Restrições à reforma em bem tombado independem de sua individualização
Exemplo de Tombamento: Edifico sede da loja Lâmpada, na rua Pinto Martins, Salvador, BA. Foto de Sebastião Bisneto / Agência A Tarde
O impedimento de destruir, demolir ou mutilar ou mesmo reparar, pintar ou restaurar bens tombados sem prévia autorização do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional se aplica a todos os bens nessa condição. O entendimento da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça é que essa restrição é válida independentemente de individualização do bem no tombamento geral. A decisão mantém a condenação de uma proprietária a restabelecer o estado anterior de um imóvel na cidade histórica de Tiradentes, em Minas Gerais.
A dona do imóvel recorreu ao STJ após a decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF), que, em ação civil pública ajuizada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), entendeu que o conjunto arquitetônico e urbanístico da cidade de Tiradentes, tendo sido tombado como patrimônio histórico e artístico nacional, encontra-se amparado por regime especial de proteção, submetendo-se à legislação de regência qualquer alteração nas suas características originárias, condicionando-se qualquer mudança no imóvel, público ou particular, que o integra à apresentação e aprovação de projeto arquitetônico junto ao Iphan.
Para o TRF, demonstrada, por meio de prova documental e fotográfica, a agressão às obras realizada sem a devida autorização do órgão competente, devem ser demolidos todos os acréscimos promovidos irregularmente, excetuando-se o resultado da reforma cujo projeto foi aprovado pelo Iphan, de modo a recompor as feições do bem tombado, de acordo com os critérios e recomendações estabelecidos pelo próprio instituto.
Em sua defesa, a proprietária alegou que, ao aplicar o artigo 17 do Decreto-Lei 27/32, o Tribunal se equivocou quanto ao conceito de tombamento geral, uma vez que é da essência a individualização do bem, de forma que a norma não poderia ter eficácia para alcançar todos que não foram submetidos a esse procedimento legal, que é, a seu ver, indispensável. Além disso, argumenta que, como o imóvel não está tombado individualmente, cabendo ao proprietário apenas respeitar as limitações administrativas, pode, por essa razão, realizar reforma, pintura ou construção do imóvel.
O ministro Humberto Martins, relator do recurso no STJ, entendeu ser incongruente o argumento da proprietária da falta de individualização no tombamento, se ela sabia claramente haver as restrições impostas pelo Decreto-Lei 25/37, já que solicitou autorização ao Iphan para a realização da obra e desrespeitou os limites estabelecidos pelo órgão.
O relator rejeitou, ainda, a divergência de jurisprudência alegada por não haver semelhança com os fatos tratados na decisão apresentada como referência – na qual não houve demolição, destruição ou mutilação do bem tombado – diante do reconhecimento pelo tribunal mineiro do caráter agressor das obras realizadas no imóvel de Tiradentes.
Coordenadoria de Editoria e Imprensa
Superior Tribunal de Justiça
RECURSO ESPECIAL Nº 1.098.640 – MG (2008/0225528-9)
RELATOR : MINISTRO HUMBERTO MARTINS
RECORRENTE : VANILCE APARECIDA BARBOSA
ADVOGADO : ANTÔNIO CARLOS DE ALMEIDA CASTRO E OUTRO(S)
RECORRIDO : INSTITUTO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E ARTÍSTICO
NACIONAL – IPHAN
PROCURADOR : CRISTIANO SALES CÚRCIO E OUTRO(S)
EMENTA
ADMINISTRATIVO – RECURSO ESPECIAL –
TOMBAMENTO GERAL – CIDADE DE TIRADENTES –
POSSIBILIDADE – DESNECESSIDADE DE INDIVIDUALIZAÇÃO
DO BEM – PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO ARQUITETÔNICO,
HISTÓRICO E CULTURAL – DESRESPEITO À NOTIFICAÇÃO
EXTRAJUDICIAL DO IPHAN – RECURSO ESPECIAL
IMPROVIDO – DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO
CONFIGURADA – AUSÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA.
1. Não é necessário que o tombamento geral, como no caso da cidade de Tiradentes, tenha procedimento para individualizar o bem (art. 1º do Decreto-Lei n. 25/37). As restrições do art. 17 do mesmo diploma legal se aplicam a todos os que tenham imóvel na área tombada. Precedente.
2. É incongruente a alegação da recorrente de que o bem não foi individualizado no tombamento, se sabia claramente das restrições impostas pelo Decreto-Lei n. 25/37, uma vez que, inclusive, solicitou autorização ao IPHAN para a realização da obra e desrespeitou os limites estabelecidos pelo órgão.
3. A divergência jurisprudencial não pode ser conhecida por ausência de similitude fática, tendo em vista o reconhecimento do acórdão recorrido do caráter agressor das obras e reconhecimento pelo acórdão paradigma da ausência de demolição, destruição ou mutilação do bem tombado.
Recurso especial conhecido em parte e improvido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima
indicadas, acordam os Ministros da SEGUNDA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, “A Turma, por unanimidade, conheceu em parte do recurso e, nessa parte, negou-lhe provimento, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a).”Os Srs. Ministros Herman Benjamin, Mauro Campbell Marques, Eliana Calmon e Castro Meira votaram com o Sr. Ministro Relator.
Documento: 5539307 – EMENTA / ACORDÃO – Site certificado – DJ: 25/06/2009 Página 1 de 2
Superior Tribunal de Justiça
Dr(a). PEDRO IVO RODRIGUES VELLOSO CORDEIRO, pela parte
RECORRENTE: VANILCE APARECIDA BARBOSA
Brasília (DF), 09 de junho de 2009(Data do Julgamento)
MINISTRO HUMBERTO MARTINS
Relator
* Colaboração de Luis Fernando Cabral Barreto Junior, Promotor de Justiça de Meio Ambiente do MP do Maranhão, colaborador e articulista do EcoDebate.
EcoDebate, 23/07/2009
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