Importação de camelo X Transposição de água para o RN, artigo de Eugênio Fonseca Pimentel
[EcoDebate] Otto Brito Guerra descreve sobre o título “Camelos no Ceará”, que o nosso mestre Câmara Cascudo analisou sobre este assunto em dois de seus livros, História da Alimentação no Brasil, Companhia Editora Nacional, RJ, 1967, e Civilização e Cultura, Livraria José Olímpio Editora, RJ. 1973:
Na história da luta contra os efeitos da seca, existe um episódio pitoresco e pouco conhecido. Trata-se da experiência de aclimatação do camelo em nossas terras. Quando governava a província do Ceará, o senador Padre José Martiniano de Alencar pensou em importar camelos em 1837, através de lei, entretanto lhe revogaram a execução. Mas ficou a idéia. Seria renovada pouco mais tarde pelo engenheiro Guilher de Capanema, um dos integrantes da Comissão Científica de Exploração, nomeada pelo Governo Imperial para realizar estudos no interior do Brasil e que escolheu a Província do Ceará para seus estudos. Segundo se colhe em Renato Braga (História da Comissão Científica de Exploração, reeditada pela Coleção Mossoroense, vol. CC, 1982 p. 52 segts) de quem tiramos todos estes informes, pareceu ao barão de Capanema que o camelo poderia substituir os cavalos nos transporte de cargas pelo interior do Nordeste, sobretudo nos anos de seca, quando morriam de fome e sede tantos animais.
Homem decidido tratou de convencer o Governo Imperial das vantagens dessa nova alternativa e por intermédio da Sociedade de Aclimatação, fechou o negócio para a aquisição de 14 dromedários, sendo 4 machos e 10 fêmeas. Tudo resolvido, levaram os animais para a barca francesa “Splendide”, no porto de Argel (África), chegando a Fortaleza no dia 24 de julho de 1859, acompanhados de 4 tratadores argelinos.
É fácil imaginar a movimentação do povo, enchendo a praia para ver a novidade. Não faltou a solene presença do presidente da Província. Foram os animais recolhidos ao Depósito Municipal e causaram muito assombro às pessoas simples, que viam neles o “Anticristo” e mais de um comboio com que cruzaram se dispersou, ante o espanto das cavalgaduras, que por vezes derrubavam as cargas.
Cerca de um mês depois Capanema e o poeta Gonçalves Dias, ambos da Comissão Científica, decidiram viajar num deles, com destino a Baturité, uns 100 Km de Fortaleza. A caravana se compunha-se de 4 dromedários (aquele que só tem uma corcova), com 2 tratadores argelinos, levando cargas. Os dois membros da Comissão acomodaram-se na barraca armada nas costas de um dos dromedários. Por sinal, quando este, que tinha que ficar ajoelhado para o embarque, na forma habitual, se levantou e os dois viajantes quase vão por terra, com a sacudidela. Dada a partida final, “entre palmas e gargalhadas”, não faltou a gritaria da molecada.
Adianta o cronista que a viagem foi penosa e logo em Pacatuba os dois passageiros preferiram passar para o tradicional cavalo de cela, meio “mareados” com o balanço do Dromedário. Outra viagem a Baturité ainda se realizou, em fins de outubro, mas só com os argelinos e um dos camelos quebrou a perna, morrendo depois, por trato inadequado.
