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Artigo

Violência que atinge nossas crianças e adolescentes, artigo de Antônio Coquito

A infância mais cedo no mundo do crime
Campanha da Fraternidade 2009

[EcoDebate] A proposta da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil- CNBB – na Campanha da Fraternidade de 2009 – CF 2009 -, ao chamar a atenção para os caminhos e descaminhos da violência nos provoca a um olhar atento e comprometido com nosso cotidiano, e em especial, com a população infanto-juvenil. Como o tema “Fraternidade e Segurança Pública” e o lema “A paz é fruto da justiça, a temática põe em destaque a reflexão em torno de um quadro de agressões cotidianas no campo social, político, econômico e cultural; que impedem a concretização de uma sociedade inclusiva e cidadã.

A pobreza ou ser pobre não quer dizer ser violento, mas a negação das condições dignas de sobrevivência, em si já contribuem para o estado de violência. Dados do relatório da Situação Mundial da Infância 2008, do Fundo das Nações Unidas para a Infância – UNICEF -, apontam para a existência de cerca 60 milhões de crianças e adolescentes no Brasil, que correspondem a aproximadamente um terço da população. Destes, muitos vivendo em situação social crítica e acometidos por todos os tipos de violência.

Da temática e do cenário, destacamos um alerta presenciado todos os dias nos noticiários e em nosso cotidiano: o envolvimento cada vez mais precoce de crianças e adolescentes com o mundo do crime organizado e do narcotráfico. Neste sentido, a afirmação popular de que crianças e adolescentes têm uma vida pela frente, muitas vezes, não está se confirmando na prática. A realidade tem mostrado que elas são vítimas da violência em suas múltiplas faces. Nossa infância convive com um conjunto de vulnerabilidades como o abandono, as agressões, maus tratos, trabalho infantil, exploração sexual, negação do direito à educação, pedofilia na internet, drogas e criminalidade.

O desafio do debate é irmos além! A sociedade brasileira precisa assumir seu papel protagonista no debate e intervenções nas políticas públicas para a reversão das condições de vulnerabilidade social. Estas que se dão na união de esforços com organizações não governamentais – ONGs -, órgãos governamentais, entidades nacionais e internacionais, fóruns e redes na preocupação com o futuro da população infanto-juvenil.

Constatação e atitude

A Relatório “Violência nas Cidades” da Organização das Nações Unidas – ONU – afirma que a violência no Brasil é jovem . Esta análise vai ao encontro dos dados do Mapa da Violência, que de 1996 a 2006 aponta o aumento dos índices que acometem a população de 15 a 24 anos No período citado, houve um acréscimo de 31,3%, ou seja, os homicídios juvenis subiram de 13.186 (treze mil cento e oitenta e seis) para 17.312 (dezessete mil trezentos e doze). Ao lado destes, um número crescente de crianças envolvidas com o mundo da criminalidade é outra constatação da ONU. Cita o documento “crianças de 6 anos já fazem parte de quadrilhas do crime organizado com a função de carregar drogas”. Unindo-se a estes dados, um estudo da Organização Internacional do Trabalho – OIT -, sinaliza que 15% de quem trabalha no tráfico têm entre 13 e 14 anos.

Outro dado da ONU é que o Brasil é o país em que mais se morre e mais se mata com arma de fogo no mundo. Os dados da entidade mostram que, só em 2003, foram 36 mil mortos a tiros (em 2004, este número caiu para 32 mil). A cada dia, morrem em média cem brasileiros – 40 são jovens – vítimas das armas de fogo. A população brasileira representa 2,8% da população mundial, mas responde por 7% dos homicídios por arma de fogo em todo o mundo, morre-se mais por arma de fogo (29,6%) do que por acidente de trânsito (25,1%). A taxa de homicídios por arma de fogo no Brasil é cinco vezes mais alta do que nos EUA, um país violento.

Os dados preocupam. Eles trazem à tona a urgência para a efetividade de políticas preventivas com crianças e adolescentes. Por trás dos índices, estão populações em estado de vulnerabilidade total, “presas” fáceis do crime organizado e do narcotráfico. Esta radiografia da violência está denunciando e pedindo emergência de respostas.

Preocupado com a conjuntura, o oficial de projetos para adolescentes do UNICEF Mário Volpi aponta que “infelizmente a presença de crianças e adolescentes em conflitos armados, no tráfico, na prática de atos infracionais vai se tornando banal e adquire ares de normalidade”. Ele fala da necessidade e urgência de atitudes “é preciso que o Estado, a família e a sociedade se escandalizem, fiquem indignadas e promovam políticas e ações que permitam às crianças e aos adolescentes se desenvolverem num ambiente de respeito aos seus direitos e à sua dignidade humana”.

