EUA: Com aumento de energia eólica, cresce pressão para desmontar hidrelétricas
Turbinas na fazenda de John Hildebrand alimentam o sistema da Bonneville Power Administration. Foto de Leah Nash, no The New York Times
Durante décadas, a maior parte da energia renovável dos EUA veio de hidrelétricas, que forneciam eletricidade barata sem necessidade de combustíveis fósseis. Mas os órgãos federais que controlam as hidrelétricas normalmente registram resultados terríveis em relação a outros impactos ambientais.
Agora, com o empenho de Washington em incentivar a energia limpa, algumas agências governamentais que controlam as hidrelétricas começaram a investir em energia eólica e na conservação energética. A mais ativa é a Bonneville Power Administration, cujas linhas de força transmitem a maior parte da eletricidade para a região nordeste junto ao Pacífico. A agência também é responsável por um terço do suprimento de energia da região, fornecida em sua maior parte por geradores de grandes hidrelétricas. Por Kate Galbraith, em Wasco (Oregon), no The New York Times.
A quantidade de energia eólica do sistema de transmissão Bonneville quadruplicou nos últimos três anos e espera-se que daqui a dois anos esse número dobre. As turbinas eólicas estão deixando ainda mais verde o sistema energético de baixas emissões de carbono – em Seatle, mais de 90% da energia vem de fontes renováveis.
Mesmo assim, a mudança enfatizada pelas agências que controlam as hidrelétricas está longe de ser simples. Ela pode afinal colocar uma meta ambiental contra a outra, numa tensão que está surgindo em vários projetos de energia renovável em todo o país.
Grupos ambientalistas afirmam que a transição para turbinas eólicas da Bonneville Power Administration reforça o argumento para desmantelar as indústrias hidrelétricas no território controlado pela agência, principalmente ao longo do baixo rio Snake no Estado de Washington, onde elas contribuíram para dizimar uma das maiores populações de salmão selvagem da América do Norte.
A Bonneville quer manter todas as hidrelétricas, argumentando que elas não só fornecem energia barata, mas também são um complemento ideal para a instalação em grande escala da energia eólica. Quando o vento perde velocidade e a produção de energia cai, elas podem compensar rapidamente, bastando avisar o Corpo de Engenheiros do Exército e o Departamento de Reclamações, que operam as hidrelétricas, para liberar mais água dos reservatórios e fazer girar os geradores gigantes.
Quando o vento fica mais forte, as operações das hidrelétricas podem ser reduzidas.
As hidrelétricas ajudariam a aliviar a necessidade de indústrias de energia de gás natural em outras regiões, que também são uma fonte alternativa quando o vento fica mais fraco, mas que liberam dióxido de carbono que contribui para o aquecimento global.
Equilibrando a energia eólica com a hidrelétrica, a Bonneville Power Administration acredita que pode restringir o uso de gás natural e carvão no oeste do país, mesmo que a demanda por energia na região aumente. Em todo o país, as hidrelétricas são responsáveis por 6% da geração de energia – o dobro da quantidade gerada por outras fontes renováveis como vento, energia solar e biomassa – e a maior parte disso está concentrada no oeste.
O aumento do uso do vento no sistema da Boneville surgiu como resultado de metas para energia renovável estabelecidas por governos dos Estados do Oeste, que têm como objetivo reduzir sua emissão de gases de efeito estufa.
A Bonneville diz que quando o vento chega ao máximo de sua força, gera 18% da energia na região que ela controla, e o número pode aumentar para 30% no ano que vem. (Nem toda essa energia é consumida na região Nordeste-Pacífico; parte dela é vendida para a Califórnia.)
O aumento da energia eólica significa que a agência funciona como uma espécie de teste para o resto do país, de como integrar grandes quantidades de energia eólica intermitente em uma rede elétrica regional. “Descrevo isso como um grande experimento”, disse Stephen J. Wright, administrador da Bonneville Power Administration, que tem 72 anos de existência.
A agência enfatiza que é um desafio garantir que as luzes permaneçam acesas a despeito dos altos e baixos do vento. Muitas das novas fazendas de energia eólica ficam ao longo do corredor tempestuoso do rio Columbia, e sua concentração no mesmo local significa que as mudanças no vento podem ocasionar quedas e aumentos abruptos na geração de energia.
“No espaço de uma hora, a potência do vento pode cair do máximo para o zero”, disse Wright.