Particularmente acho, que a importação de água para o rico em água RN, poderá ter o mesmo desfecho da importação de camelo para o Ceará. Nosso pequeno RN, já tem o seu jumento nosso irmão do saudoso jesuíta Padre Antônio Vieira, que eu posso chamar com toda propriedade de “o pequeno grande camelo do sertão nordestino”, imbatível no transporte de pessoas e cargas em solos compactos, finos e pedregosos, por vezes ausentes no chão desta região semi-árida região do Brasil. Esses jericos também chamados de jegues, jumentos, burros, animais robustos tão bem adaptados ao nosso clima e chão, não entrópica e nem tão pouco caem em caminhadas sobre solos desta natureza. O grande Luis Gonzaga Lula da Silva, o rei do Baião, em umas de suas famosas canções, Apologia ao Jumento, enaltece esse útil e manso animal que inclusive transportou nosso rei, nosso Senhor Jesus Cristo na longínqua região da Palestina. Exclamava o eminente cantor e sanfoneiro: Eu gosto dele, ele é servidorzinho que é danado. E é mesmo. O que quero explicar através de parábola é que temos muita água no subsolo. que podem ser aproveitada através de perfuração de poços profundos. Observe resumo a seguir;
RECURSO HÍDRICO SUBTERRÂNEO NO RN
Com o intuito de esclarecer de maneira simples, clara e objetiva a sociedade brasileira, interessada no tema Recurso Hídricos do Semi-árido do Brasil, do expressivo volume de água existente na formação geológica denominada de Formação e sua importância no contexto hidrogeológico regional, pretendo informar, que utilizando dados de 341 testes de formação, perfis elétricos, acústicos, radiativos e litológicos em 247 poços os geólogos e técnicos da PETROBRÁS/DEPEX/DEBAR, Otacílio Raulino de Souza, Francisco Fontes Lima Neto e João de Deus de Souto Filho, na ATA DO XI SIMPOSIO DE GEOLOGIA DO NORDESTE, Natal (RN), maio de 1984, pagina 330, escreveram as seguintes considerações sobre a HIDRODINÂMICA DO AQUIFERO AÇU – BACIA POTIGUAR:
A Formação Açu, com cerca de 1,5 trilhões de metros cúbicos de água em reserva permanente, porosidade entre 20 e 28 por cento e permeabilidade atingindo a milhares de milidarcies, é o melhor aqüífero da área sedimentar, quer pelas vazões individuais de poços que chegam a atingir a 400 metros cúbicos horários, quer pela qualidade da água em geral dentro dos padrões oficiais de potabilidade.
As águas subterrâneas da Bacia Potiguar constituem notável recurso hídrico, suficiente para suportar atividades agropecuárias nas épocas de estiagem e complementar o abastecimento pluvial nos períodos chuvosos.
Os técnicos da Petrobras, empresa brasileira do mais alto gabarito que como nenhuma outra no país, conhece melhor e em profundidade a dimensão do recurso hídrico subterrâneo da Bacia Potiguar, uma vez que já perfurou mais de 3.000 poços na região, enfatizam ainda na pagina 336, a importante e estratégica reserva hídrica situada na região semi-árida nordestina, concluindo que:
Uma reserva permanente de cerca de 1,5 trilhões de metros cúbicos de água estão disponíveis na Formação Açu, prontas para serem explotadas através da perfuração de poços artesianos, constituindo excelente meio auxiliar para o combate a seca no estado do Rio Grande do Norte.
Na região Agreste Potiguar, mais precisamente na porção nordeste do estado do RN, há abundancia de recurso hídrico e subutilização deste recurso. Nessa região existem diversas faixas de terras encharcadas que muitas vezes precisam ser drenadas. Essas faixas se estendem por vários vales úmidos tais como Pitimbu, Estrela, Ceará – mirim, Maxaranguape, Punau entre outros, que segundo os pesquisadores da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, UFRN, de renome nacional, João Medeiros Filho e Itamar de Souza em seu livro intitulado “A Seca no Nordeste Um Falso Problema” (editora vozes, 1988, pagina 60) descreveram as seguintes considerações sobre essa região:
A zona de terras encharcada é um velho problema para esta região, preocupação de sucessivas administrações e que, infelizmente, continua ainda hoje insolúvel com prejuízos sensíveis para o desenvolvimento das nossas fontes produtoras.
Do exposto, é interessante observar que nesta região de vales úmidos a abundância de água constitui um problema e não uma solução para o desenvolvimento sustentável dessa região.
Quanto as reservas explotáveis do aqüífero Açu, assim afirma Rebouças na qual considero como o melhor hidrogeólogo do Nordeste do Brasil: “Considerando-se a demanda da população dentro de 20 anos (100 milhões de metros cúbicos por ano), verifica-se que as suas reservas exploráveis seriam somente esgotáveis ao longo de 400 anos de exploração continua, isto é 1/3 das suas reservas totais (1967)”.