De acordo com Volpi “o assassinato de adolescentes no Brasil é maior que muitos países que estão em guerra”. O cenário de cooptação da força ativa da sociedade – nossas crianças, adolescentes e jovens – pelo crime organizado e pelo tráfico de drogas merece atenção de todos os defensores e promotores dos direitos, seja nas entidades e nos governos. O oficial de projetos adverte “não podemos abandonar nossos adolescentes nas mãos de justiceiros, grupos de extermínio, falsos policiais e políticas paralelas de eliminação sumária”. Para Volpi uma grande mobilização social contra o assassinato de adolescentes e a responsabilização de assassinos, somados ao desenvolvimento de políticas de prevenção é a tarefa mais urgente. “Precisamos debater o tema”, atenta Volpi.

Políticas Públicas e a CF 2009

O cenário de pobreza, desemprego, desigualdade social e explosão demográfica das cidades têm favorecido a cultura da violência. Estes dados são apontados como agravantes no Relatório “Violência nas Cidades” da Organização das Nações Unidas – ONU. Os dados conjunturais do documento citado sinalizam uma radiografia preocupante que refletem diretamente nas formatações das políticas públicas.

Os conselhos de políticas públicas, a sociedade civil e as gestões municipais, estaduais e federal devem considerar estes fatores causadores e suas diversas soluções. Estas que exigem ações amplas e com visões interconectadas. Neste sentido, Volpi fala da necessidade de que “os governos precisam investir na integração de ações da educação, da saúde, da assistência social, da cultura, do esporte e do lazer de forma a garantir que os adolescentes tenham espaços seguros e protegidos para o seu desenvolvimento”. Ele reconhece a existência de programas na área, mas sinaliza “muitos estão atuando isoladamente e sem resultados efetivos”. E complementa as cidades precisam ser reorganizadas a partir de ações integradas para poder contribuir com a participação e o desenvolvimento de cada adolescente”.

A CF 2009 sinaliza o caminho da construção da cultura de paz e da cidadania alicerçada em Isaías na afirmação de “a paz fruto da justiça (Is 32,17). O documento texto-base da CF 2009 fala da necessidade dos espaços de controle social e elaboração política “a segurança é uma questão sóciopolítico que envolve a todos. Nenhum elemento da sociedade organizada deve ser excluído do processo ou eximir-se de sua responsabilidade”. O texto conclama a que “todos devem, portanto, colaborar na criação e na construção da ordem justa, sem a qual a paz é ilusória e não há segurança”.

Brasil debaterá soluções para a violência em 2009

A violência e construção da cultura de paz estará na agenda sociedade brasileira em 2009. Somando-se ao debate da Campanha da Fraternidade – CF 2009 -; o governo federal, numa ação articulada com entidades da sociedade civil, forma a REDE DESARMA BRASIL, e reedita a Campanha do Desarmamento. Junto a estas agendas, acontecerá neste ano, em todo o território nacional , as Conferência de Segurança Pública (Municipais, Estaduais e Nacional) com o objetivo de analisar os cenários e indicadores, a gravidade do tema e apontar políticas públicas de reversão do quadro.

As entidades que compõem a Rede Desarma Brasil lançaram uma cartilha denominada “Segurança Pública Cidadã. Nela, há uma preocupação com a situação que envolve crianças e adolescentes. No documento em seu capítulo “O impacto da violência em crianças e adolescentes”, destaca “quando verificamos que estamos perdendo muitos de nossos jovens para o crime, cabe a pergunta: qual a nossa responsabilidade neste processo, como cidadãos integrantes da sociedade civil brasileira, o que podemos fazer para ajudar a reverter este quadro?”

Se a violência é um problema, a educação é a solução, mas não qualquer tipo de educação. A cartilha citada constata que uma análise quantitativa da presença de crianças e adolescentes na escola pode levar ao erro. Cita o documento “o Brasil possui aproximadamente 97% de suas crianças na escola. Porém, quando procedemos a uma análise qualitativa concluímos facilmente que a escola não tem conseguido manter muitos dos adolescentes estudando”. Conclui análise percebendo que é na adolescência que acontecem os grandes índices de evasão escolar.

Disque-denúncia do Ministério da Justiça
Ligue: 100 – Violação dos direitos infanto-juvenis e violência contra crianças e adolescentes. (*) A denúncia preserva o anonimato do denunciante.

Antônio Coquito é jornalista socioambiental com especialização em Marketing e Comunicação com ênfase em temáticas sociais – Terceiro Setor – Responsabilidade Social – Políticas Públicas. Também em Comunicação e Direitos Humanos com ênfase em Educação e Cidadania. – Contatos: antoniocoquito@uol.com.br – Artigo publicado no Jornal de OPINIÃO, 2 a 8 de março de 2009, n. 1029, ano 20, p. 7.

* Artigo enviado por Frei Gilvander Moreira, colaborador e articulista do EcoDebate.
e-mail: gilvander{at}igrejadocarmo.com.br
www.gilvander.org.br

[EcoDebate, 04/03/2009]

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