificar quem efetivamente nos oprime, e o que nos oprime. Enquanto espécie, tudo nos oprime, ou seja, o que oprime a uns e outros, a mim também oprime; enquanto gênero, o que oprime os homens, a mim oprime; enquanto grupo social, temos direito de reivindicar igualdade quando a diferença nos oprimir, e de reivindicar diferença, quando a “igualdade” nos for desfavorável; enquanto indivíduo, apenas eu sei o que me oprime. É por isso que existem negros e brancos racistas e homossexuais e heterossexuais moralistas de toda ordem (“O problema não é que os brancos não se juntam com os negros. O problema é que as pessoas não saem de sua vizinhança. A verdadeira liberdade para um holandês é a liberdade de não ser holandês. E, para um africano, não ser um africano. É a liberdade de expandir constantemente sua definição do que você pensa e experimenta, sempre permitindo novas possibilidades”, Ben Okri – escritor nigeriano ganhador do prêmio Booker – in: revista Ode, 2003, p. 23). Por isso também é possível que muitas pessoas, que não resistem às pressões e violências diversas impostas pela ordem em que vivem tendem a procurar os consultórios dos psicanalistas e psicólogos em busca de soluções fáceis e “curas” para seus males d’alma. “Eu devia estar contente … e agora eu me pergunto … (Raul Seixas Ouro de tolo).
Tudo, praticamente tudo que supomos ter ou saber, é internalizado. Tudo, praticamente tudo, é idealismo. Tudo, praticamente tudo, é abstração (exceção: eu abstraindo).
Infelizmente, meu caro Jean, parte da Psicologia “virou” doutrinação quase religiosa; na verdade, mistificações pseudo-cientificas, quase panacéia. A psicóloga Rozângela talvez seja a mais honesta e corajosa nessa tendência.
Usando Foucault contra Foucault na microfísica do poder: Que tipo de discurso queremos desqualificar quando dizemos: não é científico … É engraçado: nunca ouvi um machista dizer: tenho orgulho em ser macho. Não preciso dizer: tenho orgulho em ser gente (na verdade, em muitos aspectos tenho vergonha em pertencer a essa espécie que, em vários momentos, vários de seus representantes, em nome da liberdade, já cometeram milhares de crimes; em nome da verdade, quiseram ou fizeram calar minorias ou quem deles divergia; em nome da democracia, impõem seus interesses mesquinhos oprimindo minorias).
Há muitos anos assisti um episódio de seriado de TV que não lembro o nome. Era sobre o dia-a-dia de uma família ampliada. O episódio ao qual quero me referir retratava o envelhecimento da vovó da família e os surtos de psicose senil que começava a apresentar. Certa feita, filha e neta da vó conversavam sobre “a doença” do ente querido. A menina indagava à mãe se ela também não estaria “doente”, pois quando brincava com suas bonecas se comportava como sua avó, que conversava com pessoas que não estavam presentes (vivas). A mãe, então, dá uma resposta porreta à criança:
– Filha, você sabe que está brincando, sua vó não.
Se você diz que fala com Deus, você está rezando; se diz que um deus fala com você, você está mitificando algo, talvez equivocado; agora, se diz que é deus, você está delirando (um deus não tem pai). Estas as diferenças entre um surto psicótico e o vácuo de um ato de fé, a qual é, antes de tudo, ato de coragem.
Jean, subverto sua premissa culturalista e de muitos pensadores: nós humanos, somos seres biologicamente culturais, no sentido de que nenhuma cultura se constrói no vazio, e uma vez constituídos, biologia e cultura se projetam indefinidamente inseparáveis: o “banho de linguagem” se dá num órgão (útero) preparado pela evolução biológica para tal, como em todos os demais mamíferos; desde recém-nascidos já estamos forjados para compreender e utilizar os implementos culturais, portanto, pouca coisa em nossa subjetividade é subjetiva ou vem apenas da cultura.
“Uma identidade sexual é estruturada de maneira complexa e envolve muitos elementos: desde as experiências de prazer e desprazer na mais terra infância em relação aos pais ou a quem os represente, até representações culturais, passando por fatores biológicos”, dentre os quais o mais importante, sem dúvida, é o cérebro que temos e o modo como a filogênese (e em particular a embriogênese) o moldou para processar e responder aos estímulos do meio ambiente (por exemplo: sentir-se atraído por um macho ou por uma fêmea – de propósito utilizo o conceito biológico). A definição sexual se dá a nível cerebral: há, por assim dizer, um cérebro feminino e um cérebro masculino – em verdade, há toda uma gradação entre o processar as informações mais ao modus masculino ou feminino . E, óbvio, não se confunde necessariamente com a prática sexual. Esta pode ser um componente da identidade sexual, que diz respeito mais a pertencimento; a um “lugar” no mundo. Sei que você entendeu.
Sabe, Jean, os animais também têm cultura (é claro que não se trata de uma cultura humana, posto que não são humanos). Muitas pesquisas no campo do comportamento animal, particularmente no campo da primatologia, no qual sou especialista, indicam que grupos diferentes de uma mesma espécie usam diferentes estratégias de forragear; em outra linha de pesquisas, temos que diferentes espécies apresentam diferentes sistemas reprodutivos (não falo de aparelho reprodutivo, antes de sistemas de acasalamento), bem como diferentes estruturas sociais (há desde grupos formados com apenas um macho dominante (“reprodutor” e a quem cabe a defesa primária da “família”) e várias fêmeas e suas crias – seriam eles “mulçumanos”?! , até grupos poliândricos, outros multi-machos e multi-fêmeas (onde parece haver uma “promiscuidade” maior …). Enfim, a classe dos primatas manifesta uma ampla variedade de formas de organização social (o que pode indicar, do ponto de vista evolucionário, a espécie Homo sapiens como a caudatária desse complexo movimento da vida e suas formas de expressão).
Fazer sexo, portanto, é carnaval (lembrando Rita Lee), ter uma relação sexual é manifestar mais do que uma identidade sexual, é relacionar-se em totalidade, inclusive manifestando seu “sexo cerebral” (masculino, feminino ou masculino-feminino, feminino-masculino – dá-lhe Pepeu!). O reino animal faz sexo (talvez sem se preocupar com a reprodução); o gênero humano pode fazer do sexo algo mais (inclusive planificando a reprodução). E esse algo mais depende, em grande medida, da psique de cada qual.
O homem desnaturalizou a natureza, e infelizmente hoje já não sabemos o que é natural ou anti-natural. A promessa tentadora de todos os tempos: nos tornarmos como deuses, conhecendo o Bem e o Mal. Nosso destino inescapável: nascer, crescer e morrer o que efetivamente, indubitavelmente, inquestionavelmente conhecemos para além disso?!
Seja feliz, Jean Wyllys.
a) Edson Frazão