Por causa dessa natureza errática, a energia eólica – e a necessidade de hidrelétricas como fonte alternativa – está interligada ao destino do salmão, talvez a maior controvérsia na região do Nordeste-Pacífico.
Durante décadas, ambientalistas, pescadores e alguns políticos locais que querem salvar o salmão ameaçado, lutaram contra a Bonneville e o Corpo de Engenheiros do Exército, que querem manter as hidrelétricas do baixo rio Snake. Um juiz federal que arbitrou a disputa acusou as agências federais de não se esforçarem o suficiente para salvar o salmão e levantou a possibilidade de abrir vãos nas hidrelétricas para ajudar o peixe.
O salmão selvagem nada pelo rio em duas direções. Eles se reproduzem subindo o rio, e os peixes jovens nadam com a correnteza em direção ao Oceano Pacífico. Eles passam vários anos no mar, alimentando-se e crescendo, antes de subir o rio novamente para se reproduzir e morrer.
As grandes represas criadas ao longo das décadas, assim como as barragens que foram construídas, retardaram e complicaram a jornada do salmão, e reduziram drasticamente suas taxas de sobrevivência. Há degraus para ajudar os peixes a subirem o rio, mas os salmões que atravessam em ambas as direções acabam traumatizados e enfraquecidos, dizem os biólogos.
Para ajudar o salmão, a Bonneville foi “obrigada contra sua vontade, chutando e gritando, durante cada centímetro do caminho”, disse Beill Arthur, representante do Sierra Club na região nordeste. Arthur elogiou os esforços da agência em investir em energia eólica, mas argumentou que as quatro hidrelétricas mais abaixo do rio Snake, que são bem menores do que as principais, como Grand Coulee, não são necessárias para apoiar a energia eólica.
Em vez disso, ele propôs colocar turbinas eólicas em mais lugares, para ajudar a equilibrar a geração de energia, assegurando que sempre haja alguma em algum lugar que esteja ventando, ou então depender mais das fábricas de gás natural do nordeste, além de tomar medidas de economia de energia. Ele também observou que, se as hidrelétricas forem eliminadas, levará seis anos ou mais para desmontá-las, permitindo tempo suficiente para planejar a transição para as novas fontes de energia.
Elliot Mainzer, vice-presidente de estratégia corporativa da Bonneville Power Administration, disse que desmantelar as hidrelétricas do rio Snake “prejudicaria inequivocamente a capacidade da agência de assimilar a energia eólica em seu sistema, por causa do papel delas em equilibrar a geração irregular de energia eólica”.
Mesmo com a controvérsia do salmão, a agência quer construir mais linhas de energia para acelerar o desenvolvimento de fazendas de energia eólica em áreas remotas com bastante vento.
O pacote de estímulo econômico aprovado em fevereiro vai ajudar: ele aumentou drasticamente a quantia máxima que a agência pode emprestar do tesouro americano, de US$ 4,45 para US$ 7,7 bilhões. (Outra agência que controla hidrelétricas, a Western Area Power Administration, recebeu um impulso semelhante e planeja aumentar suas linhas de transmissão para acrescentar energia eólica e outras fontes de energia renováveis.)
A Bonneville diz que a injeção de capital permitirá a realização de um projeto de transmissão de US$ 246 milhões ao longo do rio Columbia, com desenvolvedores instalando mais turbinas eólicas em outras áreas do leste de Oregon, e também mais linhas de transmissão planejadas que também ajudarão a explorar a energia eólica.
Todas essas são boas notícias para os fazendeiros da região. Para muitos deles, a nova fonte de renda é bem-vinda.
John Hildebrand, um animado fazendeiro de trigo de 82 anos, permitiu que um desenvolvedor espanhol, a Iberdrola, colocasse turbinas eólicas em suas terras em Wasco, próximas do rio Columbia. A energia de suas turbinas alimenta o sistema Bonneville. Ele e seu irmão Gordon, estavam na fileira da frente quando Franklin D. Roosevelt inaugurou a Hidrelétrica de Bonneville em 1937, antes mesmo que a região tivesse energia elétrica pública – assim eles viram chegar o futuro da energia, duas vezes.
“Tudo o que tínhamos por lá era céu”, disse John Hildebrand, olhando para as altas estruturas girando bem acima de suas terras. “Agora, tenho turbinas.”
Tradução: Eloise De Vylder
Matéria do The New York Times [As Wind Power Grows, a Push to Tear Down Dams], no UOL Notícias.
[EcoDebate, 15/06/2009]
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