Florestas ameaçadas pela demanda de agrocombustíveis, comida e madeira, diz estudo
A demanda global por agrocombustíveis, comida e madeira destruirá as florestas do mundo, se os esforços contra as mudanças climáticas e de combate à miséria não considerarem um bilhão de pessoas dependentes das florestas, dizem dois estudos da organização Rights and Resources Initiative (RRI), uma das primeiras organizações do mundo na administração e na conservação de florestas. Por Henrique Cortez, do EcoDebate.
Os estudos foram apresentados na Câmara dos Comuns, do parlamento inglês. De acordo com os estudos “Seeing People through the Trees: Scaling Up Efforts to Advance Rights and Address Poverty, Conflict and Climate Change“, a demanda mundial por madeira, em 2030, precisará da produção de uma área adicional de 515 milhões de hectares, para atender às necessidades crescentes de alimentos, agroenergia e madeira. Esta área é duas vezes maior do que atualmente em uso e 12 vezes maior do que a Alemanha.
Ao mesmo tempo, um segundo estudo de RRI, “From Exclusion to Ownership? Challenges and Opportunities in Advancing Forest Tenure Reform“, indica que o avanço sobre as florestas acontece, essencialmente, nos países em desenvolvimento, que fizeram um progresso limitado no reconhecimento dos direitos das populações locais, os povos da floresta, aumentando a violência para com alguns dos povos mais pobres do mundo, que sobrevivem do extrativismo nas florestas mais valiosas e vulneráveis do mundo.
Os estudos igualmente relatam um forte aumento dos investimentos governamentais nas florestas, para as monoculturas e sugerem que o crescimento da demanda, de alimentos e agrocombustíveis, esteja rapidamente devastando vastas áreas florestais na Amazônia e no Sudoeste Asiático.
“Nós estamos próximos do último grande avanço global sobre terra potencialmente agricultável,” diz Andy White, Coordenador do RRI e co-autor de “Seeing People through the Trees”, uma síntese detalhada de seis estudos da posse da floresta, a mudança de clima e o impacto da crise do alimento e do combustível nas comunidades da floresta e nos hábitats.
“A menos que decisões importantes sejam tomadas, os povos tradicionais da floresta e as florestas elas mesmas, serão derrotados pelos grandes interesses econômicos. Significará mais desflorestamento, mais conflito, mais emissões de carbono, mais mudança de clima e menos prosperidade para todos.“
De acordo com Marcus Colchester, o diretor do programa dos povos da floresta e um dos autores, o sucesso dos esforços para reduzir ameaças às comunidades locais da floresta e ao ambiente global, dependerão das ações dos governos e de outras entidades influentes, para reconhecer e reforçar a posse e outros direitos dos povos indígenas e das comunidades locais que vivam em torno das florestas vulneráveis.
Doze das 30 nações com grandes áreas florestais nativas, dentre elas o Brasil, possuem políticas extrativistas, que reforçam os direitos das comunidades, conduzindo em muitos casos às oportunidades do novo mercado para povos locais.
Os autores do estudo do RRI advertem, entretanto, que, na maioria dos países, os “governos mantém firme política de exploração das florestas,” adicionando que “as reivindicações industriais em terras da floresta estão aumentando agudamente, para a produção dos agrocombustíveis, entre outras razões.”
As colheitas que produzem agrocombustíveis, sozinhas, exigirão pelo menos uns 30 a 35 milhões de hectare adicionais (Mha) da terra produtiva, dentro da próxima década. De acordo com os autores: “Os preços elevados estão intensificando a especulação de terra, o desflorestamento, e a usurpação em uma escala inédita,” anotam em seu relatório.
As projeções citam três países agroexportadore, de acordo com o crescimento projetado, na área a ser usada para a produção de colheitas industriais, incluindo aquelas destinadas para alimentos e combustíveis:
+ no Brasil, 28 milhões ha estão atualmente sob o cultivo de soja e cana-de-açúcar. Em 2020, as plantações de soja e cana-de-açúcar tendem a cobrir de 88 a 128 Milhões de hectares de terras brasileiras.
+ na Indonésia, 6.5 milhões de ha da terra já são dedicados às plantações de dendê, para óleo de palma. Em 2025, as plantações de palma, para produção de biodiesel, exigirão de 16.5 a 26 milhões de hectares da terra agricultável.
+ na China, o cultivo de agrocombustíveis exigirá 13.3 milhões de hectares adicionais em 2020.
Além disso, os relatórios e as discussões dizem, claramente, que as iniciativas internacionais para reduzir as emissões de CO2, o desflorestamento e a degradação (Redução de Emissões para o Desmatamento e Degradação, com a sigla em inglês REDD) falharão, a menos que existam políticas públicas para definir os direitos das terras, em áreas da floresta. Os atuais investimentos em áreas da floresta beneficiarão somente os indivíduos mais ricos, os grandes interesses econômicos e as indústrias, que não se importam com as causas do desflorestamento, nem incentivam o desenvolvimento sustentável.
Os autores do relatório fornecem os exemplos dos países que pararam, mesmo que brevemente, de garantir incentivos significativos às comunidades da floresta, destacando que seus resultados têm implicações para as iniciativas de mudanças de climáticas e da crise alimentar global:
+ no Peru, o governo violou as proteções de títulos de terra coletivos, destinando aproximadamente 80 por cento da floresta amazônica peruana para exploração de petróleo e gás, desrespeitando terras indígenas.
+ em Papuá-Nova Guiné, embora os povos da floresta sejam dotados direitos constitucionais de propriedade sobre as florestas, os políticos e a polícia tomam partido dos interesses dos empreendedores de produtos florestais.
+ no Brasil, onde 12 milhões de hectares da Amazônia foram destinados para fixar as comunidades tradicionais, promover a conservação da floresta e manejo extrativistas, o governo não está impedindo a incursão de madeireiros, pecuaristas e outros predadores em terras de reservas.
Em cinco países da África Central, na bacia de Congo, na República dos Camarões, na República Central Africana, no Congo, na República Democrática do Congo e no Gabão, foram destinados, pelo menos, 73 milhões de hectares em concessões, nas terras da floresta, para a exploração da madeira e minérios, comparadas a 1.6 milhões de hectares destinados a serem utilizados pelas comunidades tradicionais.
Os estudos do RRI recomendam que os países, as agências e as organizações da sociedade civil defendam e executem programas para reforçar os direitos à terra e para assegurar que comunidades indígenas e os povos da floresta participem e tenham proveitos dos mercados de carbono e dos programas da compensação para conservação florestas.
[EcoDebate, 21/07/2008]