Eugênio Fonseca Pimentel: Geólogo, pesquisador da Agenda 21 Local, Gestor Ambiental e Agente Ambiental Voluntário do RN – AAV
EcoDebate, 29/07/2009
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Meu caro Eugênio Fonseca Pimentel:
Sua história sobre os dromedários é muito interessante. O senador José Martiniano de Alencar, pai de nosso famoso romancista José de Alencar, não atinou para o fato de que os dromedários ficam muito tempo sem beber porque têm um grande reservatório interno que – dizem – lhes garante passar até 15 dias sem água.
O problema é que, para realizarem essa façanha, precisam encher o reservatório e nem sempre vão encontrar no sertão água disponível para tal.
Por isso, acho que os portugueses foram muito mais inteligentes que Alencar e Capanema ao importar os jegues da Europa, que se adaptaram muito melhor ao clima hostil do semi-árido nordestino.
Carece, no entanto, de analogia o cômico episódio dos dromedários com a suposta disponibilidade hídrica do Nordeste.
Esse é um assunto que, de tão repetido, está acabando por ser aceito até mesmo pelas nossas autoridades. Há cerca de dois anos, compareci à Assembleia Legislativa de Minas Gerais para um debate a respeito da transposição de águas do rio São Francisco para o Nordeste Setentrional e o secretário do Meio Ambiente soltou essa pérola: Se o Nordeste Setentrional explorar apenas a água de seu subsolo, o abastecimento estará garantido por 20 anos sem uma gota de chuva.
Ouvindo isso, pensei comigo: O Guarani que se cuide, pois parece que o Nordeste está desbancando o maior aqüífero subterrâneo do mundo!
Brincadeiras à parte, gostaria de fazer alguns comentários sobre a pesquisa da Petrobras.
Primeiramente, é preciso deixar claro que a Petrobras não foi procurar água no Nordeste; foi procurar petróleo.
Todo o know-how da empresa é direcionado exclusivamente para a pesquisa, armazenamento, refino e distribuição de petróleo. Os poços de petróleo têm centenas de metros de profundidade, o que é inviável em um poço artesiano.
O relatório da Petrobras tem ainda menor validade quando se observa que foi feito em 1984, quando hoje dispomos de tecnologias muito mais modernas de pesquisa de água subterrânea.
Quanto à reserva explotável de 100 milhões de metros cúbicos por ano do aqüífero Açu, jamais utilizada, temos que fazer o mesmo reparo, principalmente levando em conta que foram avaliadas antes mesmo do relatório da Petrobras em 1984, ou seja, em 1967, por meio de cálculos teóricos que admitiam uma porosidade de 20 a 28%, quando se sabe que o solo cristalino não tem porosidade maior que 1%.
Caso o Nordeste estivesse assentado sobre esse mar de água doce de que tenho ouvido falar ultimamente, podemos todos estar certos de que há muito já teria sido aproveitado.
Ao invés de fazer tantos açudes, barragens subterrâneas, importar dromedários e, ultimamente, buscar água do rio São Francisco, o povo nordestino exploraria esse enorme potencial hídrico que supostamente teria.
Senhor
Paulo Afonso da Mata Machado
Você conhece muito pouco o semi-árido do Brasil. Faço um desafio. Ofereço um carro com tanque cheio de combustível para Você vir aqui mostrar onde começa e termina o aqüífero Açu, seu contato geológico com a Formação Jandaira e outros tipos de litologias tanto do lado esquerdo como do lado direito do rio Açu. Eu não estou afirmando que o aqüífero Açu é maior que o Guarani. O aqüífero Açu possui água em abundancia e de boa qualidade subutilizada. Faz parte da Bacia costeira Potiguar e não de bacia inserida no interior do embasamento cristalino como Você advoga. Sua opinião é muito pífia, incorreta e parece está defendendo interesse de empreiteiros corruptos.