EcoDebate

Plataforma de informação, artigos e notícias sobre temas socioambientais

Artigo

A quádrupla crise planetária, artigo de Cesar Sanson

Imagem: Stockxpert
Imagem: Stockxpert

A crise econômica mundial colocou em segundo plano outra crise global: a crise climática. Essas duas crises estão entrelaçadas, fato que poucos conseguem enxergar e articular. Poderíamos ainda acrescentar a essas duas crises, outras duas: a crise alimentar e a energética. Vivemos uma quádrupla crise: climática, financeira, alimentar e energética. Interpretá-las de forma encadeada é um desafio mais do que necessário, é uma exigência para a reta análise na busca de alternativas radicais que dêem conta do impasse civilizacional em que nos encontramos.

Ainda mais. As respostas à crise econômica, energética e alimentar podem agravar a crise climática em função de que as propostas em curso sugerem a necessidade de retomar com vigor o crescimento econômico. Ocorre que o crescimento econômico, mesmo quando travestido de “crescimento sustentável”, é uma ameaça ao combalido planeta que não já não suporta a lógica economicista, ou seja, a idéia de um progresso infinito. É possível num mundo de recursos finitos, o progresso infinito? A economia é incapaz de formular essa pergunta, mas da resposta que se dê a ela, depende o futuro da humanidade.

Na origem da quádrupla crise encontra-se o consumo desenfreado. Nosso estilo de vida não é compatível com as possibilidades do nosso Planeta. Segundo os últimos relatórios do Programa Planeta Vivo estamos consumindo hoje, na Terra, cerca de 30% além do que ela pode repor. Ou seja, estamos numa posição absolutamente insustentável, porque esse consumo, além da capacidade de reposição, irá agravar muito a situação do Planeta, intensificando a desertificação, a crise da água, as mudanças climáticas.

Nos últimos tempos não triunfou nem o capitalismo nem o comunismo. O principal ganhador é o consumismo. É muito claro que há uma interconexão entre as crises financeira, alimentar e climática. A interconexão está ligada ao modo de produção que domina o Planeta hoje, ou seja, ao sistema capitalista. A busca do lucro privado máximo provocou nos últimos tempos uma evolução que resultou principalmente na crise financeira e na crise alimentar.

É inequívoco que a crise ecológica encadeada às crises econômica, alimentar e energética, sinaliza para uma crise civilizacional: a tomada de consciência de que vivemos no Planeta Terra e não temos outro lugar para onde ir. Fazemos parte de uma comunidade humana que tem um destino comum. Entretanto, o debate sobre a sua gravidade e a necessidade premente de iniciativas está sendo negligenciado. A celeridade com que os governos agem para com a sorte do sistema financeiro não é a mesma com a problemática ambiental.

Destaque-se que os mesmos países [o G-20] que se reuniram recentemente em Washington para debater de forma unitária saídas para a crise financeira são responsáveis por 80% das emissões de poluentes na atmosfera. Esses mesmos países colocaram no topo de suas agendas a crise econômica e negligenciam a crise ecológica.

Uma clara manifestação da subalternidade que a crise ecológica assumiu no debate mundial frente à crise econômica é a realização da 14ª Conferência do Clima que se realiza em Poznan, na Polônia. A Conferência não tem sido objeto de divulgação e ocupa um espaço menor na imprensa mundial. Um acordo para mitigar o aquecimento global continua muito difícil. Na realidade nem os países ricos se entendem, e tampouco os países em desenvolvimento parecem querer dar sua cota de sacrifício.

A Conferência de Poznan é reveladora de como o mundo rendeu-se à lógica economicista e demonstra-se incapaz de uma resposta à altura do maior desafio civilizacional que se coloca para a humanidade desde a sua existência. Por isso, nesse momento é importante não abordar a crise financeira descolada das outras crises.

Nesse contexto, o Brasil desfruta de uma posição singular. “O Brasil é uma espécie de sonho do mundo”, afirma o ambientalista Washington Novaes. “Nós temos o que o mundo precisa”, diz ele. O país tem um território continental, sol o ano inteiro, 12% da água que corre pela superfície da Terra “ o que é um privilégio “, além da biodiversidade planetária. Ou seja, o Brasil tem a possibilidade de criar uma matriz energética limpa e renovável com energia hidrelétrica, solar, eólica, e isso deveria ser o centro das estratégias brasileiras, mas continuamos fazendo de conta que nada existe.

O Brasil continua correndo atrás de um crescimento econômico a qualquer custo e a qualquer preço. É preciso rever esses modelos e implantar uma estratégia atenta aos impasses civilizatórios.

(*) Pesquisador do Centro de Pesquisa e Apoio aos Trabalhadores e doutorando de Ciências Sociais na UFPR.

* Artigo originalmente publicado pela Radioagência NP.

[EcoDebate, 09/01/2009]

Inclusão na lista de distribuição do Boletim Diário do Portal EcoDebate
Caso queira ser incluído(a) na lista de distribuição de nosso boletim diário, basta que envie um e-mail para newsletter_ecodebate-subscribe@googlegroups.com . O seu e-mail será incluído e você receberá uma mensagem solicitando que confirme a inscrição.

Fechado para comentários.